Quase Mortes Reparadoras




Gilberto (41) é um lavador de carros, residente em Alagoinhas-BA.
Sem filhos, ou esposa, vive uma vida simples e mora sozinho.
Passa meses sem visitar sua mãe, e irmãos, que moram na mesma cidade.
Numa manhã de segunda, indo pra labuta, Gilberto esbarra num amigo. Este, entre assustado e atônito diz:
“Mas tu num tá morto homem?”
Um Gilberto assustado liga para um amigo para saber o que está acontecendo.

Este, ao atendê-lo, diz que não gosta de trote com coisa séria e desliga.
Encasquetado, ele dirige-se à casa de sua mãe.
Chegando lá, muitos saem correndo, outros desmaiam, outros gritam apavorados, outros o abraçam chorando.
O defunto que jazia, envolto num mar de flores brancas de cravo, não era ele.
Seus irmãos o reconheceram erroneamente no IML.
Desfeita a confusão, Gilberto ficou famoso, deu entrevistas, vestiu camisa de empresa para “merchant”, e ganhou na cidade a alcunha de morto-vivo.
Sua mãe disse:
“Eu fiquei muito alegre. Por que qual é a mãe que tem um filho que dizem que está morto e depois aparece vivo que não se alegra?”
Fiquei imaginando o quanto seria de bom, para o zeramento de faturas com a vida, uma mortezinha de araque vez por outra.
Saberíamos quem iria chorar por nós, quem se escalaria para segurar nosso caixão no caminho até o chão que chama.

Quem diria coisas bonitas sobre nós, outras nem tanto.
Quem ficaria resmungando lá fora, naquele lugar no velório no qual as pessoas se divertem observando quem chega, quase uma festa, só faltando cerveja e tira-gosto.

Observaria atento os papa-defuntos, as dívidas sendo perdoadas, os amigos remoendo as últimas cenas comigo.
“Lembro que ele postou algo sobre um dia difícil, devia está tendo uma premonição...”

Gilberto foi um felizardo, até entrevista na BBC de Londres deu, mas não foi felizardo por isso.
Foi felizardo porque, uma vez que não está morto, pessoas que o velaram pelo domingo e manha da segunda, amigos e família, poderão fazer ainda em vida as coisas que disseram, entre soluços, que fariam caso ele estivesse vivo.

Imagino que seus quatro irmãos casados irão chamá-lo com mais frequência para visita-los.
Até para comer aquela lasanha com frango no almoço domingueiro.
Os amigos farão a cota para ajeitar o seu barraco, botarão até um 3 x 1 na estante.
Os clientes do Gilberto passarão a tratá-lo com mais dignidade, visto que alguns deles souberam na missa do domingo do ocorrido e tiveram dificuldades de lembrarem-se do rosto dele.
Outros que velavam o seu corpo e comentavam que sempre os viam na praça com trajes molambentos, levariam roupa de bacana para ele vestir.
O pastor ou padre que encomendava o defunto, iria pessoalmente convidar o Gilberto para integrar a sua comunidade, aquela da praça na qual lavava carros, para a qual o ele nunca fora convidado, embora trabalhasse na área há muitos anos.
As tias e cunhadas compungidas iriam convida-lo para aniversários, para batizados.
O morto-vivo Gilberto, apelido que ficou sendo conhecido, faz-nos pensar sobre a finitude da vida, e sobre o quanto é bom não deixar perdões, ou eu-te-amos para os dias seguintes.
Poderá ser tarde.
Vamos juntando coisas que nos afastam de quem amamos, uma mágoa aqui, outra acolá. Vamos enchendo nosso coração com todo tipo de cobrança, de ódio, de indiferença.
Acho que precisamos de pequenas mortes, nossas e dos outros, para que possamos renascer relacionamentos, retomar vínculos e até refazer a confiança perdida no vale encantado do conviver.
Olhe para quem está a tua volta.
Grave o rosto delas.
Preocupe-se com elas, procure saber mais de suas vidas, compartilhar sentimentos.
Pode ser aquele copeiro que te serve o cafezinho, ou a recepcionista.
Interesse-se pelo mundo do outro com o qual convive.
Supere ressentimentos, mágoas encanecidas.
Se aprender como fazer isto totalmente, sem deixar uma pontinha sequer, manda um email pra mim me ensinando.
Contudo, uma pontinha de mágoa não faz uma guerra. É até sinal de auto-estima.
Diminua o passo, e contemple a beleza de uma pessoa humana que interage contigo.
Aproveite para dizer, a algumas delas, o quanto são especiais em teu viver.

Imagine agora quem serão os seis que te levarão para deitar a sete palmos do chão.
Que tal ligar para eles, ou mandar um sinal de fumaça, dizendo que os ama?
Não faça como Gilberto, ou seus familiares queridos, que se acostumaram a vê-lo apenas uma vez por ano, morando todos na mesma pequena cidade.
Tenho sido relapso neste item.
Acumulo dívidas com um montão de amigos e familiares que não troco um afago, há tempos.
Sou uma ameba-sapiens mesmo.
Mexeu comigo esta pseudo-morte do Gilberto, que fez libertar corações, fez fluir novamente o fluxo do amor.
O sucedido com o morto-vivo de Alagoinhas, lembrou-me a primeira cena do filme Ikiru (Viver) dirigido por Akira Kurosawa. Nesta cena, após saber que tem poucos meses dde vida, um gestor se aposenta e vai pra casa. Um belo dia, um de seus funcionários, com compaixão, bate a sua porta e o convida para sair. A cena dele balançando-se no parque municipal pela primeira vez é espetacular.

Inspirado nas quase-mortes das relações a dois cotidianas, amanhã vou mais uma vez resgatar a relação – a mulher ficou bicuda comigo porque esqueci de ligar para ela nos dias em que esteve fora.
E, quem sabe, a chamo para balançarmos num parque qualquer.
Este negócio de esperar pra ver quem se dobra primeiro, num teatro de culpas e ressentimentos, é um jogo que não estou curtindo mais.

Vai que eu morra!

A Perda dos Sentidos do Trabalho



Outro dia um colega me perguntou se eu já tinha passado por crises, ele me via sempre sorrindo. Comentei com ele que decidi alimentar meu monstro interior da esperança, e não o do pessimismo, mas ambos moram em mim. Quem me ver assim sorrindo...

A doença do desencanto no trabalho é a Síndrome de Burnout.  E sei como ela é grave. Há uns nos atrás tive uma infelicidade muito grande, com as coisas do trabalho. Sentia-me estranho, impotente frente a alguns acontecimentos que me aborreceram, angustiado com o volume de demandas e com a perda da qualidade nas entregas. Havia uma ruptura entre minha expectativa de oferecer um trabalho de excelência e a realidade em que trabalhava.

Disseram os homens de preto da época, que nossa área tinha que aprender a simplificar o processo, "para acompanhar a velocidade e ditames do negócio". Eu queria produzir o melhor trabalho, e então fui ficando chateado em ver que nem sempre o povo queria o melhor, queriam algo entre o pior e o regular.

Passei a ter fobia social, pânico de atender o telefone e medo de não dá conta, ao receber mais uma demanda atravessada. Tinha umas crises de choro, claro escondidas, e muita angustia apertando o coração. Lembro-me de um dia em que um alto executivo me "propôs" - visando aumentar a disseminação de um treinamento, para que um de nossos cursos de três dias, fosse dado num ginásio de esportes, para umas 500 pessoas, estilo aula de cursinho, reduzindo sua jornada para 4 horas, ou no máximo, 8 horas. Consegui convencê-lo do absurdo, do ponto de vista de construção de conhecimento, mas aquilo era apenas a ponta do iceberg, mudaram as estações... e eu não me adaptara aos novos tempos. Aquilo tudo foi me matando. E procurei ajuda, e na hora certa!

Hoje sei que tive a Síndrome de Burnout, descrita por Freudenberger como " um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente ligada à vida profissional". Poucos profissionais estão capacitados para tratarem o Burnout. Muito o confundem com stress ou uma inadequação ao trabalho. Ou, como no caso de minha doutora, não dão o devido valor ao que o paciente alega que acontece consigo, derivado do mundo do trabalho.

Ou ainda dizem, relaxe é só estresse. E não é. Burnout é como uma infecção emocional, provocada pelo vírus do desencantamento laboral.
A melhor comparação que li sobre a diferença entre stress do trabalho e Burnout, é que o estresse é como um elástico puxado, quando some o fator estressante, seja uma campanha de vendas, seja uma mudança no processo de trabalho, o elástico volta a posição original. Hoje chamamos de resiliência. No Burnout ele volta, mais não para a posição original, vai perdendo-se pelo caminho e ficando esgarçado, rígido. Sem resiliência. Perde-se a capacidade de relaxar e sempre as coisas são vistas pela ótica do desânimo para com o futuro dos processos de trabalho.

Desde 2004 passei a estudar este tema e identifiquei-me inteiramente com seus sintomas. Naquele ano tive Burnout. Segundo Drauzio Varella, ele "se manifesta especialmente em pessoas cuja profissão exige envolvimento interpessoal direto e intenso. Profissionais das áreas de educação, saúde, assistência social, serviço público (atendimento), recursos humanos, agentes penitenciários, bombeiros e policiais correm risco maior de desenvolver o transtorno." Há uma variedade enorme de sintomas, alguns mais comuns são: sensação de esgotamento físico e emocional que se reflete em atitudes negativas, como ausências no trabalho, agressividade, isolamento, mudanças bruscas de humor, irritabilidade, pessimismo e baixa autoestima. Os físicos são dor de cabeça, enxaqueca, cansaço, palpitação, dores musculares, insônia e distúrbios gastrintestinais.

Aprendi que ele é a doença dos amantes do trabalho. Ele é a perda do encantamento, do enamoramento com o trabalho, quase um luto. Que acontece nos que adoram o trabalho, e querem sempre apresentar o melhor resultado. Naqueles que tem ritmo acelerado, que são produtivos e perfeccionistas, zelosos e detalhistas. Nos que gostam do cliente e querem que ele tenha acesso ao melhor atendimento; seja cliente interno seja externo. De quem se identifica, realiza-se, e quer apresentar sempre o melhor trabalho.
A doença "escolhe para suas vítimas prediletas" pessoas de alto nível profissional, que cobram muito de si, de natureza perfeccionistas, e até revelando uma certa inflexibilidade ou intransigência, por saberem - no fundo, de que a sua proposta é a melhor do ponto de vista técnico.

Burnout, portanto, é um estresse ocupacional que produz um estado de esgotamento emocional, relativamente perene.
A dedicação exagerada à atividade profissional é uma característica marcante de Burnout, mas não a única. O desejo de ser o melhor e sempre demonstrar alto grau de desempenho é outra fase importante da síndrome. O Burnout deixou em mim aprendizados, que compartilho com vocês, no intuito de ajuda-los a preveni-lo.

- Aprendi que não devo me levar tão a sério. Que os fatos ruins passarão, e nós podemos ser "passarinhos".
- Aprendi que 50% de minha excelência no trabalho poderá ser o que a Instituição precisa, e não mais fico remoendo o que poderia ser. Faço acontecer com o que tenho, mesmo que seja pouco para o que gostaria de entregar de resultados, mesmo assim é muito, no lugar em que nada existia.
- Aprendi a ser o melhor para meu trabalho, e não o melhor de meu trabalho. Ao diminuir minha expectativa, entre o meu sonho laboral e a realidade para executá-lo.
- Aprendi a relevar, a não ficar discutindo os detalhes dos detalhes dos detalhes, de um projeto de trabalho e a focar naquilo que realmente se for tirado dele é quem de fato fará muita falta.
- Aprendi a não me cobrar tanto, a ser menos impaciente comigo e com os outros. Ou seja, sempre faltarão recursos necessários para um trabalho de excelência. Adapte-se a isso e ofereça o seu melhor.
- Aprendi que não tenho controle sobre tudo, mesmo exaustivamente planejado.
- Aprendi que o caos, a desordem, não necessariamente são ruins, podem ser criativos e podem criar um ambiente de melhor relacionamento interpessoal.
-  Aprendi a ter compaixão pelo meu cliente, que nem tem ideia de como me viro nos 30 para melhor atendê-lo, e muitas das vezes age para comigo com ingratidão, falta de reconhecimento ou rispidez.
- Aprendi que não preciso provar que estou sempre certo, e que aceitar uma posição que entendo não ser a melhor, vinda de outra pessoa, pode ser a possível para que o projeto continue a andar.
- Aprendi a buscar as convergências, as interações, as comuns visões. Hoje sofro bem menos. Faço o melhor possível dentro de uma realidade possível. Não me flagelo mais.
- Aprendi a desenvolver a competência emocional e política de enxergar os porões organizacionais, com suas agendas ocultas, jogos de cena, não ditos, ou malditos, não achando que é algo pessoal, chicoteando-me de forma insana.

Precisamos de Encantamentos

Água, fogo, uma estaca marcando o terreno e um abrigo de madeira: estruturas de suporte à vida humana.
Mas, só elas não representam nada.
Precisamos gravar nossa presença nas paredes das grutas onde habitamos. Precisamos da arte, da estética, da cultura. Precisamos marcar nossa existência, diariamente, desenhando e contando nossa história com gravuras nas paredes. Precisamos celebrar, e em comunhão com o clã social, partilhar nossas alegrias e sofrimentos, nossa cultura e sonhos. O clã social é aquele que para além de nossa família carnal escolhemos para dividir nossa saga. Precisamos de fantasias, desejos mais profundos. Precisamos de amigos para em comunhão, encontrar um sentido e forças para continuar nossa jornada. Encontrar espelhos de identidade e idiossincrasias.
Precisamos da dança, da música, da história, da escrita, da mística e de um jardim para chamar de nosso. Somos sedentos de encantamentos. De enamoramentos e assombramentos que elevem e transcendam nosso vir-a-ser. Precisamos de florezinhas na janela, de pequenos prazeres, de uma mesa com uma comida amorosamente preparada. Precisamos de abraços, colo, sorrisos, afagos e cafuné. Precisamos de humor, de paz, de sentirmos solidariedade, de sermos solidários, de sermos reconhecidos em nossa presença e individualidade.
Tijolos são importantes, erguem uma casa. Mas não fazem dela um lar. Um lar tem cheiro de gente, de comida, até de bichos e de plantas. Um lar tem sons, bagunça, coisinhas que decoramos prateleiras, tem pedaços de vida, em forma de objetos materiais, que fomos juntando por aí e que nos falam bastante. São mais que uma caneca, um armário velho, um disco de vinil. 

São nós.Um lar tem lazer, quintais, varandas, quartos de despejo, lugar para despejos de detritos e banho, livros, discos, tecnologia, cozinha acolhedora, dispensa quentinha. Somos mais que água, fogo, tijolos para os que em nós fazem morada. Somos eternidade! Somos aqueles que curtem, comentam e compartilham as nossas travessuras, aventuras, desventuras.Somos alguém que um simples eu te amo, ou um - você me faz feliz, pode alterar todo nosso dia. Somos uma raça besta que gosta de festa, de futebol, de carnaval, natal, São João, o escambau. E é isto que nos torna maravilhosamente belos. Somos mais que água, tijolos, abrigo e fogão.
Somos liberdades e temos um milhão de possibilidades de metamorfosearmos nossa existência, a cada dia, surpreendemos antes de tudo a nós mesmos. Convido-lhe a surpreender-se nesta semana que inicia. Sendo menos matéria, mais espírito.

10 dicas para acabar com o estresse no trabalho

http://www.infomoney.com.br/carreira/emprego/noticia/2580781/dicas-para-acabar-com-estresse-trabalho

Quais são tuas obras?





Uma reflexão sobre a centralidade do trabalho e
seus impactos noutras dimensões da vida e do viver.

Outro dia um amigo me abordou, no corredor do trabalho, perguntando-me se eu já tinha visto um casal de João de Barro que constrói sua casa na fachada da portaria central da Diretoria de Tecnologia.

A janela, por eles utilizada como alicerce para sua morada, situa-se próximo a um jardim externo, utilizado como um fumódromo. Este colega integra o grupo dos fumantes matinais.

Chama-se André. André é um fumante sensível, daqueles que ao pitar contemplam a paisagem. E, ao fazê-lo, não podem deixar de se sensibilizarem com o que veem.

Não fosse por ele talvez não tivesse visto aquela cena, visto que acesso o andar no qual trabalho pelo elevador do subsolo.

Que legal quando podemos curtir, comentar e compartilhar algo bacana com alguém; algo que pode ser útil ao outro. Que pode edificar. Criando uma comunhão de valores, tal qual uma corrente, uma corrente do bem.

No outro dia vim ao trabalho com máquina em punho.

Cheguei cedinho, abri uns e-mails, orientei meu pessoal na agenda do dia, abasteci-me de café... e fui ver o ninho daqueles pedreiros-avoantes.

Mal conseguia fotografar de tanta boniteza. Enquanto um amassava o barro o outro ou outra ia buscar mais, numa série de voos rasantes.

Não se incomodavam com meus cliques, ou outros que ali pitavam e assistiam à cena.

Faziam seu trabalho com senso de urgência.

Contemplei a paz daquele casal de pedreiros da natureza por uns minutos. Nos dias seguintes, sempre que podia voltava para vê-los em sua jornada.

Fiquei embevecido com a singela construção e com o trabalho em sincronia, sintonia e sinergia dos Joões de Barro, sim Joões mesmo, estanho, mas é.

Enquanto um ia buscar barro molinho, ainda úmido pelo orvalho da madrugada, o outro com a ponta do bico amassava a parede, erguendo-a “tijolo” a tijolo.

Havia uma arte no depositar do barro que estava no bico, na parede que o outro moldava. Não era uma coisa jogada no chão. Havia uma espera que o outro parasse, aí sim, quem esperava com a massa argilosa no bico, depositava em cima do muro e o outro retomava a prensagem.
Esta foto expressa este momento de espera.
Ele nunca jogava no chão o barro. Que sabedoria.
Não desperdiçava a massa que trazia com dificuldade entre os bicos.
Senti em ver muitos colegas entrando apressados no corredor da portaria central, correndo para baterem seus pontos, e perdendo a chance de contemplar esta façanha. Nem que fosse no intervalo do cafezinho das 10h00minhrs. Valia descer para observar o trabalho em equipe daquele casal.
Deu até vontade de afixar um cartaz: “Parem, olhem a sua esquerda, no alto da fachada, e contemplem um casal em lua de mel erguendo seu ninho, centímetro a centímetro”.
Durante uns dias, fui agraciado com tão singelo fenômeno da natureza.
Comecei a notar que outros colegas estavam indo vê-los também.
As manhãs tornaram-se mais belas, ficava curioso para ver o quanto tinham avançado na casinha.
Vez por outra cruzava com outro observador que passara também a frequentar o local e acompanhar a saga do casal de pássaros.
Alguns comentavam que os bichinhos eram tinhosos, só trabalhavam até 11h00min da manhã, e à tardinha.
Outros falavam da crueldade do macho quando descobre ser traído, fechando a casa coma fêmea dentro.
Pesquisando na internet descobri uma enormidade de estórias sobre isto, o que me deixou encasquetado.
Por que precisamos de um modelo passional de relacionamento animal, que justifique - não sem um risinho irônico, que o macho ao ser traído mate a fêmea?
Foram poucos os sites que investigaram a fundo esta estória.
Parece-me que a fúria besta de cornos é ativada num inconsciente coletivo nesta estória, servindo como uma metalinguagem de comportamentos que na racionalidade humana afirmamos que são errados.
Não vi ninguém defender a passarinha de poder optar por outras escolhas em seu viver.
Ou até questionar o que tinha feito o Machão de Barro para levá-la a arrastar as asas para outro.
Um debate tão ridículo como o que justifica matar por ciúmes, ou como dizem, por amor, um amor minúsculo.
Achei uma explicação que mostra de onde veio esta lenda urbana, o que não diminui as projeções inconscientes, revestidas de um humor-mórbido, de quem gostaria de fazer algo igual, caso lhe acontecesse isso, uma pena.
Pesquisando achei várias fontes que contrariam esta lenda, abaixo transcrevo uma delas de http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/joao-de-barro/ a seguir:

---------------------------------------------------------------------------

Há uma crença popular, inclusive mencionada em literatura ornitológica, de que o joão-de-barro, Furnarius rufus, empareda dentro do ninho a fêmea que o tenha traído. Pessoas adultas, mesmo com relativa experiência de vida, afirmam isto com a maior convicção. Esta estória imputa ao joão-de-barro duas pechas. Primeiro, a de que suas esposas são capazes de trair. Segundo, a de que os maridos são capazes de cometer assassinatos passionais.

Na verdade tudo não passa de um mito. E este mito pode ter surgido de dois fatos. O primeiro é de que alguns ninhos abandonados do joão-de-barro são aproveitados por abelhas indígenas como a uruçú-mirim, para fazerem sua colméia. As abelhas fecham a entrada do ninho com uma cera, dando a impressão de ter sido fechado pela ave. Mas olhando-se mais atentamente nota-se o engano.

Outra possível explicação, a meu ver a verdadeira, é a seguinte. Hudson, em uma obra de 1920, cita um interessante episódio ocorrido em Buenos Aires. Uma das aves (não foi possível saber se o macho ou a fêmea, pelo fato de serem muito parecidos) foi acidentalmente pega em uma ratoeira que lhe quebrou ambos os pés. Após liberada com muita consternação por quem havia armado a ratoeira, voou para o ninho onde entrou e não foi mais vista, ali morrendo certamente. O outro membro do casal permaneceu por ali mais dois dias, chamando insistentemente pelo parceiro. Em seguida desapareceu retornando três dias após com um novo parceiro e imediatamente começaram a carregar barro para o ninho, fechando a sua entrada. Depois construíram outro ninho sobre o primeiro e ali procriaram. Hudson viu este fato como mais uma "qualidade" do joão-de-barro, por ter tido o cuidado de sepultar sua parceira. É possível que esta história, publicada originalmente em um periódico científico, tenha sido divulgada muitas vezes em revistas e jornais, como acontece hoje com diversos assuntos, tornando-se logo de domínio público.

Acontece que toda história contada e recontada repetidamente, vai incorporando um pouco do floreado ou mesmo da fantasia de cada um, acabando muitas vezes com seu real sentido totalmente desfigurado. Tudo indica que foi o que aconteceu neste caso. Uma música popular, chamada "João-de-barro", de Tonico e Tinoco, muito cantada por Sergio Reis também deve ter contribuído para popularizar essa estória:

O João de Barro, pra ser feliz como eu Certo dia resolveu,
arranjar uma companheira
No vai-e-vem, com o barro da biquinha
Ele fez sua casinha, lá no galho da paineira
Toda manhã, o pedreiro da floresta
Cantava fazendo festa, pra aquela quem tanto amava
Mas quando ele ia buscar o raminho
Pra construir seu ninho seu amor lhe enganava
Mas como sempre o mal feito é descoberto
João de Barro viu de perto sua esperança perdida
Cego de dor, trancou a porta da morada
Deixando lá a sua amada presa pro resto da vida
Que semelhança entre o nosso fadário
Só que eu fiz o contrario do que o João de Barro fez
Nosso senhor, me deu força nessa hora
A ingrata eu pus pra fora por onde anda eu não sei. "

----------------------------------------------------------------------------------

Desfeito o preconceito, espero, voltemos à beleza do feito deste casal e seus ensinamentos.
Um deles é o de saber a hora de parar.
Notamos a comunidade de observadores de Joões de Barro, que se reunia nas manhãs por breves momentos, que a após o meio-dia eles não trabalhavam.
Trabalham forte, firme, desde o nascer do sol.
Aproveitam o barro úmido do orvalho, mais fácil e ser retirado e no ninho, socado e moldado em forma de parede.
Lembravam os lavradores nordestinos que mal o sol desponta no horizonte, às 5 da manhã, E já estão com enxadas em punho abrindo o solo seco e pedregoso, como que aproveitando a condição do solo está mais úmido pelo orvalho para deitar as sementes.
Não seria a mesma estratégia?
Fiquei meditando sobre a estratégia destes pássaros de não trabalharem à tarde.
Dão um duro danado e depois param.
Devem contemplar o resultado de seu trabalho e dizerem, por hoje é só.
O assanhado João deve dizer a sua Maria: Vamos dá um rolé por aí, garota?
Devem sair em busca das térmicas que os elevarão às nuvens mais altas.
Devem procurar uns insetos para almoçarem.
Devem namorar à sombra de árvores floridas, perto de nascentes de rios ou lagos, que vez por outra são usadas para refrescarem-se e tomarem um gostoso banhozinho a dois.
Sábios Joões de Barro.
Todos nós deveríamos ter um local para ir após o trabalho.
Um local para voar e contemplar o infinito.
Um local para reestabelecer energias, para descansar a mente e paradoxalmente, poder criar mais ainda, aproveitando outras referências de mundo.
Por mais sentido que tenha um trabalho. Por mais prazeroso que seja – imagine o prazer deste casal de pássaros vendo passo-a-passo, como fruto de seu trabalho, erguerem-se as paredes do ninho que abrigará os frutos do seu amor. Há muita vida lá fora a ser vivida, para além da labuta diária de erguer paredes de ninho.
Por mais obcecado que esteja com uma obra, há outras obras que esperam você.
Outro dia um amigo me perguntou se o segredo de ser feliz não era justamente o de ser obcecado por um trabalho, por uma única obra.
Disse-lhe que não. Justamente uma coisa que os gênios têm em comum é o gosto eclético. Curiosos que são, estão sempre disponíveis a novos aprenderes. Seja a música, literatura, filosofia, pintura, espiritualidade, esportes e outros hobbies.
Sábios Joões de Barros, exemplos de trabalho em equipe e de cultivo de novos prazeres.
Fiquei pensando se não podemos, a exemplo da lenda urbana - como numa metáfora ao terminar de erguer a obra, fruto de nosso trabalho, ficamos dentro dela aprisionados.
Será que não corremos o risco de ficar aprisionados ao trabalho, ao ponto de perdemos outras razões pelas quais viver? Dentro deste ninho de barro que construímos?
Será que ao não mitigar este risco o momento da aposentadoria não trará consigo infelicidade e vazio?
Fiquei nesta noite feliz.
Feliz por perceber que amo meu trabalho.
Por me sentir erguendo uma obra, lentamente, mesmo apesar de dias mais ou menos difíceis.
Mesmo apesar de tanta montanha ou entulhos que temos de remover, e de fogos amigos que temos de nos desviar.
Mesmo assim, não saberia fazer algo diferente.
Assim como o casal de pássaros, dou duro e me envolvo com o barro que vou levando ou moldando. Atuando junto a outras pessoas que dão sentido a obra coletiva do trabalho, do qual sou integrante. Pessoas que aprenderam o valor dos 5S no ambiente de trabalho: simpatia; sinceridade, sinfonia, simbiose e sintonia.
Feliz também por me ver voando para nuvens do infinito, todas as tardes a partir das 17h30min, quando saio do trabalho e vou buscar JG na creche; depois sigo para lecionar, e mais tarde – exausto, mas feliz tenho o prazer de voltar pra casa.
Feliz por perceber que não me perdi nos meus 26 anos de trabalho diário, de meus arvoredos, mananciais, apriscos e lugares para onde voo sempre que não estou na labuta: lugares de fé; de hobbies, de amizade; de encantamento; de solidariedade; de cultivo de novas aventuras.
Nuvens te aguardam para além da obra que tu ergues.
Por mais importante que teu trabalho te seja, não deixe que ele sugue toda a tua essência.
Roube-lhe todo o tempo. Afaste-lhe de outras fontes de prazer e realização.
Tua família, novos estudos, tua vocação cidadão, etc.!
E, quando estiver construindo teu labor, aquele diário das muitas horas a ele dedicadas, lembre-se de fazê-lo com afinco, comprometimento e paixão.
Ela é a tua marca, tua expressão.
Ama teu trabalho.
Lembre-se que o “meio-dia” chegará tão rápido, quando se trabalha com sentido, que nem notará que passou.
Aí, é só limpar o bico, e sair voando em busca de infinitos em forma de pessoas, aventuras e novas possibilidades e papéis no teatro da vida e do viver.

Espíritos de Porco

Hoje um amigo sentiu o peso da ingratidão e entristeceu. Num momento de desabafo, disse-me que cada vez mais desacredita da pessoa humana. Cada vez mais acredita que o geral da humanidade é constituído de pessoas más, interesseiras, invejosas e podres.
Lembrei desta foto que fiz recentemente. 
Às vezes temos que mirar nosso olhar para além das cercas e das prisões da realidade. 
Estas trevas, espíritos de porco (EDP) - prisões aramadas, com as quais eventualmente somos obrigados a conviver, não deveriam alterar nossa percepção, moldando-a, a ponto de não vermos mais a beleza de outras pessoas - mesmo que por trás de cercas. Nivelando-as todas como "farinha do mesmo saco". 
Amigo entristecido, afirmo e reafirmo, existem pessoas-luz. 
Gente que reconhece, gente sábia, gente que ama, gente que agradece, gente solidária. 
Só são tímidas, humildes. 
Geralmente são os espírito de porco que grunhem mais alto, e fica parecendo que tudo tá ruim, que todo mundo está infeliz. São os mais críticos, pessimistas, os que sempre querem levar vantagem em tudo.
Aos que me leem, peço, não desanimem da existência humana! 
Fiquem bravos, tristes, deprimidos, putos da vida, mas só por uma noite e um dia. Releve os EDP soltos por aí, com os quais tem de conviver. 
Você não os mudará. Mas, se não tiver cuidado, eles o mudarão, tornando-lhe como a um deles.

Pessoas-Kintsugi




Eu sou alguém que sempre está precisando de reparos na oficina da vida.
Muita gente foi juntando os cacos de meu viver que se espalharam ao leu: uns provocados pela saudade de lá, outros por desamores de cá, um mais ao fundo de solidão na multidão, outro, menos aparente, de um medo do futuro, medo de partir antes do JG desabrochar.
Cada um que cruzou em meu viver conserta um pouco estes cacos, une-os.
Completam-me a ponto de poder disfarçar o quanto de tecido puído e rasgado há na trama de meu ser. E, e muitos ainda me consertam, depositando ouro nas minhas imperfeições.
Tal qual a Kintsugi, técnica japonesa de colar pedaços preciosos de vasos quebrados, utilizando-se de ouro derretido. A ponto de o vaso ficar mais precioso ainda, mesmo com suas imperfeições.
Tive em meu viver pessoas-kintsugi, que quando todos viam caos no meu existir, elas foram mansamente juntando-me, pedaço a pedaço, e unindo-me novamente tornando-me algo menos disforme.
Hoje falo de algumas delas, que testemunharam momentos-ruptura em meu viver.
Falo de Dona Joaninha.
Conheci Dona Joaninha na Capela de São Sebastião, na qual fui seminarista de 1977 a 1982.
A Capela ficava na periferia de Campina Grande-PB, formada por gente pobre, simples, trabalhadores braçais e desempregados.
Naquela Capela, por quarto anos fiz minha formação prático-teológica para ser padre.
Eu era um dos quatro seminaristas-menores que chegavam na sexta-feira, e voltavam aos lares no domingo. Nossa agenda era cheia: reunião de oração, ensaio cânticos; catequese; comunhão aos doentes, celebrações nos lares, rito da palavra nos sábados à noite, grupo de jovens, etc.
Éramos quatro jovens vocacionados, só eu não virei padre. Carlinhos, Assis e Cristovam são padres ainda hoje.
Dona Joaninha tinha uns 80 anos, e nem sempre conseguia ir às Celebrações, pois era fraquinha do pulmão. Tossia muito e estava sempre “mais pra lá do que pra cá”.
Ela era minha “cliente” da comunhão aos doentes.
Chegar à sua casa, após um final de semana intenso de reuniões e pastorais, era um bálsamo.
Tinha sempre um cafezinho pronto, uma broa de milho.
Entre uma tosse e outra, ela dizia o quanto aquele momento da comunhão era especial para sua vida.
Nunca a vi reclamar de nada.
Sempre acolhedora e orante.
Um triste dia decidi que não iria mais ser padre. Tinha ingressado no curso de Eng. Civil, em 1982.
E não aguentaria o celibato.
Aproveitei o final da Semana Santa e anunciei aos colegas seminaristas e à Comunidade.
Foi um choque.
Todos correram para me abraçar, olhos marejados.
Senti, pela primeira vez, o que é o luto.
Estava muito abatido. Tinha certeza da decisão, mas sentira muito.
Aquela era uma espécie de “capela-escola” para novos padres e eu não podia continuar à frente de seus trabalhos.
No domingo de páscoa fui levar a comunhão pra dona Joaninha.
Sabia que era a despedida.
Ela abraçou-me longamente.
Até a tosse silenciou.
Em palavras entrecortadas de emoção pediu-me para continuar levando-lhe a comunhão.
Que mesmo sem querer ser padre eu era muito estimado por ela e ela queria receber semanalmente de mim a hóstia consagrada, já que sua doença a impedia de ir à Capela.
Dona Joaninha verteu litros de ouro derramado nas minhas feridas da separação, separação de amantes da mesma fé.
Por anos, ainda fui levar-lhe a comunhão, até que ela faleceu.
A visita na casa de Dona Joaninha era um bálsamo. Sempre mansa em paz, alegre e com um cafezinho a nos esperar. Ela era uma pessoa-kintsugi. Mesmo sem falar muito, sua expressão de bondade, de ternura, tornava sua casa um altar. Um fecundo poço de vida.

Outra pessoa-kintsugi foi Irmã Marie Etienne.

Ela era a Diretora de um Colégio de Freiras – o Imaculada Conceição DAMAS, nos idos de 1981. A conheci das pastorais da juventude, das quais participava. Houvera ingressado no curso de Eng. Civil e procurava um bico que custeasse os livros. Soubera que um professor de física das Damas houvera todo um derrame, e consequentemente se afastado das atividades docentes.
Tomado de coragem procurei Etienne. Acho que foi amor à primeira vista, e é por que ela tinha a fama de ser a dama-de-ferro do colégio. Sempre me dei bem com damas-de-ferro. Ela ouviu minhas inquietações e falou-me que a vaga já houvera sido preenchida.
Contudo, me propôs um desafio, que eu ensinasse religião aos jovens do 2. Grau: no Primeiro e Segundo Científico.
Ela propunha uma disciplina que levasse à reflexão fé x vida, nos moldes que as pastorais de juventude, inspiradas pela Teologia da Libertação, estavam fazendo na cidade.
Entre espantado e feliz, topei na hora. Foram lindos anos como educador naquele Colégio. Aprendi a contemplar, conjuntamente com meus alunos, o objeto do conhecimento - mesmo sem nunca ter lido à época Paulo Freire ou Rubem Alves. Era instinto. Naquelas aulas, muitas ao ar livre, discutíamos sociologia, política, filosofia, e até vez por outra religião...
Mas onde entra o Kintsugi?
Era Natal de 1984, fui pegar no dia 26 o resultado de um exame de gravidez da minha namorada. Aluna do III Científico.
Como nosso namoro era pesado, daquele tipo que só falta a “penetração formal”, e ela parou de menstruar, desconfiei que “algo” poderia ter subido nadando pela corrente de seu rio vaginal.
Lembro quando a moça me deu o exame e disse, - “Você é o pai? Parabéns!”
Minha vida quebrou-se em mil cacos.
Saí dali e entrei no Convento de Freiras das Clarissas, sentei-me no jardim da entrada e chorei copiosamente, chorei as mil lágrimas. Entre o resultado do exame, 26/12/1984 e o casamento 05/01/1985 foram dez dias.
Virei escândalo público. Não só pela ligação com o Colégio da Aluna grávida, como pela minha presença nas pastorais da juventude.
Tão logo casei, fui ao Colégio das Damas, dá baixa na carteira profissional, pedir demissão.
Morto de vergonha.
Etienne me abraçou. Consolou-me, não queria minha demissão.
Falou-me do amor de Deus. Do perdão de Deus. Estas coisas.
Eu, de tão envergonhado não olhava para ela.
E o quanto eu era importante para o Colégio.
Insisti, disse-lhe que minha autoestima religiosa estava abaixo de zero, e que não tinha a mínima moral para olhar os alunos.
Ela, visivelmente entristecida, aceitou.
Não esperava tanta compreensão.
Aquilo fluía pelo meu interior, qual ouro derretido que selava e fundia os cacos de meu vaso interior quebrado.
A dama-de-ferro revelava-se de imensa bondade, empatia, de quase um espírito maternal, eu tinha 20 anos.
Colou-me para que eu pelo menos voltasse a caminhar.
Aposto que fez reunião com a comunidade docente pedindo-lhes que preservassem meu ser.
Despediu-se de mim, não sem antes dizer que me pagaria ainda o mês de fevereiro, programando a baixa da carteira para março.
Ela foi meu Kintsugi. Ajudou-me a conviver de cabeça erguida com a vergonha de meu ato, vergonha que sentia quando entrava na Igreja do Rosário e os jovens para os quais eu era exemplo me viam, me acompanhou meses adentro, só sendo curada com a exata medida que meu filho crescia nos meus braços.
O nascer do Tiago me libertou de toda culpa, de todo pesar, de toda vergonha.
Vendo-lhe tão pequeno no meu colo, senti-me o mais forte dos Homens.
A médica que atendeu Cristina em sua gravidez de alto-risco do JG, inclusive fazendo o parto antes do tempo, com 31 semanas, Dra. Narayana, foi uma de minhas alunas de religião daquele colégio. E a esposa de meu irmão, a Patrícia Galdino, apresentado por mim a ele, idem. Coincidências? Nada. Kintsugi que flui.
Para finalizar, não poderia deixar de falar de meus pais-kintsugi, que tiveram presença marcante na mesma cena acima relatada.
Para eles aquela gravidez nas coxas também foi um choque.
Contudo, não se furtaram em correrem para me ajudarem.
Desfizeram-se de suas parcas economias das aposentadorias do Senai, e em dez dias montaram casa para seu filho.
Mas que casa, abriram seus corações e não deixaram que mais agressões chegassem até mim.
Pouparam-me e não me deixaram abater ainda mais.
Não ficaram me ofendendo com sermões sem sentido, após o leite derramado.
Eu gostava da namorada, fomos casados ainda por dez anos, mas foi toda uma vida que se precipitou, foi um amadurecimento no carbureto. Envelheci uns cem anos, em dez dias.
Meus pais durante muito tempo, mesmo nos primeiros anos de BB, davam-me ajuda financeira para cobrir os custos de uma família. Nunca me deixaram desesperar por problemas financeiros. Mesmo quando fui morar uns tempos na sua casa, por não ter dinheiro para pagar as contas regulares, eles ainda assim me diziam: vai passar, num instante vocês voltam pra casa, é só uma crise passageira.
Como foram sábios e amorosos.
Meus pais-kintsugi!
Dona Joaninha, Irmão Etienne e meus pais, eu sobrevivi!
Muito obrigado por juntarem meus cacos e os colarem com o que podiam.
Outros tantos juntaram meus cacos vida afora: Catão, Ari, Marcos Gouveia, Valzenir, Alcione, Pedro Nelson, Deraldo, João Júnior, Sergio Dantas, Gustavo, Andrea, Patrícia Galdino, Cristina Pinatti, Tiago, Rodrigo, Priscila e JG, muito obrigado por existirem!
Eu quero ser kintsugi para quem eu possa. Quero tornar alguém, mesmo que quebrado pela vida, desfeito em mil pedaços, melhor ao cruzar meu caminho.
Quero ajudar-lhe a sarar as feridas, fundido nos seus pedaços de ser que se espalham-se ao léu, qual os meus, um rio de ouro derretido que ao fundir vai colar seus pedaços interiores.
Ouro temos de sobra, é só buscarmos no interior uma palavra mansa, amiga, de estímulo, de consideração, de reconhecimento, de gratidão, de solidariedade e semeá-la no coração dos cansados e abatidos.
Palavras que poderão vir também na forma de gestos concretos, tais os que recebi de Joaninhas, Etiennes, Evandy e Denises de meu viver.
Para eles pode até ter sido pouco. Para mim, eram as tábuas que faltavam - na ponte de minha existência, para que eu pudesse continuar trilhando a minha jornada pessoal por mais uns metros, em busca de novas oportunidades que o futuro reservara para mim.

Atitude é tudo!

Atitude, o segredo dos que mudam realidades. 
Atitude, agir quando todos observam.... omitem-se. 
Atitude, "quem sabe faz a hora. Não espera acontecer."
Emociona-me ver que ainda existe pessoas assim, como este garçom que se colocou entre os clientes do restaurante em que trabalha e a polícia que queria retirá-los à força. 
Era dia de manifestação na Espanha contra o governo de Mariano Rajoy, e o
s manifestantes, acuados pela polícia, refugiaram-se no restaurante que o garçom Alberto Casillas, de 49 anos, trabalha.

Fiquei me sentindo um verme. Acho que não faria isso. Me acovardaria. 

Obrigado Casillas por você ser quem é, e ter feito o que fez. Uma pessoa comum, fazendo algo surpreendentemente incomum. O fato foi em 25-09-2012, abaixo o link do vídeo.

Dividir projetos de vida!

Etimologicamente, companheiro é quem 

dividia o mesmo pão.

Camarada a mesma cama. 

Este casal de João de Barro divide o lar! 

Quem divide o lar, divide a vida! 

Sejamos joões-de-barro, ao dividir com quem 

amamos nossos projetos de vida. 


        Ficará mais fácil de carregá-los.

Crônicas Anteriores