Não é sobre pegar o buquê (Autor Ricardo de Faria Barros)

Voltava de meu primeiro trabalho como aposentado do BB, uma celebração leiga e ecumênica de um casamento que conduzi na Paraíba.
O Aeroporto de João Pessoa fervia, era perto das 14hrs. Gente se acotovelando pra despachar bagagem, para receber parentes, pra pegar táxis, locar carros, ou pegar fila nos restaurantes.
Fiz o meu check-in com 3 horas, batendo todos os recordes, e me dei bem. Na hora em que entreguei o carro na locadora, perceberam um pequeno arranhão no para-choques dianteiro, ainda com marca do resto de tinta da parede que tirou.
E aí o procedimento foi mais demorado e aborrecente, afinal não fui eu quem fez aquilo. Paciência, ainda saí no lucro, R$ 300,00 em dez vezes não vai me quebrar. E, não vou acusar os manobristas do hotel.
Mas, que era resto de tinta de parede da garagem isso era. 
Corri para despachar as bagagens, e subi para área de alimentação e para filar um rango.
Na fila, eu tentava equilibrar minha bolsa de couro, e uma bandeja, já que não podia dar vacilo de deixa-la em cima de uma mesa, enquanto me servia. 
Atrás de mim, uma jovem senhora vivia drama pior. Sempre tem um pior do eu nós, nos dramas da vida. 
Ela equilibrava o filho de uns 3 anos, no braço; uma bolsa daquelas que tem de tudo de nenê dentro, e a bolsa dela, na outra. E, com uma força descomunal, ainda erguia a bandeja e colocava o que queria no único prato dele. Mãe ninja.
Deu até vontade de lagar minha bandeja e ajuda-la. Mas, em se tratando da Paraíba, é bom ter cuidado em se aproximar de mulheres com bebês. Por melhor intencionado que esteja. rsrs
Então, segui à frente e fiquei à distância torcendo por ela.
Acomodei-me num resto de mesa, com uma cadeira disponível. As outras ocupadas por bolsas de senhoras e não senhoras. E que se danasse quem estivesse sem cadeiras. Primeiro as bolsas. Uma falta enorme de empatia com o outro esse lance de botar bolsa nas cadeiras vazias, sem se importar com que está em pé. 
Fitei a senhora e vi que ela se dirigia para uma única cadeira, sem bolsa, e ainda vazia. Até que uma família se ergueu de uma mesa redonda, fechando a conta, e ela desviou caminho para lá.
Pude perceber seu sorriso de alívio. E o carinho com o qual acomodava o filho, o prato, as bolsas e só depois a ela mesma.
A primeira colherada foi para o bebê. Que era dos bons de garfo.
Fiquei tão feliz, por vê-la bem, que pedi à garçonete uma Stela Artois.
Aí, a vejo acenando para alguém, mostrando aonde ela estava. 
Olho em direção ao aceno e percebo que vem chegando o jovem maridão, de uns 30 anos, bem-apessoado, roupa de grife, tênis da moda, todo bacana.
Ele vem do Bobs, com um sanduiche de uns 3 andares, e um copão de Pepsi.
Nem puxa a cadeira já dá a primeira dentada. 
Então, nessa hora, tive nojo daquele cara. 
Que foi se servir de seu sanduiche deixando sua esposa naquela situação tensa para alimentar-se a ao próprio filho.
E é isso que está condenando os casamentos a terem datas de validade cada vez menores: 1 ano, 3 anos... 
O egoísmo dos cônjuges. Dos dois, ou de um dos dois, tanto faz, quando acontece ele mina a relação feito cupim em madeira.
Essa garotada sendo criada podendo tudo. Sem limites, sem sofrer perdas, frustrações, sem ter que lhes eduque para a coletiva-vivência esta casando.
Todo mundo sarado, geração malhação física. Todo mundo bonito. Mas, com pouca inteligência emocional.
Muita vaidade, muito orgulho, muita aparência e pouca essência.
Essa garotada criada sem educação para vida, que não aprendeu a cultivar valores, a respeitar e se doar para o próximo, quando se casa é uma desgraça. 
Aliás, quando chegam ao poder também. 
Gente que só se curte, se posta, se compartilha, gente que se acha Deus. Narcisistas ao extremo, como podem dividir a vida com alguém? Como pode renunciar, se flexível, acomodar o tempo do outro ao seu próprio tempo, se aprenderam que a vida gravita em torno deles, ou delas? Gente que investe e planeja o casamento, um ano antes, como se fosse a produção de um filme de Hollywood.
Só esquecem que a cena principal começará depois do “Sim”. E, para essa, não há agência casamenteira, cerimonialista, votos, flores, pregação bonita, ou fornecedores caprichosos que facilitem as coisas.
Será com eles mesmos, na outra margem do rio da vida deles, a de solteiro, que o filme iniciará. 
Terão que se adaptar a menos baladas, menos noitadas com amigos, menos eu, e mais nós. Terão que cultivar o sentido de família, coisa que se aprende de criança.
Casamento não é uma história sobre ser feliz. É uma história sobre fazer o outro feliz.
Não se casa com o outro. Se casa para o outro.
Para fazer pequenas coisinhas para ele, cuidar!
Para se interessar pelas coisas que ele se interessa, admirar
E para resgatar as pontes destruídas, pela rotina e dificuldade do dia a dia, iluminando esperança e perdão no relacionamento.
Mas, ainda creio na força do amor. Para mim, mesmo sendo cada vez mais numerosos, os jovens estão aprendendo a amar. Melhor do que nós, os velhos. 
Tirando uns malas como o garotão do Bobs. Tem muito jovem que quer dar certo, numa vida a dois. 
Vejo isso nos meus filhos, no cuidado deles com suas esposas e esposo. Vibro internamente, e sei que meu genro e noras também fazem isso para com eles, aliais: testemunho.
Vi isso na Suzanna e no Yuri, um amado casal que casei nesse final de semana que passou.
Yuri prepara uma sopinha para a Suzana, esperando-lhe com aquele prato quando ela chega cansada do trabalho.
Suzana, sabedora do amor do Yuri pelo Náutico, já foi para o campo com ele.
E, o segredo é conjugar os três verbos, que só funcionam usados no outro, e – gravem bem, sem exigir reciprocidade para assim fazer, não se trata de uma barganha, de um comércio. Fazemos por não sabermos mais ficar sem fazer isso para o outro, ficar sem saber fazê-lo feliz, talvez sendo essa a maior utopia e presença do amor. Ser para o outro os três verbos abaixo: 
Cuidar do outro. Estar presente. Se oferecer para deixa-lo na rodoviária, mesmo que ele ache que de taxi é melhor. Fazer um chá para ele. Celebrar com ele o nada, fazendo-lhe se sentir protegido e presente. Arrumar a cama dele. 
Admirar o outro: Sendo amigo dele. Companheiro. Daqueles que trocam mil whasts durante o dia. Gostando do mundo dele, das coisas que ele se interessa, dos seus amigos, da sua família, da empresa que ele trabalha. Ouvindo-lhe pela enésima vez falar daquele gol que o seu time perdeu. 
Iluminar o outro: perdoando, arejando esperança, restaurando pontes do diálogo, relevando pequenos aborrecimentos, diminuindo expectativas e cobranças, aceitando o outro, não como você quer que ele seja, mas como ele é. Vendo o bom, o belo e o virtuoso dele. O que ele tem, e não o que ele anda em falta. 
À minha frente no vôo, um jovem casal e duas filhas. Uma de colo e outra de uns 4 anos. 
Uma das crianças chorava, a mãe disse que deveria ser fome. Então, ele dirigiu-se à frente do voo, junto às comissárias para fazer a mamadeira dela. Depois, foi a vez da mãe que pediu que ele ficasse um pouco de pé, para que ela pudesse trocar a bebê de modo mais fácil.
Olhei pela janela do voo, lágrimas a disfarçar, no horizonte um belo pôr do sol e Brasília ao fundo.
Sim, amados amigos, há esperança para o amor. 
Só precisamos reaprender a cultivá-lo na educação de nossos filhos, preparando-os para a vida adulta. Mesmo que possamos nos aborrecer com eles, não podemos dar-lhe tudo, criá-los sem valorizar os outros, sem aprenderem a ser solidários, éticos, bons, mansos e justos.
Não podemos terceirizar o futuro da vida de nossos filhos. Tercerizar a educação para o amor. 
Entupindo os filhos de quereres, sem refletir sobre os "porqueres".
Criando pequenos reis e rainhas, que serão péssimos amantes. Só ficando bons em capas de revistas e colunas sociais. Gente que não sabe amar. Muitas das coisas que na educação doméstica, para o coletivo, lhes ensinarmos, serão fundamentais na manutenção de uma relação afetiva de qualidade e significativa.
Estaremos plantando neles a felicidade futura de uma vida a dois.
Bem melhor do que torcer que elas peguem o buquê, torça para que o amado dela tenha aprendido a ser Nós, no lugar de EU.
O oposto também, no caso de pegar as caixas de uísque. Que ela tenha aprendido a conjugar o três verbos, que só se consegue ao se conceber com um Nós.
É impossível a um coração egoísta admirar, cuidar e iluminar o outro.
Só se ele passar pela maior das revoluções, a do amor, e se transformar, aí sim, haverá salvação!

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