Cartas ao JG - A arte de fazer e desfazer malas.

Querido JG, dia 18/11/2014 você fez sua primeira viagem sozinho. Altivo e confiante, puxava sua bolsa em direção ao ônibus.

Na entrada, um olhar de soslaio para seus pais e um até logo risonho.
Seria um dia de aventura num hotel fazenda próximo de Brasília-DF.
Faltou lenços para o batalhão de mães que se despediam esvoaçantes.
Uma delas gritava: "Se sentir saudades, liga pra mamãe que eu vou almoçar contigo, eu sei chegar no lugar". E olhava orgulhosa para as outras mães, como que a dizê-las: "Vamos?".
É desse jeito que pais estragam os filhos.
Parta filho. Tenha sempre malas prontas para o infinito.
Parta.
Sei que voltará e teremos muitas histórias para celebrar. Mas, não te quero no conforto de minha asa.
Vá em busca de seus próprios sonhos, mesmo que noutro local. Mesmo que tema o desconhecido e o quarto escuro do novo.
Meu pai partiu de Juazeirinho-PB, quando tinha 14 anos. Foi buscar suas melhoras na cidade grande.
Minha mãe partiu de Serra Negra-RN, junto com seus pais, e foi buscar oportunidades que só a educação pode abrir.
Partir ou ficar deve ser decisão madura em teu viver. Mas, não tema as malas prontas.
Não crie nunca raízes, em lugar algum. Crie asas.
Esteja sempre pronto a recomeçar, a restabelecer trajetórias interrompidas, sonhos abortados.
Siga para o futuro com a mesma confiança com a qual entrou naquele ônibus.
Sê forte e persevere. Saudade, quando é das boas, alegra. Alegra por saber que ela está só guardada, logo ali, na esquina que dobra.
E, ano a anos ainda poderá ser revisitada nas emoções. Ninguém parte quando o amamos.
Levamos-lhes conosco vida afora.

Tenha malas prontas. Carregue pouco peso em seu viver.

Não tenha medo de mudar. De curso superior, de cidade, de amigos, de trabalho, de relacionamento afetivo e até de igreja.

Desde que te faça feliz.
Leve sempre a matula contigo, uma pequena lancheira, para dias difíceis.

Nela um monte de esperança, positividade, amor e fé.
Não olhe pra trás. Estaremos bem.

Qual pai não fica bem vendo seus filhos felizes?
Não se importe com o choro de sua mãe.

Ela também quer o teu melhor, e aguentará o tranco.
Tenho saudades de meus três filhos, teus irmãos. Nem sempre os vejo. a agenda deles, agora casados, é bem agitada.

Mas, só de ver suas pequenas e grandes vitórias vibro.
Os sinto como se tivesse ao meu lado, aqui na tua casa da árvore de onde teclo.

Voe alto. Sempre de malas prontas.
Mas, aqui vai meu maior segredo.

Uma vez que chegue ao lugar de destino, desfaça as malas e o aprecie intensamente.
Entendeu JG?
Sei que é difícil, vou tentar te explicar. Esteja sempre de malas prontas para mudar, mas as desfaça ao alcançar a mudança preendida.

Caso contrário, viverá sempre no futuro como um estéril sonhador. Viverá na provisoriedade, nunca será feliz com nada.
Sempre estará pensando no que falta, nunca no que tem.
Sempre estará querendo mudar de trabalho, de estudos, de amada, de cidade, de cultura...
Saber a hora de fazer as malas, e de desfazê-las é a dica mais importante que já deixei contigo.
Tem gente que vive o casamento de malas prontas. Prontas a desistir e partir para outra. Perde a chance de reconstruí-lo ou reviver emoções encardidas pelo desuso.
Tem gente que vive o trabalho de malas prontas. Nunca é feliz com a empresa, sempre procurando razões para dela falar mal.

E assim por diante.

Sofrem de uma paranoia de achar que sempre o "gramado do vizinho é mais bonito".
Vivem na eterna busca, numa angústia cruel, que nunca os capacita para sentirem-se felizes com o que tem. A serem gratos.
Uma postura de malas prontas na vida não é isso.

Malas prontas e não ter medo de buscar novos horizontes, fantasias, vivências e aprendizados.

Mas, ao alcançá-los precisa desfazer as malas e curti-los.
Imagine uma pessoa que o sonho era ingressa na diretoria que teu pai trabalha no BB, a de Tecnologia.

Estudou, fez prova difícil e migrou de longe.
Isso é o fazer as malas. Superou a saudade, a distância e os medos de não conseguir.
Imagine essa mesma pessoa, dois anos depois, definhando, infeliz.
Será que arrumar as malas e partir será novamente a melhor opção?
Ou será que a infelicidade não vem dela não ter desfeito as malas emocionais ao aqui chegar?
Outro dia ouvi de uma palestrante famosa que temos que fazer o que gostamos pra ser feliz.

Bobinha.

Temos que gostar do que fazemos, para ser feliz.

E é aqui que mora a diferença. Você não é bancário pra fazer o que gosta.
Mas pode ao ser bancário gostar do que faz.

Entendeu JG?

Essa é a sutil diferença entre as malas feitas e desarrumadas.
Partir em busca de novos objetivos é super importante. Mas, saber apreciá-los, degustá-los e encontrar o prazer neles é fundamental.
O prazer não virá deles, nunca! O prazer será eles.
De deles pra eles. Difícil né?
Você não ver ninguém dizendo que fez vestibular para ser bancário. Costureira, jardineiro, motorista de ônibus ou funcionário público.

Mas, em cada uma dessa profissões você pode desfazer as malas e ser muito feliz, gostando do que faz. E não procurando fazer o que gosta.

Já psicólogo, eu gostava do que fazia no Caixa de uma agência do BB.

Gostava do que fazia no caixa. Gostava do que fazia na compensação. gostava do que fazia no meu primeiro emprego com carteira assinada, como professor. Gostava do que fazia na Controladoria. E assim por diante.

Goste do que faz. Pare de procurar o sentido da vida, ou do trabalho.
Encontre o sentir no trabalho, na vida. Isso fará toda a diferença.

É a diferença entre fazer as malas e partir, ou desfazer as malas e dizer, aqui é meu lugar. A escolha será tua, sempre tua. E, teu pai te apoiará. Mas, se começar a olhar muito o jardim do vizinho, vai levar uns cascudos pra tomar prumo. Ahh se vai!

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