Seja chave de acender esperanças. (Autor Ricardo de Faria Barros, Ricardim)





Começo o dia com o coração chapecado de emoção. Escuto Adiós Nonino, meu tango preferido, escrito em homenagem e no ano do falecimento (1959) de seu amado pai, o Nonino (Vôzinho), que assim Piazzolla o chamava. O primeiro parágrafo do tango já é uma obra de arte, uma ode à esperança:

"Desde una estrella al titilar...
Me hará señales de acudir,
por una luz de eternidad
cuando me llame, voy a ir."

Numa tradução contextualizada, seria algo assim: "De uma estrela a cintilar... me enviará sinais de socorro. E, pela luz da eternidade, quando me chamar, irei."

E esse é um propósito de esperança, digno de por ele viver. Na Constelação Estrelar Brasileira, uma nova estrela passou a cintilar, chamada de Chape.
A esperança tem acompanhado meus dias. Vários sinais dela estão se manifestando. Sem ela, somos apenas miséria humana, desespero, máquinas biológicas.
Foram dias de esperança:
Ontem, avistei uma estrela cadente caindo. Coisa rara de ser ver, e ainda tive tempo de pedir por meus filhos. Isso é esperança.
Na segunda, chegando do trabalho, vi um grande arco-íris por sobre minha casa. Arco-íris remetem ao tesouro maior, o tesouro da esperança de que ali, trás dos montes, tem coisa boa para nós.
No domingo, durante a celebração religiosa, a vela do Advento que foi acesa, era de cor verde. Na mensagem foi dito que essa semana seria dedicada à esperança.
No sábado, durante uma reunião com a família de Sr. Valdecir, para comemorar as obras de seu lar, um Louva-Deus, que aprendi a chamá-lo de Esperança, pousou em mim.
Para fechar o ciclo, agora a pouco, ao voltar do passeio com os cachorros, dou de cara com a placa da rua de minha casa: "Caminho da Esperança".
Domingo passado, durante a celebração religiosa, a vela não queria acender. Mais de uma pessoa tentou, em vão. Muitos fósforos depois, o pessoal desistiu. Até para não atrapalhar a liturgia.
Fiquei olhando-na de meu canto. Por várias vez fiz menção em levantar-me e ir tentar acendê-la, ao que minha esposa, com um olhar, repreendia-me. Afinal, o seminarista estava falando.
Logo que ele terminou, tomei coragem e fui. Era hora dos cânticos das Ofertas, e aproveitei. Gastei uns 4 fósforos e nada. Percebi que o pavio estava sufocado com tanta cera, que o arrodeava. Então, peguei a chave do carro, e comecei a esculpi-la, tentei mais uma vez, mesmo assim, agora era o excesso de cera líquida quem sufocava o pequeno pavio à mostra.
Aproveitei que a área estava mais mole, pelo calor do fogo de várias tentativas, e abri um bom espaço para o pavio sair, fazendo uma espécie de calha para o excesso de cera líquida não sufocá-lo novamente.
Pus minhas mãos em concha e acendi um dos últimos fósforos que restara. E a chama foi nascendo, primeiramente tímida, medrosa - pelas experiências anteriores frustrantes que vivera , e, até um pouco frágil. Tentei o segundo, com a concha, sem nem olhar para minha mulher, e eis que ela se alumiou, e fui retirando as mãos lentamente, como quem retira as mãos de um bebê que dá os primeiros passos. E aí a luz se fez, linda. Resplandecendo nossas trajetórias.

Essa cena da vela, e as outras referências à esperança, tal qual a Adiós Nonino, mobilizou minha alma. Afinal, como bilhões de pessoas, viramos um pouco Chapecoenses.

E o que Piazzolla, Arco-Íris, Louva-Deus (Esperança), Vela, Estrela Cadente e Rua Caminho da Esperança têm em comum?

Todos são metáforas de um deixar-se fluir intencional, de um amanhã te vejo, de um propósito maior pelo qual viver, de um desejo ou sonho acalentado no coração.

Somos seres de esperança. Se a tiram de nós, nos matam.
Mas, a esperança é como aquele pavio da vela. Precisa de chaves pra ser descoberta, precisa de mãos que acolham, precisa que não a sufoquem, com vãs e fáceis verbalizações desconexas da realidade, em alienadas visões de si mesmo, do outro, e da realidade.
Tem gente que vê a vela da sua esperança apagada e não age, em seu viver. Fica de braços cruzados, numa atitude conformada, determinística e fatalística, esquecendo o pedido: "Não vos conformeis com esse mundo, mas o transformeis, mediante a renovação de vosso espírito".
Acredita que não terá solução, que as coisas são assim mesmo, ou que já gastou muitos palitos de fósforo, em vão, por que tentar mais uma vez. Aprendem a ser desamparados.
Tal qual aqueles irmãos portaram-se, dando por final e certo, o fato daquela vela não mais participar da liturgia, dado que ela não cooperava acendendo.
Nada é certo, nada é dado, tudo é mudança e transformação, se com esperança agirmos.
Combustível de nossos sonhos, a esperança nos move para aquela eternidade que Piazzola descreve. Ela é a luz que anima nossos dias, que nos faz continuar, no lugar em que muitos abandonaram a luta.
Que nos faz não desanimar e continuar, no lugar em que muitos já desistiram.
Que nos faz, como aquele garoto de 10 anos que disse, aos primeiros locais que acorreram para ajudar: "Eu sei um caminho mais perto para chegar ao avião". Aquele garoto moveu-se pela esperança. Ele não tinha muita certeza, o tempo não ajudava, mas ele esperançou intencionalmente seu agir no mundo e moveu o destino, apressando o socorro.

Aquele garoto, levantou-se da cadeira e foi rapar a vela da esperança com o que tinha na mão, ensinando um caminho para que a camionete do Sr. Marulanda chegasse mais rápido aos destroços, e resgatasse um dos sobreviventes o Alan. Esses minutos, de um caminho melhor, podem ter sido determinantes entre a vida e a morte dele.

Podemos se a chave da esperança, o caminho, para alguém, ajudando que ela novamente resplandeça. Entendem?
Você deve conhecer alguém que anda um tanto desesperançoso. Então, levante-se da cadeira de teu viver e ajude-o.

Sejamos chave e caminhos de esperança para nós mesmos, os outros e a realidade em que habitamos.

Não uma esperança imóvel, que só vira uma intenção. Mas, uma esperançosa musculosa, atlética, que nos faz levantar e alterar o carrossel do destino, de nossas vidas, dos outros e de onde convivemos.

Tal qual aquela criança fez. Sejamos, como ele, agentes da esperança.
Volto ao Piazzolla e declaro, com esperança, que após o choque da fatalidade, ficarão as boas lembranças, os ensinamentos, os exemplos de que é possível um time pequeno, com o apoio de uma cidade inteira, chegar a grandes conquistas. Essa é a esperança que me move, que o luto desse sofrer transforme-se em fortaleza para batalhas futuras, afinal depois do Chape, qual time de pequena cidade dirá que é impossível concorrer com os grandes? Essa foi a chave que o Chape usou em nosso corações cansados, acendendo em nós, até em quem não curte o futebol, a chama de que é possível sim, desafiar os gigantes e enfrentá-los, talvez não ganhando todas, mas nunca saindo do jogo. Essa é a minha esperança, e o que me move ao ser mais!
Uma esperança que me diz a todo momento, e em todas ocasiões: Vamos lá ser como eles, bora lá mostrar caminhos para o socorro chegar mais rápido a tantos que de mim e de você estão precisando agora, como esse garotinho da foto, que precisa de uma braço. Afinal, um abraço pode ser uma maravilhosa chave para acender a esperança no outro.

Sintam-se abraçados Catarinenses!

#chape


Crédito da foto: AFP

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