Que Mundo do Trabalho Queremos para Nós? (Por Ricardo de Faria Barros)


Recentemente a Ânimo Desenvolvimento Humano, na pessoa de seu proprietário, o Ricardo de Faria Barros, procedeu à uma sondagem, frente a um significativo grupo de trabalhadores ligados à gestão pública e privada sobre um conjunto de situações que geram um desgaste emocional para a saúde do trabalhador quais sejam:
1. Conviver num ambiente com o clima pesado, pessoas tóxicas.
2. Passar por situações que beiravam o assédio moral, ou sexual.
3. Viver relações conflituosas, tensas e sem soluções negociais a curto prazo.
4. Perceber que não foi reconhecido, ou valorizado, no trabalho.
5. Ser objeto e vítima de mentiras, fofocas ou boatos.
6. Sentir-se desconsiderado nas propostas que apresentou.
7. Sentir-se invisível, ou perceber a indiferença de alguém para tuas necessidades.
8. Não receber cooperação dos colegas, ou capacitação adequada para o trabalho.
9. Desrespeito com a jornada. Sensação de exaustão permanente.
10. Sentir preconceito, desrespeito, ou falta de empatia.
11. Trabalhar com pessoas com comunicação confusa, ou violenta.
12. Trabalhar com líderes com pouca inteligência emocional.
Esta lista de situações poderia ser diferente, a partir do referencial teórico das relações socioprofissionais, ou do modelo estrutural de qualidade de vida no trabalho escolhido.
Nesta enquete, e na construção dos itens acima, optou-se pela categorização de relatos de estranhamento laboral, desconforto, ou sofrimento, coletados em Comunidades de Trabalhadores, ancoradas em Redes Sociais, em apanhados em Fóruns de Gestão de Pessoas, e na escuta ativa do pesquisador, no âmbito de sua carreira profissional.
Deliberadamente, corremos algum risco de indução na construção dos itens (presente em qualquer tipo de enquete), ou de exclusão de elementos importantes, sendo de qualquer forma um olhar instigante sobre temas importantes para encaminhamento nas ações de desenvolvimento humano e profissional.
Na primeira enquete, conforme a figura que ilustra esta reflexão, o foco foi na vivência da situação. Ancorado na afirmação imperativa: “Já passei”. Os mais votados foram:
Conviver num ambiente com o clima pesado, pessoas tóxicas
Impacto na Dinâmica Laboral – Degradação do Ambiente Laboral
De fato, quem já trabalhou num ambiente de clima pesado sabe o quanto vamos adoecendo, dia a dia. E não dá a mínima vontade de ir trabalhar. Cai a inovação, cai a produtividade e as relações ficam pautadas num clima de desconfiança e pouca colaboração social. É o famoso “Em rio que tem jacaré, peixe nada de costas...” É, mas nadar de costas por um longo tempo, não só cansa, como cega qualquer perspectiva de horizonte.
Cuidar do clima repercute na saúde ocupacional, na excelência do atendimento e na geração de valor pelas entregas de resultados.
Salta aos olhos ser, das doze situações, a mais comum nos ambientes de trabalho. Não sek razão, muitas pessoas sofrem da Neurose do Domingo, pelas 22h, ao lembrarem-se que no outro dia irão trabalhar naquele inferno.

Perceber que não foi reconhecido, ou valorizado, no trabalho.
Impacto na Dinâmica Laboral – Desvalorização Profissional
Temos necessidades de sermos reconhecidos. Isto nos legitima, cria pertencimento e, como efeito colateral, nos mobiliza-engaja para novos desafios. Mas, vive-se tempos muito pobres de reconhecimento. Como os líderes não são reconhecidos, pelos seus segmentos superiores, acaba-se por reproduzirem este comportamento com seus liderados. Criando um jogo de soma zero, no qual todos perdem. Várias pesquisas apontam que das emoções positivas a que menos vem se expressando é a gratidão. Na Sociedade do Cansaço, na Sociedade do Eu Que Mereço, e Na Sociedade Narcisista que vivemos, parar e prestar atenção a quem nos ajuda, a quem nos abre portas, a quem se doa é quase uma utopia. Ainda escuto gestores dizendo, mas ele é pago para isso. Sim, minha diarista é paga para limpar o apartamento. Mas, quando entro na cozinha e percebo que ela deixou aquilo lá um brinco, eu sinto e expresso gratidão por ela ter vindo, e ter feito um excelente serviço. Eu a reconheço. Inclusive, por arrumar melhor e de forma mais funcional os objetos da cozinha, indo além de só colocar nos lugares que achou, por mim colocados.

Conviver com pessoas com comunicação confusa, ou violenta.
Impacto na Dinâmica Laboral – Redes de Conversas Incapacitantes
Têm muitas pessoas que praticam um diálogo do tipo Tênis de Mesa, no lugar de jogar Frescobol. Nada contra o Tênis de Mesa. Entendam a metáfora. É que a pessoa não quer arredondar a bola das palavras, gestos e linguagem para o outro. Não quer se esforçar para manter a bola no ar e circulando, a bola da comunicação. São diálogos frios, confusos, ambíguos, e sem o calor, clareza e objetividade, que o mundo do trabalho exige.
Tem gente que quando conversa quer sempre ter a razão. São pessoas que cultivam uma visão de mundo muito fechada, com extremismos de verdades, quase que sagradas. É uma conversa truculenta, arrogante, que adora se colocar como melhor e maior.
Conviver com pessoas assim faz um mal danado. E o pior é que não podemos ir morar numa ilha; e o pior ainda é quando esta pessoa é teu gestor. Aí o bicho pega.
Se não podemos mudar esta situação, podemos mudar a nós mesmos, criando couraças para não adoecer, por tantos torpedos de palavras que recebe. Tenta olhar a situação com ironia, ou humor-sarcástico, tirar o personalismo dela, afinal não é só contigo que a pessoa é bruta, podem ser válvulas de escape para sobreviver a esta pessoa de comunicação violenta. Mas, não é nada fácil. E isto consome muita energia emocional. Ao final do dia a pessoa está exausta, de tanta patada que levou. Perde o negócio, perdem os clientes, perde o sentido do trabalho e perde-se em saúde, deixar ocorrer este tipo de dinâmica laboral.

Trabalhar com líderes com pouca inteligência emocional.
Impacto na Dinâmica Laboral – Analfabetismo Emocional Gerencial
Sim pessoal, as emoções são como um alfabeto que tem seus dialetos, suas linguagens, seus afetos escondidos e suas dimensões intangíveis, e subjetivas. Fazer uma gestão das emoções de maneira mais eficaz, e produtiva, causa um bem enorme a todo ecossistema laboral. Mas, poucos investem nisso. Pois que exige criar um espaço de escuta do grupo, de autoconhecimento, de busca por outras disciplinas para evolução pessoal e profissional, além das técnicas. E, como são as técnicas que muitas vezes o promovem, a pessoa acha que as socioemocionais não são necessárias. E, botam o grupo a perder. Líderes analfabetos, emocionalmente falando, inviabilizam o crescimento da equipe, e não conseguem gerir times de alto-desempenho, para os quais exige-se sensibilidade, a humanização do cuidar, a criação de vínculos e a coragem de mudar. Um líder sem inteligência emocional não vai saber conduzir o grupo pelos mares tão caóticos, complexos, velozes, incertos e perigosos do mundo do trabalho e dos negócios a ele afeto.

Na segunda enquete, conforme a figura que ilustra esta reflexão, o foco foi projetivo, ancorado na afirmação imperativa: “Não Gostaria de Passar!”
Tendo sido os mais votados os itens:
 Conviver num ambiente com o clima pesado, pessoas tóxicas.
 Passar por situações que beiravam o assédio moral, ou sexual.
 Sentir preconceito, desrespeito, ou falta de empatia.
 Trabalhar com líderes com pouca inteligência emocional.
Farei o destaque dos mais votados, diferentes da enquete anterior, e que já foram explorados.

Passar por situações que beiravam o assédio moral, ou sexual.
Desdobramentos nas Relações de Poder - Assédio
Engraçado que para o assediador ele nunca está assediando. Já perceberam este discurso? Para ele, é o jeito dele, é a forma que ele é... Ou, é mentira/besteira do outro. Alguns até dizem que é assim mesmo, que se usar o “chicote” o grupo não produz. Tolinhos, sabem nada sobre equipes de alto-desempenho!
Quem já se sentiu assediado sabe o quanto isto destrói a pessoa. Assediadores precisam de ações coercitivas consistentes e eficazes. Não podem ser ignorados. E, suas vítimas, não podem ser desconsideradas, ou tidas como não-resilientes. Não se deve romantizar quem passa anos sendo assediado e sobrevive. O custo desta sobrevivência pode gerar sequelas pela vida afora.

Sentir preconceito, desrespeito, ou falta de empatia.
Desdobramentos nas Relações Sociais – Preconceito
Se existe algo fora de moda é o preconceito. Contudo, nos parece que é mais comum do que se divulga. E ele ocorre de todas as maneiras. Desde a orientação sexual, à idade, ou sotaque, credo religioso ou cor de pele. Não importa. Aos olhos de muitos, a vítima de preconceito está com mimimi. Aos olhos desta pessoa, ela sabe muito bem o que sente com a situação que viveu, e como ela é ultrajante. Toda forma de preconceito é aniquiladora, e inibe o desenvolvimento do potencial humano, criando barreiras à evolução da condição humana e civilidade.
Vamos combinar uma coisa, o lugar da fala de quem se sente vítima de desrespeito, preconceito é desta pessoa. A partir da construção de seus símbolos culturais e de sua percepção. Não é frescura uma mulher dizer que num processo seletivo sentiu que foi tolhida, quando respondeu que por ter filhos nem sempre pode extrapolar a jornada. Isto é uma forma de tirar as mulheres da jogada, com perguntas enviesadas, que desconhecem a realidade da sobrecarga feminina. E que estão fora do contexto. Então, se um dia você escutar esta mulher, é do ponto de vista dela que deve avaliar como ela se sente, tá combinado?
Este é o pior viés do preconceito, e é um viés de luta de classes. A história é escrita pelos vencedores. E, eles distorcem os fatos e as falas dos vencidos, de modo a desqualificá-las. Todo preconceito tem em sim mesmo uma verdade sagrada, ou crença limitante, para a pessoa que o pratica. Que molda sua percepção sobre o outro, e que vai buscar nele exatamente o que precisa para justificar o que sobre ele tem como tese. Ou seja, todo preconceito e falta de respeito à diversidade é uma janela que se fecha para o outro, é uma redução de multiplicidade de facetas do mundo, a uma só paleta de cores. A que o preconceituoso usa. O que é de uma pobreza de espírito e falta de respeito sem limites.

A conclusão que ambas as sondagens remetem é a necessidade de abrir este tipo de temática na educação corporativa, e na forma de reconhecimento em processos seletivos, reforçando condutas, atitudes e práticas que mitiguem os riscos destas seis situações de agravo à saúde mental, qualidade de vida e sentido do trabalho, com severos impactos nos negócios, resultados e gestão de processos e pessoas.

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