O Cravo e o Tempo (Autor Ricardo de Faria Barros)

Se tem uma coisa que gosto é de caminhar pelo quintal de minha consultoria e clínica de psicologia, a Ânimo. Desde pequeno gosto de quintais. Acho que um quintal - daqueles do jeito de casa das vovós do interior: cheio de tralhas, esconderijos, bem arejado e fresquinho, com vasos floridos colocados em tudo que é de recipiente, roupa no varal, cheiro de terra molhada, pássaros cantantes, árvores sombreadas, frutas suculentas, galinhas e outros animais de estimação é o que mais de perto conheço do paraíso, da paz de Deus em nossa vida. Quintais são terapêuticos.
No quintal da Ânimo temos dois pés de Cajá, um de Tamarindo, um Abacateiro, alguma Bananeiras e um pé de Cravo.
É amigos e amigas, um pé de Cravo. Eu não conhecia a árvore do Cravo, até que o simático jardineiro apresentou-me a ela.
Para comprovar que era mesmo, ele solicitou que eu mascasse uma de suas folhas.
E, uaauuu!!!
Era Cravo da Índia mesmo, e que sabor, que aroma!!! Pensar que essa especiaria era uma das mais cobiçadas, no campo dos temperos, nas transações comerciais entre os povos,
Criei o hábito de sempre passar pelo quintal, colher uma de suas folhas, e mascá-la com prazer.
Ontem vi uma folha de um verdinho claro, mais novinha do que as utras, de verde oliva, bem escuro.
Pensei comigo, essa folha deve ser uma delícia de mascar, de estar bem molinha e deliciosa.
A parte do molinha eu acertei. Mas, para minha surpresa, não tinha gosto de nada. Gosto de folha. Apenas. Nenhum aroma, nenhum sabor de Cravo da Índia, e eu fiquei decepcionado. Logo colhi uma outra, de cor verde oliva, e pimba. O sabor estava ali, novamente, e o frescor e aroma do cravo invadiu minha vida novamente. Ufa!
O que difere uma folha da outra, em seu sabor e aroma? Se ambas são da mesma árvore?
O tempo. Apenas ele.
Uma tem menos tempo do que a outra, e ainda metabolizou as essências perfumadas e curativas do Cravo.
Tempo, tempo, tempo, tempo...
O tempo é um grande "compositor de destinos", como dia a canção Oração ao Tempo.
E, para cada um de nós, esse compositor tem sua própria partitura. Ninguém vive o tempo da mesma forma. Ninguém.
Pois, ele é função da história e momento de vida, das necessidades, desejos e expectativas sobre algo, que em nós podem ser extremamente diferentes. Vejam por exemplo o texto a Semana, de Alexandre Machado, veiculado numa das propagandas mais premiadas da publicidade brasileira.

A Semana
Para um preso, menos 7 dias
Para um doente, mais 7 dias
Para os felizes, 7 motivos
Para os tristes, 7 remédios
Para os ricos, 7 jantares
Para os pobres, 7 fomes
Para a esperança, 7 novas manhãs
Para a insônia, 7 longas noites
Para os sozinhos, 7 chances
Para os ausentes, 7 culpas
Para um cachorro, 49 dias
Para uma mosca, 7 gerações
Para os empresários, 25% do mês
Para os economistas, 0,019 do ano
Para o pessimista, 7 riscos
Para o otimista, 7 oportunidades
Para a terra, 7 voltas
Para o pescador, 7 partidas
Para cumprir o prazo, pouco
Para criar o mundo, o suficiente
Para uma gripe, a cura
Para uma rosa, a morte
Para a história, nada
Para Época, tudo

Não deixe de ver o vídeo, desse comercial em: Vídeo A Semana

Quer condenar um ansioso? Diga-lhe que espere! 
Quer condenar um casal, peça que um deles diga ao outro que só o tempo dirá o que será da vida comum entre eles. 
Quer condenar uma mãe, diga que só poderá avaliar melhor a situação de saúde do filho, após um certo tempo, "tem que evoluir mãe...".
Quer libertar um ansioso? Diga-lhe que o vôo está no horário.
Quer libertar um casal enamorado, marque as data de um amanhã possível, entre eles. 
Que libertar uma mãe, diga-lhe a data que o filho distante virá visitá-la. 

Todos temos nossos relógio do tempo interior, e encontrar a paz no ritmo dele, que é função muitas  das vezes do ritmo do outro, é um grande exercício sabedoria, uma verdadeira maturação interior.

É o processo que a folha verde claro, mais novinha, terá que passar. Não adianta ela querer queimar etapas. Ela terá que acolher sua jornada, que pede o tempo da natureza, que dia à dia, noite à noite, vai transformando ela numa folha verde-oliva, cheia de óleos aromatizados e saborosos. Mas, tem que saber sofrer a espera do tempo. De nada adiantará ela clamar á natureza que fique logo perfumada e gostosa de mascar. De nada adiantará. Precisa passar pelo vale de lágrimas do tempo, com suas angustias e sofrências, vivendo esse momento de espera com um coração confiante na força das sementes que para vingarem precisarão ainda de muitos amanhãs vindouros. 

Assim é com o tempo, quando sua espera e vivência é feito na graça de Deus, e no tempo das horas Dele. Somente Dele!
Isso nos tornará mais aromatizados e saborosos, ao viver qualquer que seja o tempo de uma espera de forma orante. Se se avexar. 
Por falar em avexar, expressão que tem um de seus sentidos como: não se agonie; não fique nervoso; não se aperrei; tenha calma..., o poeta Acioly Neto fez uma obra prima sobre o tempo, em ritmo de forró, de uma sabedoria que impressiona, vejam: 
"Se avexe não
Amanhã pode acontecer tudo
Inclusive nada
Se avexe não
A lagarta rasteja até o dia
Em que cria asas"

Então, caros amigos e amigas, esse texto é para você que vive numa expectativa da espera por algo. Se avexe não, deixe o compositor do tempo escrever na partitura de sua vida, e no ritmo dele. 
Viva qualquer que seja a experiência que está passando como se ela estivesse produzindo em ti capital emocional positivo, tivesse trabalhando na folha de sua vida, tornando-a melhor, mais aromatizada e saborosa.

Coisa que só o tempo faz em nossa vida e o viver, desde que aprendamos a vive-lo como dom, graça e nos infinitos de nosso coração.

Nada é para ontem, e tudo pode vir a ser no amanhã.   E, esse capital tempo, enquanto ainda não vira uma folha de cravo bacana, daquela que cumpre com seu propósito, pode se investido em tanta coisa que pede o teu olhar de rosa, sobre elas.

Resumindo. Enquanto espera por algo, contemple e intervenha na paisagem, tornando-a melhor!  O maior capital que temos é do dia que vivemos. E não podemos fazer desse capital algo sem valor. Precisamos com ele construir o nosso quintal, e confiar que um dia aquele quintal era apenas um terreno abandonado, cheio de mato, material de construção ou lixo. E foi a mão paciente, perseverante e esperançosas, de uma vovó caprichosa, que fez do nada surgirem roseiras em flor, frutas maduras e todo tipo de vida que nele procura abrigo e alimento. 

Mas, se voltar os ponteiros do implacável relógio do tempo, verá que um dia nada daquilo era esse quintal que agora caminho, por entre alamedas sombreadas de pés de cajás de mais de 20 metros de altura. Um dia, há uns 30 anos atrás, alguém trouxe duas mudas dessa árvore do Nordeste, e hoje elas estão frondosas e cheias de vida em seu interior. Foi preciso tempo para isso acontecer.  Assim será sempre com nosso amadurecer como ser humano, precisaremos passar por situações, experiências e acontecimentos, que ao longo do tempo, vão nos constituir como vinagres (ácidos, resignados e rancorosos), ou um bom vinho (doces, esperançosos e otimistas). Para ambos, o tempo dos acontecimentos foi o mesmo, o que mudou foi o olhar, a ação e o aprendizado sobre os mesmos.

Portanto, não apresse o rio. Ele corre sozinho, apenas confie. E, enquanto confia, lubrifique as engrenagens do relógio de seu destino. Não espere nada de braços cruzados! Nem que seja orando, faça algo para que essa espera seja um tempo de maturação e daqueles bem proveitosos. 

Reset e Power de Si Mesmo. (Autor Ricardo de Faria Barros)

Há um tempo de resetar, e outro tempo de reinicializar o sistema humano.
Estava fazendo uma sessão de life-coaching e minha cliente chegou naquele dia com visíveis sinais de júbilo.
É que após dez longas semanas de sessões, nos quais cultivamos de espaços de autoconhecimento, ela teve uma iluminação e se sentia potente para avançar à próxima etapa, a do autodesenvolvimento para a alta performance, na vida profissional e pessoal.
Brinquei com ela dizendo que ela tinha resetado seu sistema cognitivo-emocional, ao se permitir fazer aquele profundo mergulho em si mesma. E que agora, ela ousou teclar o power novamente, acionando aquela tecla para reinicializar seu sistema novamente.
Ela sorriu e confirmou.
Quantas vezes em nossa vida precisamos ter coragem para mergulhar em nós mesmos, e tirar de nossa vida tudo que é enganação e que nos oprime.
Não se trata de um processo fácil, e cada um dos que me lê sabe dos momentos de resets que já teve na vida.
É aquele instante em que sacamos que não dá mais para ser feliz, continuando fazendo as coisas do mesmo jeito, se de fato queremos que aconteçam coisas diferentes em nosso viver.
Considero um dos momentos mais ricos na vida e crescimento de um ser humano.
É quase como se trocássemos de pele, como as cobras fazem, ou de garras, como as velhas águias também.
Um monte de coisas foram se juntando ao nosso sistema cognitivo-emocional e estão pesando.
Nesse momento da sessão ela falou de uma viagem que fez num parque num país da América do Sul. Ela sabia que teria que prover sua alimentação e de mais duas pessoas que a acompanhavam, e por dez dias. E que, ao entrar na trilha, estaria pela sua própria responsabilidade a responsabilidade, visto que os guias só acionam o resgate após o prazo que ela pactuou na entrada de permanência nas montanhas e vales escarpados, sujeitos a ataques de pumas, no caso dela de dez dias.
Então, marinheira de primeira viagem, ela comprou muito mais mantimentos do que necessitava, e a viagem que deveria ser prazerosa, tornou-se um martírio, pelo peso extra da tralha.
Ela contou que tinha vontade de comer logo tudo aquilo, pela dificuldade de carregar, mas que estava ainda insegura. Ao retornar, sobrara pelo menos uns três quilos de comida. E, caminhar 40 km com três quilos a mais, viram três toneladas.
No ano passado ela retornou, e só levou o necessário para fazer uma caminhada feliz. E sobrou muita pouca coisa, mas em nenhum momento ela teve falta de nada, ou privação. Ela aprendeu a fazer a jornada com menos peso, para encontrar o prazer no caminho, e não no descanso arfando, embaixo de raras sombras de árvore.
Por isso é importante o tempo de resetar. Do mesmo jeito de um computador, nosso sistema interior fica rodando mais devagar, fica pesado, não carrega direito as aplicações, não nos obedece no tempo e situação em que mais precisamos, ele trava a todo instante. E não é vírus. É um monte de coisas que está rodando em paralelo, ou sendo carregado na inicialização do sistema, que diminuir a capacidade de processamento, consomem memória.
Na nossa vida é justamente assim. Temos que levar menos bagagem na jornada, temos que decidir o que de fato vale a pena ficar pensando naquilo, ficar rodando aquele arquivo em paralelo, aquele mesmo que rouba energia emocional e cognitiva para outras áreas de nossa vida, que precisam de atenção.
São mágoas que vão ficando pregadas em nosso ser; são perdas que tivemos e que nos fazem olhar muitas vezes para trás; são expectativas superdimensionadas dos outros com os quais nos relacionamos; são traumas e sofrimentos a que fomos submetidos e que nos marcaram. São coisas que grudam em nosso aparelho cognitivo-emocional e tiram dele a capacidade e a coragem de avançar, vida a dentro, assumindo novos riscos, permitindo-se novas aventuras, deslumbrando-se com novos aprendizados e assombrando-se com a beleza de simplesmente viver.
Mas, não basta apertar o reset. Embora seja o botão mais difícil de apertar, após um certo tempo de “apagamento”, importante para se conhecer, avaliar melhor a situação, e se permitir beijar a lona, é necessário do reset sair. Chamo esse tempo de deserto cognitivo-emocional. Um tempo de pouco florescimento interior, mas de muitas descobertas do tipo de solo e sementes de que de fato queremos cultivar em nosso jardim interior. Eu ando no meu tempo de resetar, e aproveito o deserto para selecionar novas sementes, limpar o solo e arejá-lo para que seja como uma macia cama, para as sementes que lançarei, na nova fase que virá, a do Reinicializar.

Aquela que quando chegar, num belo dia, ao nos olharmos no espelho e gostamos do que vemos. Ainda um esboço, somos sempre nosso melhor esboço possível. Aí pela primeira vez, na fase de resetado, aquelas lembranças não tiram mais nossas lágrimas, aquela pessoa, passou, finalmente. Aquela cena, parece tão distante. E aquele luto, vira uma doce memória, ou apenas uma tíbia assombração, sem força para nos paralisar de medo. Aí, vamos chegando perto da tecla power, um tanto sem jeitos, um tanto desconfiados, sem acreditar que estamos prontos, embora inacabados, para nos reinicializar.
Apertamos o power, e decidimos o que deverá carregar em nosso sistema cognitivo-emocional, e o que deverá ser deixado de lado, já não nos pertencem mais, já deram, páginas viradas.
E passamos a rodar melhor, mais livres, autônomos e seguros, de que os velhos condicionantes e circunstâncias ficaram para trás. Mudamos de fase. Agora renovados e restaurados em nossos propósitos de vida.
E a esperança, mãe de todo reinício vem nos saudar com um beijo na testa, daqueles que nos dizem, eu confio em ti!

Então chegarão tempos de resetar, tempos de reinicializar o sistema da vida, sem mais carregar tantas tranqueiras, diferente, mais leve e feliz.

Resetar-se de um estilo de vida excessivamente ambicioso e alto custo para manter as aparências.
Resetar-se de uma sede inesgotável pelo consumo e pelo ter.
Resetar-se de pessoas que oprimem e te jogam para baixo, destacado em ti apenas o teu pior.
Resetar-se da fome de poder, das vaidades e da arrogância de todo tipo de orgulho e saber.
Resetar-se de toda ansiedade e correria, até daquelas piores, as que fazemos como quem a mendigar aceitação e valorização dos outros.
Resetar-se das culpas dos sonhos não realizados, projetos inacabados e objetivos não alcançados.
Resetar-se das expectativas dos outros sobre si mesmo, e da suas sobre eles.
Resetar-se das emoções negativas e de toda carga de sofrimento delas derivadas.
Resetar-se das lentes pelas quais vê a vida, que foram ficando embaçadas pela indiferença, ou pensamentos negativos sobre si mesmo, o outro e a realidade.
Resetar-se de tudo que abala a autoestima tais como espelhos cruéis, balanças sádicas e de oráculos tiranos, com suas profecias negativas sobre você.
E, ao permitir-se o reinicializar, que seja mais leve, com menos tralhas emocionais desnecessárias para ser mais feliz, sem mais as coisas resetadas acima. E, agora na vida novamente, podemos não saber direito ainda o que queremos, para onde iremos, o que nos tornaremos, mas sabemos muito o que não mais queremos, para aonde não mais iremos e o que não queremos mais ser.

Garanto-lhes, isto na beleza de existir é um tremendo avanço!
É um acontecimento digno de um brinde ao vir-a-ser, como todo bom power consigo carrega!
Se é!

Salvem as Bromélias Humanas (Autor Ricardo de Faria Barros)

Sábado, ao esperar lavarem o carro, percorri as lojas de plantas da vizinhança e me embeveci numa delas, na qual havia muitas bromélias expostas, cada uma mais linda do que a outra.
Tenho uma relação antiga com bromélias e se eu pudesse colocar em mim os valores das plantas, eu escolheria os das bromélias, mesmo correndo o risco de magoar meus preciosos Jequitibás, Cagaitas, Paineiras, Umbuzeiros, Algarobas e Ipês, minhas outras paixões!
Esse relacionamento têm uns 30 anos. Ou seja, já fez o tempo de uma geração, então é amor.  Lembro que todo sábado papai me pegava em casa para irmos juntos na sua pequena propriedade rural, nas imediações de Campina Grande-PB, chamada de Samambaia.  Passamos agradáveis dias, naquele recanto de esperança. 
O original nome do sítio, dado pelos ancestrais dos Barros, tinha como motivo a forte presença de Samambaias na propriedade, que afloravam das locas de pedras. Eita lugar para ter pedras. 
Sim amigos e amigas, havia muitas rochas no sítio Samambaia, naqueles seus 12 hectares,  pouco mais de 5 alqueires. E, algumas delas eram como se Deus pai tivesse pavimentado o solo em grandes áreas de pedra plana, quase no nível do solo, chamadas de lajedos. Tinha os lajedos planos e tinha também os que formavam pequenas montanhas de pedras,  com seus abismos íngremes, ou ainda cavernas e grandes buracos nas rochas que acumulavam as águas das chuvas, virando cisternas naturais. 
O maior lajedo, de uns 300 metros quadrados, era monumental. O ingresso dele era por sobre uma pedra plana, uma laje natural no nível da terra. Depois ele ia mergulhando no solo, formando um abismo sensacional e perigoso, que pelo lado oposto conseguíamos acessá-lo por baixo e mergulhar nas águas que nele ajuntavam. Mas, sem papai ver. Pois ali juntava-se raras águas para beber, e não podia-se tomar banho. Papai dizia que o buraco do centro do lajedo se caísse uma pessoa dentro dali não sairia, pois era cheio de água e profundo, e os paredões de difícil. De tanto procurar lajedos, para fotografá-los no sítio, eu dei de cara com as bromélias. Elas amam juntamento de pedras. 
E, vez por outra, eu era brindado com um pendão colorido que dela saia, como uma espécie de exótica flor. 
Ficava um tempão olhando para aquilo e tentando entender como ela sobreviva ali, naqueles costões e ajuntamentos de pedras, e bem afastadas de qualquer fonte de água, inclusive do poço que num dos lajedos se formavam. Nele, quem reinava eram as samambaias, que gostam de muita umidade, daquelas que sobrem pelas paredes rochosas.

Perto de um bromélia há vida. Aliás, as bromélias são plantas colonizadoras de ambientes. Após sua chegada, em qualquer tipo de solo, a vida acontece.

Suas raízes mergulham em fendas e dessa fixação formam como uma malha que vai retendo a poeira que circula no ar, nelas caindo, formando uma espécie de solo por cima delas. 

Então, elas criam solos para outras plantinhas que dele vão precisar. Nas suas folhagens, acumulam-se as águas das chuvas, em espirais internas que sua formatação produz. Essa água vai sendo liberada as poucos, irrigando toda uma vizinhança. Como uma esponja. E elas evitam que as águas sumam, ladeira abaixo. Então, esses "poços" permitem que pequenos animais matem sua sede, ou que no seu interior habitem rãs, lagartos, grilos, e insetos dos mais variados tipos, que são o início da cadeia alimentar de regiões tão inóspitas, possibilitando que outros animais deles sobrevivam. Suas folhas formam um a espécie de "tanque"com água que fecundam as sementes que nelas caem, possibilitando que uma vegetação desenvolva-se nas suas imediações. As bromélias resistem às situações mais adversas possíveis, principalmente as de solo rochoso e as de árvores. 

Viram o porquê deu gostar delas? Deixa eu dizer o que aprendi com elas, e para a vida.  

a. Podemos ser alimento para pessoas famintas. Não podemos fixar raízes na vida de uma forma egoísta e de personalidade acumuladora. Daquelas raízes que só se importam com elas mesmas. Podemos garantir nossa existência, com nossas raízes, mas podemos com elas abençoar muita gente. Ajudar, cooperar, fazer pagamentos justos de quem nos presta serviço, podemos adotar causas, pessoas, situações difíceis a que somos confrontados e que pedem a segurança de nossas raízes. Nossas raízes podem juntar coisas boas, como a poeira circulante que nas bromélias vira solo fértil. Solo fecundo e seguro que poderá ajudar emocionalmente muita gente. Ou seja, nossas raízes podem gerar condições de vida ao nosso redor, e não de morte, podem ensinar a cuidar um do outro. Fazendo isso, tu estás sendo as raízes das bromélias. 

b. Podemos ser água para pessoas sedentas. Liberar fonte de vida, nossa água, para pessoas e almas sedentas. Como as folhas das bromélias fazem para todo tipo de animal e sementes que dela precisam de um refrigério. Liberar perdão, liberar amor, liberar gentileza, liberar estímulos, reconhecimento, cuidado, admiração, liberar mansidão e generosidade.  Podemos tornar o ambiente mais fecundo para o nascer das sementes dos outros, ou para quem em nós procure matar sua sede emocional  Quando você anima uma pessoa, que está se sentindo frágil, desprotegido, inseguro quanto ao futuro, e tu o estimula a lançar sementes, perto de tuas folhas, tu está dizendo a essa pessoa que não vai deixar a esperança dele morrer, e que de ti sairão gotas de água que irrigarão as sementes; aquelas mesmas que ela achava que não mas iria lançar, por falta da água da esperança em dias melhores. Ou seja, as águas que se juntam nas folhas das bromélias ensinar a cuidar um do outro. Fazendo isso, tu estás sendo as folhas das bromélias. 

c. Podemos ser renovação, para pessoas estagnadas nelas mesmas. Criar ecossistemas; essa é a última característica das bromélias que acredito nos ensina muito. Elas deixam um legado melhor do terreno que acharam quando ali chegaram. Quantas famílias destruídas pelas mágoas? Quantos pais apreensivos pelo rumo que tomou algum dos filhos? Quantas pessoas destruídas emocionalmente, por não se recuperarem dos tombos que levaram? Quantas pessoas, perto delas, parece que a vida se foi. E aí, tu ou eu, bromélias que podemos ser,  e termos aprendido a não terceirizar nossa missão nesse mundo, chegamos perto delas e podemos fazer a diferença em suas vidas. Alterar esse ambiente de insalubridade emocional, só com nossa paz e tenacidade emocional. Uma única pessoa pode alterar um ecossistema emocional com sua presença ativa, diminuindo a incidência da chuva ácida emocional, dos dejetos afetivos, dos lixões fétidos comportamentais e de toda a toxidade de mágoas - daquelas colecionadas e criadas como animais de estimação.  Podemos restaurar ambientes, renovar esperanças e alimentar estimas nas pessoas.  Mesmo que seja difícil que não vejamos a mudança acontecendo, digo-lhe, continue! Não se altera um ecossistema emocional, não se "recoloniza um ambiente humano", daqueles bem degradados, de um dia para a noite. Mas, nossa presença pode ser como uma enzima, pode catalisar reações comportamentais e emocionais mais positivas nos lugares em que convivemos.  Perto de uma bromélia há vida. Perto de nós há vida? A vida consegue acontecer nos locais onde nossa presença habita o mundo?  

Salvem as Bromélias Humanas!

Um Portal do Bem-Estar Chamado Paul. (Ricardo de Faria Barros)


Adalfran tem um cavalo que se chama Paul.  Paul mora de aluguel, num rancho na área rural de
Sobradinho-DF, a 8 km de onde Fran trabalha e mora.
O pangaré custa por mês 1/4 do salário de Adalfran, recebido como zelador do prédio.
Todos os domingos ele visita Paul e ambos passeiam pelos prados, montanhas e até pelas áreas urbanas de Sobradinho-DF.
Quando Adalfran monta no seu Paul, ele deixa de ser um zelador-histórico, daqueles que viram patrimônio imaterial dos prédios em que trabalham, no caso dele, desde 1999. Ele vira um garboso cavaleiro, e segue valente desafiando o carrossel do destino de seu viver.
Quando ele fala do Paul seus olhos faíscam de felicidade, e sua expressão é de ternura.
Um dia vou dar uma volta no Paul, ele já me chamou, e não vou perder essa chance. Embora não saiba cavalgar.

Adalfran não tem vida mole. Ele é o único zelador de um prédio com 4 torres, de três andares, e 48 apartamentos. Ele trabalha muito, e está sempre de bom humor, uma de suas marcas Ele sempre tem uns segundos de atenção para cumprimentar quem por ele passa.
Seja com um bom dia caloroso, ou com alguma pergunta sobre algo da vida dos "seus" moradores.
Logo depois ele volta à vassoura, ao rodo, mangueira e tudo mais que usa no seu trabalho de varrer, limpar, recolher lixo indevidamente colocado e molhar as plantas.
Conheço ele desde dezembro de 1999, quando comprei o meu apartamento no Ed. Vitória, o 312, e ele sempre foi assim. Atencioso, cortês e uma profissional que exerce na prática a liderança servidora.

E ainda ajuda os moradores com dificuldade de locomoção a subirem com suas compras, ou harmoniza brigas dos mais intolerantes uns com os outros, por erros de estacionamento.
Sem falar que é uma mão na roda para guiar os visitantes perdidos, sem saberem qual a torre correta de seus amigos.

É meus amigos!, Adalfran é um daqueles profissionais que faz de seu trabalho serviço e que desaprendeu a resmungar e a passar o dia inteiro procurando razões para ser infeliz nele.
E isso torna-se perceptível na forma pela qual nos trata e na qualidade do trabalho que produz.
Adalfran é uma daquelas pessoas que ocupam o espaço com sua presença, e tornam melhor a vida de quem por elas passam.

Uma marca de sua presença é o assobio. Eu sei que ele está por perto pelo seu assobio. O assobio do Fran é uma de minhas companhias prediletas, quando tenho contrações literárias, ao parir meus textos, produzidos nos silêncios das manhãs como este que escrevo.

Ontem, quando fui deixar o lixo lá fora, deparei-me com ele limpando a sela de Paul. Uma sela toda estilosa que trouxera da Paraíba. Ele a limpava com tanto esmero, quase em estado de Flow(*), que nem me viu chegando perto.
E eu pude contemplar a cena de longe, degustando-a em sua completude e boniteza. Depois, dirigi-me à ele devagarinho, curtindo mais um pouco aquele momento de profunda entrega.
Ele alisava os pelos da sela, e com olhos de lince procurava sujeiras entranhadas na parte debaixo da sela, aquela que faz contato com o Paul. Como que não querendo que nada o machucasse, além do fato de morar num estábulo. Disso ele entende, de estar  como que preso num estábulo na vida, sem maiores oportunidades para a ascensão social.  Mas, nunca o vi reclamar de sua saga. Fran não é de reclamar das ondas da vida, ele aprendeu a surfá-las, com o melhor que tem e como pode.

Sempre que quero me sentir melhor pergunto ao Adalfran sobre o Paul. Aí, quando ele começa a falar de seu cavalo eu, por osmose, recebo uma lufada de emoções positivas. E, quando saio de sua presença, sinto-me de mente arejada novamente.
Paul é terapêutico. rsrs
Paul significa para Adalfran um portal por onde ele acessa o desejo.  Por ali, ele atravessa a si mesmo e transforma-se em nova criatura, agora não mais refém do personagem que vive, a maior parte do tempo, em sua sina tão pobre e dura.

Precisamos de nossos Pauls. Precisamos de portais de esperança. Precisamos ter um cantinho de visitar nossos desejos, para que periodicamente renovemos e restauremos a coragem, ou ousadia, de existir.  
Imagino a felicidade dele quando vai se aproximando a hora de encerrar o expediente no sábado e poderá ir ver o Paul.
Imagino as vezes em que ele teve que renunciar a outros gastos, para não faltar o pagamento das despesas do Paul.
Imagino eles conversando sobre a vida e o viver, quando ambos tomam o vento da liberdade nas suas faces de apenados do destino.
Imagino a expressão deles, a troca de carinho, de afetos mil, ao terem que se despedir, no final de um domingo de muita amorosidade.

Quem já se despediu de quem gosta, ou tem saudade de amor distante, sabe do que falo.

Paul é um Portal de Vida para Adalfran.  E na vida, precisamos de portais do tipo Paul.
Precisamos de portais que nos remetam a algo para desejar, algo para amar, algo para esperar, algo para cuidar e algo para admirar.  Aqueles que nos projetam para além de nossas vidas severinas.
Daqueles, que ao nele ingressarmos, ficamos reluzentes, transformados e novas criaturas somos.
Escuto o Adalfran assobiando novamente. O assobio dele é um de meus portais.
Acho que ele solfeja o tema de Cinema Paradiso, ou será que agora sou eu quem entra em Flow ao evocar a amorosidade que essa canção me remete?
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(*) FLOW - O psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi, em seu livro sobre o Flow, o define como:  “um estado mental onde o corpo e a mente fluem em perfeita harmonia, é um estado de excelência caracterizado por alta motivação, alta concentração, alta energia e alto desempenho, por isso também chamado de experiência máxima ou experiência ótima. As experiências de FLOW muitas vezes são lembradas como os momentos mais felizes da vida da pessoa, os momentos onde ela se sentiu no seu melhor. Geralmente a pessoa entra no Estado de Fluxo (Flow) quando ela está fazendo aquilo que ela mais gosta de fazer. Pessoas entram em fluxo dançando, cantando, correndo, praticando esportes, desenhando, pintando, escrevendo, meditando e até trabalhando. Naquele momento, você não pensa em mais nada, não pensa nos problemas que ocorreram antes, nem no que terá de fazer depois, fica inteiramente focado no presente – no aqui e no agora.

Cartas ao JG - O Presente do Naruto (Por Ricardo de Faria Barros, pai do João Gabriel, 8 anos)

Aguardava tua saída do colégio, ruminando pequenos aborrecimentos. Acabara de ter uma discussão feia com o porteiro do teu colégio. Não gosto de sentir que perdi o controle emocional. Te esperando, ainda com raiva de minha atitude e da dele, fui espiar teu sanduíche que compro nos dias que tem o Kumon, após as aulas. E ele veio errado. Mais ruminação negativa. No mundo digital, eu ainda processava algumas chateações acontecidas pela manhã, coisas da vida virtual. Então, era uma espera num clima de baixa umidade emocional. Quase sufocante. E, vez por outra, meu homem ruim me dizia para eu ir lá fora, dar uns murros no porteiro, e depois corresse. rsrs.

Até que você apareceu segurando o boneco Naruto que recentemente te dei de presente. Estava todo feliz, até perceber que perdeu a cabeça do Naruto.  Logo saímos à caça da cabeça e achamos a mesma largada no chão. Você ficou tão feliz, como se o Naruto voltasse á vida.

O teu melhor amigo e o pai dele, o Pedro, passaram por nós quando nos dirigíamos ao estacionamento.

Aí, tu me contou que hoje era aniversário dele. E com olhinhos tão doces me perguntou se poderia dar o Naruto de presente ao Pedro.

Eu disse que sim.

Você correu e o presenteou.  Pedro ficou sem palavas, acho que ele desejava muto aquele boneco, e te abraçou.  Eu e o pai dele, nos cumprimentamos efusivamente, celebrando a grandeza de teu gesto.

Aí entramos em nosso carro e nos dirigimos para o Kumon.  No caminho, disse-lhe que teu gesto foi muito bonito, mas que não pode dar todos os presentes que recebe, pois eles carregam uma carga afetiva, e aquele tinha sido eu quem te deu.

Vocês escutou com atenção e perguntou o que é a "quequeca" que o Pedro tem na cabeça.

Eu não entendi a pergunta e pedi que explicasse como eram os sintomas. Aí você me contou que ele sente um pino entrando na cabeça, tem dor e que na hora que cantaram parabéns para ele ele chorou, pois estava doendo muito.   Ahh, enxaqueca. O Pedro tem enxaqueca, disse-lhe. E você perguntou-me se passa, se cura, disse-lhe que sim. Aí fez cara de aliviado.

Falei que o Naruto ia ajudar o Pedro a desviar o foco da dor de cabeça, ao abraçar o amor que nele estava contido, pelo altruísmo do gesto. Expliquei com outas palavras o termo altruísmo, de dificil compreensao.

"JG, altruísmo é quando você doa seu lanche, ao saber que um amiguinho está sem tomar café da manhã, pois a mãe dele foi hospitalizada pela madrugada e o pai esqueceu de colocar a lancheira na mochila, pelo nervoso da situação."

"JG, altruísmo é doar o Naruto querido, presenteado pelo pai, a um amiguinho dele desejante, que sofre com uma dor de cabeça inclemente."

 Sabe filho, esse teu gesto deverá continuar presente em teu viver.  Não esqueça de doar teus Narutos a quem deles mais precisar.  São apenas coisas materiais, mas o amor que irá neles, pode transformar vidas, de quem os receberá, de quem os doará.

Outro dia fui palestrar num evento de reflexão para a aposentadoria.  Vi uns livros num pacote, e associei que seriam usados na próxima palestra, que era a de um amigo meu, o Gustavo Boog.

Olhei a capa do livro e o tema era: É urgente ser feliz. Lembrei-me que na minha palestra tem um slide que divulgo boas obras para a fase da vida da pós-carreira. Então, peguei o celular, fiz uma foto do livro, enviei para meu gmail, baixei no computador, e a inseri na minha apresentação. Tudo aos 30min do meu início, coisa que não se deve fazer, até para não se perder a cocnentração. Mandei os riscos às favas. Comecei a palestra e vi que o Boog chegara, e sentara nos fundos da sala. Veio prestigiar-me, e fiquei feliz.

No meio da palestra, mostrei o slide com os livros que sugeria, inclusive o dele. E fiz o reconhecimento ao seu trabalho a terceira idade e sobre a envelhescência.

Voltando para Brasília, vi que o livro que fotografei não era do Boog, era do Beto, o palestrante do outro dia, a foto dele era muito parecida no livro.

Altruísmo foi o Boog perceber meu erro e não intervir.  Altruísmo foi a intenção de divulgar a obra de um amigo, num mercado editorial tão carente de público consumidor.

Então, amado filho, continue assim. Hoje você emocionou-me profundamente. Até em não responder ao meu discreto puxão de orelha, de doar tudo que tem de valioso, ao colocar o contexto da doação, o Pedro estava com "quequeca".

Nessa sociedade, dita pós-moderna, cultivar espaços de doação generosa de si mesmo ao outro, a uma causa ou à própria transformação interior, em busca de uma maior iluminação, é vital para a sobrevivência da coletividade.

Precisamos aprender a doar nossos melhores e mais raros Narutos.  Doar tempo, doar afeto, doar encotnros, doar perdão, doar abraços, doar recomeços.

Por falar em recomeço, quarta vou pedir desculpas ao porteiro. Estávamos, os dois, de cabeça quente. E não é fácil a lida dele, naquela área de alta segurança. Um pedido de perdão, de forma sincera, pode ser também um gesto altruísta.

Sei que muitos te dirão para deixar de ser besta, bonzinho, afetuoso e solidário. Digo-lhe, não os escute.

Siga pelo bom caminho, mesmo se todos ao teu lado embrutecerem o coração, continue manso e atencioso para com a vida. Não se perca de seus melhores valores.

Ao conservá-los, pelos menos eles não terão conseguido te mudar.

Ser + gente na vida não é uma questão de só dar o que se recebe.  É uma escolha incondicional.

Sem colocá-la como barganha, como comércio, por mais justo que pareça ser.

Na tua juventude e vida adulta, e até velhice, guarde esse menino que doou o seu melhor boneco, aquele da hora, para um amigo que sofria de dor de cabeça no dia do aniversario dele.

Não mate essa criança em você. Será ela que em ti fará rebrotar a vida, após aperreios pelos quais passará.

Pois, quando nos doamos ao outro, nossa vida não tem como permanecer igual ao que era antes do gesto, ela torna-se melhor e mais feliz!

E quem presencia estes gestos também fica feliz, por osmose, e acaba se vai nele toda a baixa umidade emocional, como se o amor do gesto que ele testemunhou, o preenchesse por osmose e inteiro, eliminando dele toda raiz de amargura e secura de seu coração,  dando-lhe paz e renovada esperança de ser.

Ps. São 18h06min de 18/09/2017, o porteiro Adalfran toca a campainha e condia-me para descer, até o térreo no apartamento dele, para tomar chá, de capim santo e cidreira, e ainda convida-me para de lá ir caminhar com ele.  "Pois somos sobreviventes e temos que nos cuidar". Diz, referindo-se às complicações cardíacas pelas quais passamos. São ou não são gestos altruístas?  Disse-lhe que amanhã caminho, pois hoje escrevo para ti.

Não se preocupe, Tiago teu irmão já comprou o outro boneco no Naruto, ele me disse ontem. É aquele de nome esquisito que tu nos pediu no último sábado. E, caso cena semelhante aconteça, pode doá-lo também, caso teu coração fale mais alto.

Ps. 2. Como demorei a descer, ainda parindo esse texto, ele subiu e trouxe uma garrafinha de chá, a foto documenta esse instante. Percebe filho meu? A força de um coração que se doa?  Ele sobe escadas, se preciso for, só para ver o bem estar de quem receberá dele, mais do que um chá, ou um Naruto, o gesto de amor.   Sim, o chá estava ótimo.

Sobre um cinto, um joinha e um calção de banho.

Era uma quarta atípica, bem diferente de tudo que vivera como palestrante, até então. Pela manhã, conduziria palestra no II Fórum Trilhas de Aprendizagem, à tarde Oficina, no mesmo Fórum. E, na boca da noite, embarcaria para Foz do Iguaçu para no outro dia às 10hrs ministrar palestra no evento da Itaipu, de reflexão para aposentadoria.

Ou seja, em menos de 24hrs viveria a experiência de atuar em três eventos pedagógicos, o que até então foi a primeira vez em em minha carreira.

Terminando o segundo deles, a Oficina, a ansiedade já estava a mil.  Despedi-me apressadamente de todos, e saí as 17hrs em direção ao aeroporto. Já de saída, erro o cainho e pego o pior acesso, que já tinha um trânsito pesado. Aqui em Brasília-DF não está fácil pra ninguém, e nem para ir a nenhum lugar.  Quando a fila travou de vez, na altura das imediações do Zoológico, aproveitei para checar o papel do check-in. Eu sou dos que imprimo meu check-in, faz parte de minhas esquisitices, temo algo ocorrer com o celular, e o pessoal não me deixar entrar no vôo.

Aí, vi que o meu embarque começaria, de fato, às 18h10. Eu tinha lido errado o papel. E já era 17h30.
Suei um balde de água, desejando que o carro tivesse hélices. Mas, logo a fila andou e consegui estacionar a tempo, uns 15 minutos antes. O que para meus padrões é um tremendo atraso.
E corri. Aí percebi que a calça estava folgada para correr. Numa mão, segurava o porta-terno e terno.
Na outra, segurava a calça. À tiracolo direito a pasta executiva, no esquerdo a câmera que balançava muito. A cena era dantesca de feia.  Ao passar no raio-x a moça cismou que eu estava apitando.

Pensei comigo, se for o cinto estou ferrado, agora é que a calça cai mesmo.

Mas, eram as fivelas do sapato. Entrei no Aeroporto de Brasília e fui brindado com o embarque no último portão do lado direito, uma légua de distancia. E tome correria, agora a calça caindo mais ainda, pois perdi peso do estacionamento até ali. rsrs

Na tela, vôo confirmado. Mas, o tempo vai passando e nada de nos chamarem. Foi bom para eu descansar, contudo confesso-lhes que já estava cansando novamente, agora de nervoso. De repente, o serviço de som chama os passageiros de meu vôo que fariam conexão em SP para Montevidéu. E, umas 12 pessoas se apresentaram, e dali saíram arrasadas. Perderam a conexão, não daria mais tempo. Agora no outro dia. Ao meu lado, uma gringa perguntou-me, num português precário, se o de Frankfurt estava ok.

Fui ajudá-la, lá no balcão, e disseram-me que até o momento sim. Mas, que dependeria do nosso vôo chegar no DF. Aproveitei e perguntei de minha conexão para Foz, às 22h45min em SP. A mocinha disse, "essa está tranquila".

Voltei para meu local, e nem tinha terminado de tranquilizar a gringa, com um gesto de joinha, quando chamaram ao balcão os passageiros para Frankfurt, o embarque deles ficaria para o dia seguinte. A gringa olhou pra mim sem entender nada, como é que "joinha" significa aquilo no Brasil? Ela deve ter pensado, ao me fustigar com o olhar. Eu tentei dizer que entre o meu acesso ao balcão, e o retorno com a boa notícia, as coisas mudaram. Mas, não consegui. Ela vai levar uma impressão que o "joinha" em Brasília é igual a "se ferrou"!

Uma hora e dez de atraso do embarque começaram a nos chamar. Eu vibrei, não perderia a palestra.
Esperamos uns 10min, no acesso remoto, o ônibus chegar. Quando chegou, todos ficaram aliviados. Mas, num era hora de aliviar-se. Acreditam que ficamos dentro do ônibus, no meio da pista, ao lado de uns aviões, por uns outros 20 minutos? O que estava acontecendo. A essa altura, eu que estava me segurando naquelas barras e em pé, não sabia se deixava a calça cair, se segurava a barra ou  se chorava.

Quando finalmente o ônibus andou, e ao adentrar no avião, o chefe da equipe de comissários pediu desculpas e falou que o vôo foi liberado por engano, pois que a tripulação que chegou com ele, vindo de outro estado, não tinha mais horas de voos permitidas, e tiveram que abandonar a aeronave.
Ou seja, no meio do caminho cancelaram o vôo. Mas, o desgaste seria tão grande que conseguiram acionar a única equipe de tripulação reserva disponível, por isso o ônibus ficou parado. Não havia tripulação dentro do avião para nos receber.

Sentado, finalmente e sem precisar mais segurar as calças, o serviço de auto-falante do avião vai chamando, pausadamente, e por onde alfabética, umas 6 pessoas.  Chegando perto da letra R, eu estava com muito medo, achando que agora seria minha vez de me retirarem do vôo, por não conseguir tempo hábil para conexão em SP. Mas, não  foi. Ufa. Eu ainda estava no jogo.

Pelas minhas contas eu tinha 15 minutos de atraso. Daria tempo.

Mas, nunca pensei que o Aeroporto de Guarulhos ficasse tão grande, após a reforma.  Desembarquei no Terminal 2,  e corri feito uma barata tonta para o Terminal 3. Umas duas léguas de distância e fazendo sucesso com as calças. Chegando nele, olhei pela TV e vi que o meu vôo ficava num outro portão, no Terminal 1. Agora seriam 4 léguas, e corri, corri!!!!
Cheguei com os bofes de fora, e eu era um dos últimos a embarcar. Sentei no avião e quando ele decolou, em direção a Foz, eu percebi que havia mais um buraco disponível no cinto. Um que eu fiz com uma faca, noutra ocasião. E que eu não aproveitei aquele buraco, para arrochar as calças, pelo excesso de ansiedade e correria.
Eu não parei para avaliar melhor a situação. Assumi que as calças caiam, e pronto. Não me permiti questionar a mim mesmo, se era por ter perdido peso, ou se era por não ter usado o buraco correto para afivelar o cinto. Posso até ter perdido peso, mas enquanto tiver um buraco no cinto, ainda dá para ajustar as calças.

Cheguei pelas 1h30 da madrugada e acordei cedinho, 6h30 e fui explorar o local. Aí vi uma cena linda. O sol nascendo por cima de uma palmeiras que emolduram um estonteante complexo de piscinas, conectadas entre si. Um local de se ficar meses, pensei. Perguntei a um hóspede que nela estava se a água era quentinha. Ele disse: "deliciosa".

Aí pensei comigo, é tudo que preciso, depois dessa intoxicação de cortisol e adrenalina que o estresse me causou.

Apressei o passo para o quarto, e lembrei-me que não tinha levado calção de banho. E perdi a oportunidade, dado que após a palestra voltaria imediatamente para o DF, no vôo das 14hrs.

Comentando com palestrante amigo, que já estava no local para sua palestra da tarde, ele me disse.
" É Ricardo, comigo ontem aconteceu a mesma coisa. Mas, como cheguei mais cedo, eu fui comprar um calção e passei a noite tomando banho nas piscinas e relaxando."

Essa crônica carrega três lições para a vida. A primeira é sobre nossas crenças limitantes e o seu poder sobre nosso comportamento.

A primeira delas é que um polegar para cima, "um joinha", pode ser fruto de uma avaliação de momento, que em minutos poderá alterar.  Então, não ache que o "joinha" que a vida está dando para você e para os que ama será eterno. Em algum lugar uma conexão para um vôo pode ser cancelada, e sua vida entrar numa roda viva. Então, na dúvida de quando o sinal de joinha mudará de posição, ame aos borbotões. Perdoe em igual intensidade. Nunca deixe a presença de alguém que ama sem um "eu te amo".  Se dedique aos seus, enquanto estão por aqui, e entre você e eles há uma conexão possível, no mundo dos que têm carne, além de alma. Quantas coisas não aproveitamo e não damos o devido valor, por acreditarmos que elas estão sempre ali, favoráveis, e nunca mudarão. E vamos olhando a vida com olhos de indiferença, sem mais nos jogar nela. Sem mais ousar mover o tempo da conexão ao nosso favor, alterando as rodas do destino, que só quem ama sabe como fazer.

A segunda delas, não menos perigosa, é se acomodar com o que nos limita, nos oprime, nos faz infelizes, sem olhar para aquilo de outras prumadas e perspectivas, sem colocar aquilo em referência. Eu acreditava que o problema da calça folgada era sem solução. E, a realidade assim se fez para mim. Em nenhum momento eu me permiti à possibilidade de avaliar o cinto, procurando ver se o problema não seria nele. E agi feito um maluco beleza, correndo com cuecas à mostra em movimentados aeroportos do Brasil.  A minha crença era limitante. Era uma crença de que se a calça está caindo, se o cinto está nela, é porque estou mais magro, ou a calça ficou frouxa. Adoramos fazer isso com os outros também. Colocamos eles dentro de nosso esquema mental. Sem perguntar a eles o que eles acham, o que fariam. Achamos que não precisa, pois nossa verdade é sagrada, e sabemos "como ele é".  Quantas pseudo-verdades vamos tecendo na colcha de nosso viver que mais parecem cordas, a nos sufocar, nos amarrar e prender a elas. Coisas que vamos dizendo de nos mesmos. "Ah, nunca mais vou amar ninguém.". Ah, não sei falar em público".  "Ah, se eu passar uns meses longe de meu namorado, ele arranjará outra e me esquecerá. A fila anda, eu até o entenderei".  "Ah, não dou certo em emprego algum...".  Essas crenças, e muitas desse estilo, são como a calça folgada. Elas inviabilizam outras alternativas de decisão, de pensamento, de comportamento e transformação. Elas tiram o foco de outras possibilidades, pois fazem de tudo para que a realidade diga-lhes que tem razão.  Será que nunca falará em público mesmo?  Será que não dá certo em emprego algum?  São pensamentos fechados em si mesmo. Para os quais não há movimento de superação. São quase que resignações emocionais, eivadas de conformismo.  

A terceira delas é que na bagagem da jornada de nossa vida precisamos levar calção de banho.
Pois, nunca saberemos quando após uma maratona estressante, teremos uma plácida e quentinha piscina nos chamando para seu interior. Calções de banho significam estarmos prontos para pegar as oportunidades quando elas atravessarem bem à nossa frente.  Para fazer com nosso  braço o destino, como fez o Gustavo Boog, ao ir compra seu calção. Reclamamos de sedentarismo, mas não caminhamos nada.   Reclamamos que o processo seletivo está exigindo muita coisa, mas não aproveitamos o tempo anterior a ele para nos capacitar, pegar experiência, e assumir atitudes como se no cargo já estivéssemos.Entendem? E ficamos reclamando que a vida não nos dá oportunidades, e coisa e tal. Sua mãe está doente, noutro estado, você tem tempo e  recursos para visitá-la, mas vai adiando, adiando, até um dia em que lhe faltar o calção de banho... Entendeu a metáfora? Na manhã que contemplei o amanhecer, e me vi sem roupa para piscina, abri a caixa de email e minha afilhada, a Catarina Catão, contou-me que fez um curso com a editora da revista Vida Simples, a Ana Holanda. Eu amo essa revista e tenho vários números delas. Me vejo em vários de seus textos. Catarina me incentivou a escrever para a editora, apresentando meu trabalho. Parem a leitura nessa parte. Até esse momento, eu não mexi um centímetro nas rodas do destino. Não comprei o calção de banho para aproveitar essa piscina. Mas, ao retornar pra Brasília, fiz um email para essa editora, apresentando meu trabalho. Pronto, agora eu tenho um calção de banho. Agora rodei as rodas do destino. Pode dar certo, não dar certo. Mas, dei prosseguimento à bênção. Lancei uma sementinha no infinito de meu viver. Veremos em que solo cairá. Quantas coisas conosco são assim. Perdemos a oportunidade de participar delas, por comodismo, omissão, indiferença, ou por achar que se repetirão. E a vida vai se empobrecendo, pois que em nosso jardim interior não há mais sementes, promessas de esperança, de um novo amanhecer em nossas vidas. Se eu não tivesse mandado o email, não teria lançado a semente, não teria comprado o calção de banho, entendem?  Têm milagres que pedem nossa ação concreta, para sermos co-autores da graça. Voltando ao exemplo da mãe doente. Se você planejar a ida e nada fazer. Não será semente. Mas, se adquirir as passagens, acaba de comprar um calção de banho, ou biquíni, habilitador dessa possibilidade. Acaba de rodar o carrossel do destino, entrando nele com coragem e determinação, deixando de ser expectador de seu viver. Ou de ficar apenas colecionando justificativas, para o não fazer. No lugar de oferecer respostas, para o que poderá a vir a ser.

Na vida, abra todos os seus sombreiros. (Por Ricardo de Faria Barros)


Cheguei para almoçar naquele estabelecimento num dia especialmente lindo no Distrito Federal, nesse período do ano, e já com 100 dias sem uma gota de chuva, o céu de Brasília fica de um azul de tirar o fôlego.
No estabelecimento tinha de tudo que gosto: buchada bobó de camarão, bacalhau e tilápia.
Sem pudor, juntei tudo num único prato e perguntei à moça se eu podia almoçar na área externa, para aproveitar o clima de domingo na praia.
Ela acenou positivamente com a cabeça.
O garçom logo me acorreu, abriu o sombreiro e pedi-lhe um chope, que estava delicioso.
A comida descia como luva, e eu dizia para mim mesmo, "um dia e descoberta desse restaurante muito bom."
Aí notei uma coisa, todos os sombreiros ficam fechados. O garçom só abre quando algum cliente opta pelo ar-livre, no lugar do claustrofóbico e incensado salão, com fumaça da churrasqueira.
Os carros que passam pela rua, por não verem os sombreiros abertos, até acham que o estabelecimento está fechado.
Pensei comigo, assim são com as oportunidades que aparecem na vida. Quantas delas pegaram nossos sombreiros fechados?
Por isso que na dúvida, recomendo, abra todos os seus sombreiros.
Pois eles atrairão coisas boas. As pessoas verão que há sombra em ti, e vão querer sentar próximo.
Nosso sombreiros são tudo aquilo que agrega valor pessoal ou profissional ao nosso ser.
São nossos talentos, dons, valores, e competências: atitudes, habilidades e conhecimentos.
Temos que deixá-los abertos para que possamos melhor aproveitar as oportunidades da vida.
Aquele estabelecimento está escondendo o seu melhor apelo, para um domingo de sol e quente, almoçar ao ar-livre, embaixo de um generoso sombreiro de praia.
Precisamos abrir nossos sombreiros para e aproveitar os ventos das mudanças.
Tem gente que não se dar valor. Não se conhece suficientemente bem para valorizar nela aquilo que a diferencia das multidões, ou seja, um aprazível sombreiro aberto.
Pessoas que na vida nunca foram muito elogiadas, reconhecidas e acabam por aprenderem também a não se darem o devido valor. E aí, fecham suas possibilidades de atrair coisas boas, pela visão pequena que passam a nutrir de si mesmas.
Outra, não se preparam para dar sombra. Estão sempre com os mecanismos de superação fechados em si mesmos. De tanto fechamento para si mesmo, em autodescobertas, para os outros, nos relacionamentos, e para com a realidade, na alienação, elas deixam de ser protagonistas de suas próprias histórias e vidas. Deixando-se largados e sem serventia, como uma sombreiro fechado, em dia de sol.
Descobrir os pontos fortes e cultivá-los mais ainda, descobrir as áreas de dificuldade e sobre elas operar, no sentido de superá-las, possibilita a abertura dos sombreiros existenciais, profissionais e até pessoais.
Nada mais triste do que um ser humano que não desenvolve seu potencial humano, e que nunca estará completamente desenvolvido.
Nada mais triste do que achar que já viveu e sabe tudo, que nada mais há para aventurar, descobrir e conhecer. Essas pessoas precisam retornar ao primeiro amor e ter a coragem de abrirem-se novamente às novas e maravilhosas experiências da vida e do viver.
Há muita gente precisando de nossa sombra. E, mesmo que ache que ela não é grande o suficiente, pergunte a quem volta da praia, para a calçada, e sem chinelos, se um pedaço minguado de sombra, em algum lugar daquelas areias tórridas não é um alívio?
Se e´!
Não deixe que fechem, ou você mesmo feche, seus sombreiros.
Nossos dons são para serem colocados em serviço, em doação, numa forma grata de retribuir.
E isso só fará nossa sombra aumentar, melhorando as nossas capacidades de aproveitar oportunidades futuras, já estando no presente capacitados para elas.
Pense nisso!

Balões e Palitos no Mundo do Trabalho e Vida Pessoal (Por Ricardo de Faria Barros)



O que será que acontece? Na foto, pessoas se movimentam em direção a balões avoantes, e com ameaçadores palitos de dentes e balões ao ar.

A principio você poderia achar que elas estão num jogo de caça ao balão, para furá-los.

Contido, convido-lhe a amplia a foto da moça que veste uma blusa verde.

Veja o ângulo que o palito toca no balão.

Ahh!  Alguma coisa diferente ali acontece, e não é quando "cruzo a Ypiranga com a Avenida São João,", como a  bela canção diz.

Algo de novo ocorre.

Ameaçadores palitos de dentes, com suas pontas afiadas, não estão sendo usados para destruir os balões, num jogo agressivo, uns com os outros.

Eles viraram "raquetes" de frescobol.

Na atividade que coordenei a tarefa era manter por dois minutos o maior número de balões do ar, sem poder tocá-los com qualquer parte do corpo, só podendo utilizar os pontiagudos palitos de dente.

E foi uma cena mágica o que ocorreu. As pessoas tinha o maior cuidado de encontrar o ângulo certo, do contato do palito com o balão, como a moça que veste verde na foto.

Se o ângulo fosse mais reto, a ponta do palito provocaria um dano no balão que lhe faria estourar.

O ângulo tinha que ser quase curvo, quase tangencial, para que de fato o palito servisse de raquete.

Uma coisa me chamou a atenção. Não era proibido quebrar as pontas dos palitos, reduzindo sua capacidade de furar, de agredir. E ninguém o fez.

Creio que essa dinâmica tem muito a nos ensinar tanto no mundo do trabalho, como na vida social.

Precisamos converter nossos ameaçadores palitos de dente em raquetes de frescobol, para fazer a vida fluir, para humanizar e amorizar os ambientes.

Investigue a fundo qualquer organização de trabalho, como se fosse um antropólogo laboral,  e verá o quanto de energia se perde com a disputa entre áreas, que não se veem ou se percebem como parceiras.

São setores que não passam a bola para o outro de forma redonda, e em muitas das vezes, utilizam-se de comportamentos e atitudes predatórios, nos quais todos perdem.

Os balões no mundo corporativo são os serviços e processos de trabalho entre as áreas.  Que precisam de empatia, diálogo, fluidez e sentido de urgência.

Contudo, nosso aprendizado desde a família, à escola e à sociedade vem sendo pautado noutra dimensão. Aquela que nos ensina que para vencer, um tem que perder. Que nos ensina a furar o balão do outro, no lugar de cooperarmos com o seu vôo.

"Como não é o nosso balão que está voando, para que mantê-lo no ar?"

Essa frase acima é muito comum no mundo do trabalho.  Existem duas maneiras de sabotar os balões que voam quando chegam perto de nosso raio de ação. A primeira delas é a indiferença. Não tocá-lo com nosso palito, para que continue voando. Simplesmente fingimos que não é conosco, que não é de nossa conta, e o balão cai.

A segunda, é afiar as presas, projetando-as sobre ele, perfurando-o, e tirando sua capacidade de voar.

Essa mesma analogia acontece nos relacionamentos interpessoais, em todos os espaços em que acontecem, até na vida a dois, amigos e família.

Quanta gente tem a maior tesão em furar o balão do outro, ou condená-lo ao pior tipo de ódio, a indiferença.  Não se alegra com quem se alegra, não ajuda quem precisa, não coopera para que a agressividade diminua, ou atua no sentido de cultivar uma maior humanização nos relacionamentos, com respeito e comunicação não-violenta entre eles. Ou seja, não baixa as armas na convivência com o outro, usando os palitos de dente para espetar e não como raquetes de frescobol, jogo comum nas praias cujo objetivo é arredondar a bola para o outro. .

Está sempre pronto a furá-lo. Por menor que seja o conflito, o estresse relacional, as armas se levantam e declaram a guerra.

Qual o custo da falta de simpatia, sinergia e sintonia entre áreas corporativas  e pessoas?

Essa experiência social, conduzida no âmbito de uma palestra num evento de desenvolvimento de lideranças, no Ministério do Meio Ambiente, pode ser uma metáfora da esperança de mudança.

Podemos reaprender a ser mais cooperativos, amistosos e generosos com o outro, em em nos relacionamentos entre setores - elos do mesmo ciclo produtivo.

Podemos converter nossos palitos pontiagudos em prosaicas raquetes de frescobol.  É só trabalhar o ângulo de aproximação entre pessoas que precisam se perceberem como iguais. Respeitando-se e buscando convergências, entre elas.

Nesse sentido, o autoconhecimento e o autodesenvolvimento são fundamentais, para a gênese de um novo paradigma relacional, não focado nas competições predatórias, restrições e limites da realidade; mas sim nas redes de colaborações virtuosas, nas possibilidades e alternativas de ação para transformação possível de uma determinada realidade.

No autoconhecimento,  proporcionado pela educação, atua-se na lança do palito. Tirando dela seu poder de morte, arredondando-a. Ou até, quebrando sua extremidade perigosa, e que não faz mais sentido. Como aquela agressividade de autodefesa apreendida, por exemplo.

No autodesenvolvimento, proporcionado pelas experiências de vida, atua-se na modelagem do ângulo relacional com o outro, ou os setores, ajustando-o com flexibilidade para mitigar os riscos de dano relacional.

Ansiosos e velozes palitos de dente, movimentando-se em direção aos belos e frágeis balões ao vento, nem sempre serão estruturalmente inimigos. Podem, desse encontro, produzirem algo impensado e novo, em parcerias inusitadas, quando um compreende o mundo do outro, ao manter o balão dele no ar, cumprindo a vocação a qual se destina ser.

Generosidade de Ser e de Servir (Por Ricardo de Faria Barros)

Pelas 15hr saí para visitar aquelas lojas de "Pra que isso?", eu estava atrás daquele treco que amola faca e de algo que servisse para guardar uns DVDs.
Chegando perto do local, escuto na esquina o som de música ao ar-livre.
Sou fascinado por música ao ar-livre, e de qualquer espécie. Alias, pelos artistas de rua eu nutro o maior apreço.
Dei meia volta, estacionei perto, esqueci completamente da agenda, e me posicionei próximo para me deliciar com aquele show. E o cara era dos bons, depois soube que ele é o cantor de um importante restaurante de Brasília, o Coco Bambu.
Ele cantava uma música do Nando Reis, sucesso do momento, chamada: Só Posso Dizer
"Cada um de nós tem o seu próprio jeito de ser
Mas tudo que foi feito
Só fizemos juntos
Porque você ouviu a minha, e eu, a sua voz
Tudo que dissemos sempre teve efeito mas sobra
Um ou outro aspecto
E o inverso do direito é a busca do desejo sem culpa."
E a galera que estava no Bar Central, em Sobradinho-DF, cantava com ele, num bonito coral de boteco.
Tomei coragem, superei minha timidez de primeiras abordagens, e peguei um banco de balcão.
O proprietário logo veio me servir de uma geladinha e perguntei-lhe se toda terça tinha música ali.
Ele me disse que não.
Que a razão era o aniversário do churrasqueiro do estabelecimento, o Índio. E que os amigos deles, inclusive músicos que gostam dele, vieram prestigiar.
Tinha umas 40 pessoas, em mesas espalhadas pela calçada, e notei que os músicos alternavam-se nas canjas para o aniversariante.
Aí, ele passou ao meu lado e eu aproveitei para cumprimentar-lhe.
Ele olhou para mim, sorriu, e disse: "Não vale só me dar um abraço, tem que ir lá buscar a carne, feijão tropeiro e macaxeira."
E partiu para a "varanda" da calçada onde pilotava a churrasqueira.
No "palco" assumiu a canja o Negão de Planaltina, com uma voz que deixaria Tim Maia com inveja. Ele começa logo com um samba de Jorge Aragão chamado Coisa de Pele e o pessoal delira:
"Podemos sorrir,nada mais nos impede
Não dá pra fugir dessa coisa de pele
Sentida por nós,desatando os nós
Sabemos agora,nem tudo que é bom vem de fora
È a nossa canção pelas ruas e bares
Nos traz a razão relembrando palmares
Foi bom insistir,compor e ouvir
Resiste quem pode à força dos nossos pagodes
E o samba se faz,prisioneiro pacato dos nossos tantãs..."
Naquela terça, eu estava me sentindo um tanto saudoso, arrotando melancolias mal dormidas;
Mas, notei que na segunda música meu estado de espírito já era outro. Agora sim, o Ricardim voltou!
Chamei o proprietário, pedi mais uma cerveja, animado pelos Tantãs, e perguntei-lhe como era o esquema da comida. Se eu pegava lá, no local que o Índio estava, ou se trazia o valor para ele botar na conta.
Ele sorriu e me disse, "como assim?".
"O Índio não te convidou?"
Eu falei que sim, mas que não sabia se iria ficar, e agora irei até a última música das canjas.
Então ele fez um sinal para o Índio. E o Índio se aproxima com uma farta porção de carne, feijão tropeiro e macaxeira, sorri para mim, e diz, "hoje é tudo por minha conta, seja bem-vindo".
Uauuu!! Eu não acreditava na generosidade da cena.
Quando ele voltou para a churrasqueira o dono do Bar Central me disse que ele quis comemorar os 50 anos, fazendo o que gosta: servindo churrasco onde trabalha. Mas, dessa vez sem cobrar nada. Já estava pago.
Um céu se descortina no local. E comecei acompanhar o Índio que não deixava ninguém com prato vazio.
Ele assava e servia as mesas. Em cada mesa parava, fazia fotos, e levava pedido de músicas para seus amigos que davam canja.
Então disse ao dono do bar que me sentaria bem perto dos músicos, e do Índio, no chão mesmo, num degrau de calçada, para prestigiar o evento.
Aí era só coisa linda que via. Gente que vinha só abraçar-lhe, não ficava. Gente que passava na calçada e ele perguntava se queriam ficar. E até alguns moradores de rua vieram fazer quentinha com ele, que os tratou como se fossem Vips.
Peguei a nota de R$ 100,00, aquela que destinaria a comprar coisas que não preciso, e que podem ficar para um dia qualquer, me aproximei dele e disse-lhe que iria dar-lhe o presente de aniversário, e coloquei a nota no bolso do .jaleco dele, impecavelmente branco.
Ele botou a mão no bolso, olhou para aquela nota fixamente, e se aproximou de onde eu estava sentado. Ele então me disse: "Senhor, será que não pegou a nota errada?".
Dei uma gargalha e disse-lhe que não.
Ele me abraçou e disse, "vai dar para comprar mais carne, que já estava acabando, muito obrigado" .
Ao lado do bar da Central tem um açougue, então pude vê-lo entrar nele e sair com mais carnes.
Ele não queria dinheiro. Ele queria prazer, prazer de doar para os presentes o que ele tem de melhor, a capacidade de acolher, de celebrar a vida, e de querer que não faltasse carne para esse momento.
Lembrei daquela cena que Maria diz a Jesus, num casamento em Caná; "Eles não têm mais vinho".
Ele não tinha mais carne, e deve ter investido muito, pois o local estava cheio.
Eu degustei da alegria do Índio pelos 50 anos. Como ele estava feliz!
A felicidade dos simples tem uma complexidade que para vê-la precisamos nos despir de nossa pele burguesa e nos permitir comungar com gente sem títulos, posses ou poder de qualquer espécie. Pessoas comuns, com atitudes incomuns, pobres de orgulho material e mansos de emoções.
Perto das 17hrs, despeço-me dele e volto para o balcão, para pagar minha cervejas.
Aí ele se aproxima, me entrega uma quentinha e diz: "É para você levar para casa".
Eu mordo a língua para não dar vexame e chorar. O Negão se aproxima e pergunta se não quero pedir uma seresta, saideira, eu pergunto se ele sabe Ronda, ele abre um sorriso, dirige-se ao "palco" e solta o vozeirão: De noite eu rondo a cidade a te procurar sem encontrar. Em meio de olhares espio, em todos os bares você não está.

Enquanto digito esse texto como um risoto que fiz pedaços do churras que o índio me deu.
Esse risoto que como e que está suculento tem um sabor especial. O sabor da generosidade de um coração que aprendeu a servir e a doar-se, e faz disso o sentido do seu viver.
Voltei hoje por lá, fui presenteá-lo com meu livro. Mas, o chefe disse-me que hoje é o dia de folga dele. Outro dia irei.
Preciso fazer terapia do amor ao lado dele. Vou pegar uma mesa bem próximo, para dele receber as boas emanações de emoções positivas tão raras hoje em dia.
Quem de nós, no dia do aniversário, chamaríamos todos que passavam pelo local para conosco comer e celebrar?
E por isso que acredito que a Humanidade tem cura. Há pessoas lindas que podem nos ensinar muito. Verdadeiros sábios.
Mas, para que possamos aprender e participar de suas aulas, teremos que desaprender um monte de coisas que fomos internalizando, criando em nós verdadeiros monstrinhos:
o orgulho, nosso jeito de pensar a vida bem burguês, o medo e o nojo de pobres, os preconceitos com os "diferentes", as nossas verdades quase sagradas, tudo isso que mais separa do que junta. Mais cria muros do que pontes.

Que possamos nos inspirar nessas pessoas tão simples, mas conhecimentos bem complexos do que realmente se faz uma vida que por ela vale a pena viver.

Cartas ao JG - Um copo sujo no caminho. (Por Ricardo de Faria Barros, pai do João Gabriel, 8 anos)



Fui te pegar no colégio e você saiu cabisbaixo. Quando vejo-lhe assim, já sei que tomou um bilhete da "tia".
E foi mesmo. Tu me falou que na hora do recreio empurrou um coleguinha que queria à força fazê-lo tomar uma água suja, colocada dentro de um copo.
Abracei-lhe, não para passar a mão na tua cabeça, mas em solidariedade à bronca que levará da tua mãe. rsrs
Aí notei que perto de teu olho tinha um vermelhão e estava inflamado.
Perguntei-lhe o que o ocorrera e tu me disse que levou uma bolada de vôlei, e que o óculos protegeu teu olhos. O impacto da bola nele, fez com quem a armação machucasse teu rosto.
Pensei comigo, "hoje não era o dia do JG no recreio". rsrs
No caminho, você estava todo falante, já mais relaxado, talvez esquecendo das futuras broncas.
E, me perguntou, se estava certo levar um bilhete pra casa por ter defendido-se.

Eita JG, que pergunta difícil.

Imagine filho se para cada violência que a vida nos aprontar nós reagirmos na mesma intensidade, como autodefesa instintual, como se fôssemos animais.
E não somos, embora alguns se pareçam muito, aliás têm menos cérebro emocional do que eles.

Caso paguemos violência com violência, terminaremos nos tornando como eles ficaram: brutos e intolerantes com o diferente.

Você terá que achar teu próprio tom, entre ser um pamonha, aquele que não se defende de nada, e ser um cara que não releva nada. Daqueles que para ele é tudo Sim, ou Não, e ainda diz todo orgulhoso: "Bateu em mim, apanha com mais força ainda".

Esse é um misterioso ensinamento que precisará desenvolver para bem viver e conviver: o do autocontrole, misturado com sabedoria.

Ter autocontrole emocional te levará a buscar saídas não-violentas para situações ruins pelas quais passará.

Para algumas delas, será necessário apenas retroceder, desviando-se da área de choque iminente. Ou seja, não dar murro em ponta de facas. Ou, gastar vela com defunto ruim.

Para outras: deverá ser um contorcionista bem flexível, e ao driblá-las seguir caminho à frente.

Outras ainda, te levarão a ter que se adaptar a elas. Mudando a si mesmo, crescendo em conhecimentos, após experiências difíceis pelas quais passará, e que também fazem parte do pacote do viver.

Retroceder, driblar/contornar; e se adaptar são três verbos que te ajudarão muito na harmonização de relações por onde passar, e são a essência da coletivo vivência.

Uma pena que no lugar dele todos os dias somos ensinados a defender com unhas e dentes nossas posições, e verdades quase sagradas, a atacar ao menor "copo de água suja" nos apresentado para tomar, ou a no lugar de oferecer repostas, diante de situações desagradáveis, procurar culpados ou um monte de justificativas pelas nossas reações também agressivas.

Então filho meu, a arte de bem viver é saber quais batalhas vale bem a pena guerrear, e para as quais poderá renunciar entrar no ringue, e seguir caminho.

Se ficar entrando em tudo que é briga pequena, vai passar recibo de uma pessoa explosiva, que não sabe amortecer nos peitos uma brincadeira, um pequeno desafeto que recebeu, ou uma pisada na bola que fizeram para contigo. Saber superar esses pequenos dissabores exigirá de ti, além do auto-controle e sabedoria, o quinteto fantástico da inteligência emocional positiva: empatia, autoestima, compaixão, resiliência e otimismo.
Juntos, eles fazem com que até o pior copo de água suja que te entreguem seja percebido por ti, com outras lentes, e convertidos num gesto dele de querer brincar contigo, e não de te provocar. E aí tu vai aprendendo essa arte de bem viver que é a de converter na mente as maldições em bênçãos.

Para muita coisa chata que lhe ocorrer essa fórmula vai ser libertadora.
Chegamos perto da ponte, você estava dormindo. E eu falando sozinho. rsrs
Esperei tu terminar o o Kumon, e na ida para casa resumi o que acima falei.
Agora vamos para segunda parte da resposta pra tua pergunta, se foi certo ou errado você ter empurrado o menino. Nessa parte usarei a bolada que levou na cara.
Ou seja, haverá situações difíceis que sofrerá que causarão um forte impacto em teu ser, não dando tempo de se desviar delas, tal qual aquela bola de vôlei.
Aí você precisará buscar suas fortalezas e armaduras para se defender. Como o óculos fez contigo.
Uma das melhores é a comunicação não-violenta. Vou te ensinar de uma forma bem fácil.
Imagine quatro verbos, uma para cada fase do que irá comunicar à alguém que lançou uma bola contra ti: Relatar - Identificar - Expressar - Solicitar
É facinho essa fórmula e tenho usado com frequencia e me feito muito melhor. Engoli muitos sapos que me causaram sérias indigestões existenciais, só por não ter aprendido a comunicar o que não estava legal, e que ocorria comigo, nos relacionamentos interpessoais que vivia.
Ela nos ajuda a expressar sentimentos negativos sem arruinar quem os recebe, dando oportunidade para o crescimento dele. A Comunicação Não-Violenta que vou lhe ensinar pode ser decorada nessa sigla: REIDES. Não sem razão essa sigla que criei remete à redes. Veja abaixo:

Relatar o Fato Jornalisticamente - Nesse verbo você apenas diz o que ocorreu, narra o fato, a observação que fez dele. SEM CRÍTICA.

Identificar o Sentimento Ruim a Ele Associado - Nesse verbo, você apenas diz como se sentiu, expressando numa palavra a emoção negativa ou sentimento que sentiu, após o fato ocorrido. SEM VITIMIZAR-SE ou ENQUADRAR O OUTRO.

Expressar a Necessidade Maior Não Atendida- Aqui você diz o que gostaria que acontecesse, expressa sua necessidade. Identificar a necessidade é maior do que o simples ocorrido. Por exemplo, sua namorada furou a ida ao cinema contigo. Sua necessidade não é ir ao cinema, entende? Sua necessidade é de maior intimidade e companhia com ela, de momentos a dois. SEM JULGAMENTO E CRUCIFICAÇÃO DO OUTRO

Solicitar - Aqui você encerra a comunicação, dizendo o que exatamente quer, com foco no presente e futuro, sem trazer mais as tintas do que já ocorreu de errado, sem botar o outro contra as cordas. Dando ao outro oportunidade de se colocar também. JOGANDO FRESCOBOL

Vamos ao exemplo do copo sujo:

Relatar - Amigo, quando você insistiu para que eu tomasse aquela água suja. (Correto). Amigo, achei idiota querer me fazer tomar aquela água suja (errado).
Identificar - Eu me senti desprezado (Correto). Eu senti que você é uma pessoa muito má. (Errado).
Expressar - Eu tenho necessidade de uma amizade mais amistosa. (Correto). Eu necessito de amigos que prestem (Errado)
Solicitar - Será que podemos ser amigos sem que ocorra entre nós nada que possa nos machucar? (Correto) Da próxima vez que você me entregar um copo de água suja pra tomar eu vou te segurar pelo pescoço e fazê-lo você mesmo tomá-lo. (Errado).
Lógico filho, que essa metodologia acima você usará para 20% dos dissabores, aqueles que de fato valerão a pena tentar harmonizá-los, pelo diálogo. Quanto aos outros, bem mais comuns, desenvolva o autocontrole e a sabedoria de retroceder, desviar ou se adaptar.

A arte de bem viver, muitas das vezes será a de parar ter um monte de razões em tudo que lhe acontecer.

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