É live, pode parar! (Autor Ricardo de Faria Barros)


Ontem tive o prazer de ver meu primeiro show da série: O Grande Encontro.
Nunca consegui ver pessoalmente este show.
Mas, ontem tive a satisfação de pelo menos vê-los, em sua versão digital, numa live.
Preparei a pipoca e uma Stella geladinha, arrumei o som da TV.
Chamei a namorada pra ver, ela lá e eu cá, isolados como se deve.
E ficamos no frisson danado de bom, esperando o começo. Contando os segundos.
E aí ouvimos aquele sininho que toca nos teatros.
Aquele que diz que o show irá começar em breve.
E eles entraram no palco e estava feita a festa.
Nos primeiros dez minutos, eu já estava extasiado com tanta beleza, na forma de canções que marcaram minha vida. Cujas letras dizem muito das coisas em que acredito.
No Brasil, naquele momento, eu me sentia conectado com milhares de pessoas que também acompanhavam o histórico, e inédito, show; seja pela TV, seja pelo youtube.
Após duas horas e meia de show, "voltamos enamorados para casa", deixando aquele teatro muito ricos de emoções compartilhadas, a cada canção que ouvíamos.
E, por que não dizer, mais curados. A arte nos cura.
No caminho ela me perguntou do que mais gostei, e falei que foi da parada aos 11 minutos.
Veja a parada de que falo neste texto aqui: https://youtu.be/__wGzZu6HuU?t=650
Foi algo tão bonito que gostaria de compartilhar com vocês o que disse pra ela, justificando meu gostar.

Aos 11 minutos, o trio Elba Ramalho, Geraldo Azevedo e Alceu Valença, cantava a bela canção Sabiá.
E, quando Geraldinho passou a bola para Alceu, ele travou.
Durante alguns segundos ele ficou sem reação. A voz não saia de sua boca.
Aí ele reagiu e falou assim:

"É live... É live!
Volta!
Ei, para aí! É live...
Para aí.
Vamos voltar...bora!
Vamos voltar!"

Elba Ramalho fez uma expressão de quem estava sem entender nada.
Geraldo Azevedo, fez cara de que não gostou.
Mas, Alceu insistia em repetir, dizendo quase numa súplica:

- É Live!

E, eles entenderam a riqueza do momento, repetiram a música, e Alceu entrou na sua vez sem mais travar, e dando um show de interpretação.

É live!!!

A vida é live. A vida não cabe numa planilha de excel. Nem numa apresentação de power-point.

Viver é live.

Quantas das vezes também precisamos parar algo. Voltar ao início e recomeçar?
Nos permitir retomar a vida e não seguir o erro, com aquela sensação de que poderíamos ter feito melhor, caso tivéssemos desistido de insistir na canção errada.
Mesmo que para isto, tivéssemos que voltar uns passos atrás.
É live.
Alceu suplicava aos seus pares para retornar a canção.
Querendo dizer que podiam se cobrar menos, ser menos formais, menos inflexíveis, e que o improviso e coisas que não saem legais, nas lives são mais aceitas.
Quanto ensinamento Alceu nos deu.
Ele poderia ter deixado seguir. E convivido por um bom tempo com aquela sensação de frustração, de desgosto para consigo mesmo, e até culpa por não ter pedido uma segunda chance para fazer direito a sua parte na melodia.
Alceu nos ensinou muito.
Pedir uma segunda chance, para fazer novamente algo que não deu correto não é sinal de fraqueza.
É de coragem! Coragem em ser verdadeiro, em querer apresentar o seu melhor Eu, a sua melhor versão.
Exige humildade, exige autoestima, exige a esperança equilibrista. Aquela que diz que da próxima vez as coisas poderão ser melhores, e que vai passar.
Uauuuu!!! É live.
Viver é live. Podemos nos cobrar menos. Podemos aprender com os erros. Podemos recomeçar um novo esboço de nós mesmos.
Ei, pode parar? É live!
Você não precisa continuar fazendo algo, só para agradar alguém. O show pode parar.
Ou, desafinar no coro dos contentes.
Viver é live.
E não tem manual. O que funcionou pra um, pode não funcionar pra você.
Mas, cobre teu espaço no acontecer. E não tenha vergonha, nem receio, em se colocar pedindo pra retomar sua parte em algo, que teu próprio desempenho produziu um mau resultado.
E, quando voltar, vá com gosto. Sem ficar se lembrando que vai falhar novamente.
Abra teu ser à nova experiência. E sem ficar olhando-se pelo retrovisor, e com medo de errar.
E, caso as pessoas queiram negar-lhe o direito ao recomeço, insista com elas.
Sem medo, pois o medo nos apequena ao mundo dos outros.
E, de tanta pequenez vamos deixando de ser nós mesmos, ao nos moldar ao que os outros pensam, querem e esperam de nosso existir.

Recomece relacionamentos em cuja entrada em cena, tu tenha causado tristeza, ou sofrimento, em pessoas amigas.

Recomece aquele desafio no trabalho, que ao tentar atingi-lo não conseguiu.

Recomece sonhos que foram ficando esquecidos, nas gavetas de teu ser.

Recomece crenças limitantes, daquelas que sopravam em teu ouvido de que jamais amaria novamente, ou de que não seria capaz de conseguir algo.

Recomece a criança curiosa, alegre, aventureira e amiga que já foi um dia.

Recomece a cultura de perdão, paz e respeito que já teve.

Recomece a autoestima e amor próprio que já teve.

Recomece de pessoas que te diminuíram e te fizeram sofrer.

Recomece dos lutos que te levaram junto.

A vida é uma live, na qual se pode recomeçar, e a cada manhã, e em cada instante.
Agora, sem errar mais naquela parte. Pelo menos naquela parte!
E, caso esteja no palco com alguém que errou o tom.
Aprenda o segundo ensinamento, aos onze minutos deste show.
Dê a esta pessoa a chance de fazer novamente, de se recriar e de tentar mais uma vez. A estimule e apoie neste reinventar-se.
Não a coloque na profecia realizadora, tão comuns em nossos julgamentos, de que "daquela mata não sairá coelho".

Afinal, na live da vida, pessoas podem nos surpreender. Coelhos não!

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