Guarde seu lixo emocional na lixeira



Todos os dias passo por essa calçada indo almoçar.
Todos os dias incomodava-me o lixo jogado nela.
Cada um que via a pilha lixo, aproveitava a ocasião, e jogava mais coisas sobre ela.
Lixo atrai lixo. É a Teoria das Janelas Quebradas:
 “O vidro quebrado num automóvel abandonado transmite a ideia de deterioração, desinteresse e despreocupação, como se não houvesse regras ou normas de convivência, como se alguém dissesse: “aqui vale tudo”. E a cada novo ataque ao automóvel, reafirma-se e multiplica-se essa ideia, até que a escalada de atos cada vez piores se torna incontrolável, desembocando numa violência irracional.”

Então, que seja, a cada dia a montanha de lixo estava ali. Fétida, atrapalhando a vida de quem trafegava naquelas calçadas. Enfeiando a paisagem.

Ontem fiquei serelepe de alegria. Num é que a calçada estava limpinha, limpinha.
Intrigado achei o motivo. Acho que um dos moradores dos prédios à frente saiu da posição da crítica, do lugar de observador, e agiu.
Fez o que nem sempre faço. Ponto pra ele.
Com um simples cartaz, ele(a) estimulou a população a depositar seu lixo no lugar correto: “Na lixeira, próximo a faixa de pedestre”.
Hoje, passei novamente e ela continuava limpinha. Até cheirando estava.
Por anos a fio aquele lugar foi associado culturalmente a um depósito de lixo.
Quando eu reclamava, alguns amigos me diziam, é da cultura do povo, não muda.
Mudou. Mudou por uma reeducação postural.
Tenho atendido a muitas pessoas que estão com lixo em suas calçadas interiores. Pessoas aflitas, desanimadas com a vida, tristes, e com indícios de depressão leve à moderada.
Mais preocupante ainda é o alerta de que até 2020, a depressão poderá ser a 2ª causa de doenças incapacitantes no mundo, alerta a Organização Mundial de Saúde (OMS).
Quem me lê e sente-se cansado, sem ânimo, triste, abatido sabe o que é uma calçada interior cheio de lixo emocional.

Tem muita gente sofrendo e precisando de ajuda. A psiquiatria moderna não consegue mais do que aliviar os sintomas, as psicoterapias são lentas e caras.
E o cidadão comum, educado para vencer, ao se deparar com perdas, frustrações, negações de expectativas vai definhando.
As pessoas acometidas desse profundo estado de desânimo não encontram forças para dele saírem.
O desânimo invade todas as áreas. O sol brilha menos, o céu fica turvo, a comida insossa, a libido desaparece.
E os amigos parecem distantes.
Olhos vazios, focam um infinito sombrio.
Deprimidos sofrem. Sofrem consigo mesmos, por não se aceitarem na condição de apatia.
Sofrem ao perceberem que foram notados.
Sofrem ao negarem participar de eventos que antes eram tão prazerosos.
Deprimidos aprendem a depositar o lixo interior, aquele que lhe faz mal, em todas as áreas de suas vidas.
Vão se isolando, morrendo aos poucos ainda em vida.
Como morria aquela calçada.
A calçada é lugar de passeio, de fluidez e de travessias. Quando entulhamos nossa calçada interior com todo tipo de tranqueira emocional, todo tipo de lixo, tudo que não presta vai sendo depositado ali, acumulando-se sem processamento, ao léu em nosso coração.
Precisamos de uma área para depositar nosso lixo interior. Um lugar em nosso coração que o lixo emocional seja guardado, e aguarde o seu próprio tempo de decomposição, de processamento, de maturar a dor, a exemplo da “lixeira perto da faixa”.
Se você que me lê sente-se assim, lembre-se em afixar uma placa dessa da foto em seu coração.
Não digo-lhe que será fácil. Mas digo-lhe que é possível vencer a depressão com uma reeducação emocional. Com o uso de forças deliberadas da razão.
Assim como foi feita naquela calçada e seu lixo. Que com a força da educação transferiu-se para uma área determinada – a lixeira.
Tenho estudados três correntes da psicologia que vêm obtendo significativos avanços no tratamento da epidemia do século: A Logoterapia, a Terapia Cognitiva, e a Psicologia Positiva (ou do Bem-Estar/Florescer).
Comum a todas a firme decisão de sair do buraco. De recolher o lixo e levá-lo para um único canto do ser.
Ou seja, em comum há a razão combatendo a emoção negativa.
Uma das formas de resgatar-se de um processo depressivo é focar nas virtudes. Todos as têm.
Segundo a Psicologia Positiva temos um conjunto de forças que poderão ajudar no transporte do lixo. Martin Seligman & Christopher Peterson descrevem 24 virtudes, agrupadas em seis categorias.
Esse inventário de virtudes está disponível na rede para você fazer. Veja ao término desse texto.
Para os papas da psicologia positiva, transfere-se o lixo de nosso emocional para um canto compartimentado de nosso ser, quando conhecemos nossas principais forças e as usamos para renascer, ou florescer, como eles costumam dizer.
Veja as 24 forças, agrupadas em seis categorias de virtudes:

I. SABEDORIA E CONHECIMENTO

1. Curiosidade / Interesse pelo mundo
2. Gosto pela aprendizagem
3. Discernimento/Pensamento Crítico/Imparcialidade
4. Engenhosidade/ Originalidade/ Inteligência prática / Esperteza
5. Inteligência Social/ Inteligência Pessoal/ Inteligência Emocional
6. Perspectiva (forma de enxergar o mundo)

II. CORAGEM

7. Bravura/ Valentia
8. Perseverança/ Dinamismo/ Diligência
9. Integridade/ Autenticidade/ Honestidade

III. HUMANIDADE

10. Bondade/ Generosidade
11. Amor/ Capacidade de ser amado

IV. JUSTIÇA

12. Cidadania/ Dever/ Espírito de Equipe/ Lealdade
13. Imparcialidade/ Equidade
14. Liderança

V. TEMPERANÇA

15. Autocontrole
16. Prudência/ Discrição/ Cuidado
17. Humildade/ Modéstia

VI. TRANSCENDÊNCIA

18. Apreciação da beleza e da excelência
19. Gratidão
20. Esperança/ Otimismo/ Responsabilidade com o futuro
21. Espiritualidade/ Senso de Propósito/ Fé/ Religiosidade
22. Perdão/ Misericórdia
23. Bom humor/ Graça
24. Animação/ Paixão/ Entusiasmo

Essa abordagem, que foca em aspectos sadios de nosso ser, expandindo-os para outras áreas, tem dado muito certo em várias partes do planeta, em casos rigorosamente documentados.
Quem está cansado, mórbido e triste acaba se vendo assim em todas as áreas d a vida e perdendo o vigor.
Se você que me lê está assim, peço-lhe calma.
Você conseguirá atingir um outro estado do ser, o do bem-estar, a partir de exercícios simples que remodelaram sua forma de perceber o mundo, opaca pelas lentes da apatia.
São três exercícios:
1. Conte as coisas boas que acontece em seu dia, as suas bênçãos, e as anote num diário. Ao lado delas, tente registrar o porquê delas terem acontecido. No mínimo três por dia, durante 15 dias.
2. Pratique um gesto de bondade diário. Por 30 dias.
3. Faça três elogios verdadeiros, durante 1 semana – A Semana do Elogio.
4. Uma vez por semana, pratique a “visita da gratidão”. Encontre-se com alguém para com quem tem uma dívida de gratidão e revele o quanto a pessoa lhe foi importante, em determinado momento e circunstância da vida.
5. Faça cartas para quem ama (uma por semana). Pode ser e-mail, mas nada substitui recebê-las pelos Correios.
6. Diariamente tente fazer uma coisa que já gostou e que não gosta mais, mesmos em querer. Faça como se fosse um remédio que toma. Se gosta de cinema e não tem mais vontade. Uma vez por semana tome o remédio Cinema.
7. Durante cinco semanas pratique as cinco primeiras virtudes que lhe são mais fortes. Uma por semana, veja quais são seguindo o passo a passo abaixo.

http://www.viacharacter.org/Survey/Account/Register

1. Na área  Register To Get Started. Trocar o idioma para Portugal (Brasileiro)
2. Fazer o registro
3. Teclar "Registrer"
4. Marcar a caixa: "Eu quero preencher o questionário VIA-IS"
5. Faça o questionário
6. Envie
7. Não preencha nada em DEMOGRAPHIC DATA
8. Clique em Complet Survey
9. No rodapé da folha faça o download dos seus resultados.
10. Os resultados são apresentados por ordem de força das virtudes em você, das maiores às menores.

Lute, um dia de cada vez. Permita-se florescer. Use suas forças para renovar seu ânimo, encontre um sentido no próprio sentido de sobreviver, de lutar contra a aflição, o tédio e a tristeza que alguma vez possa assolar tua alma. Quero dizer-lhe que acredito em ti. Que você tem valor. que só está cansado das pancadas, mas que aprenderá a olhar o lado bom da vida, aquela que por ela vale a pena viver.

Tangendo a Boiada de Emoções Negativas


Existem sentimentos difíceis de serem processados: a mágoa, a calúnia,o rancor, a intriga, a culpa, a ingratidão e o amor não percebido. São os sete portais da dor emocional. Os livros de autoajuda ensinam, ensinam, ensinam, mas nada funciona. Os orantes idem. Psicólogos de todas as espécies entram em campo, e só tomam de goleada.
Esses tropeços emocionais arranham nosso disco de sentimental. E, por horas, dias, meses, ou até anos, ficamos tocando aquele pedaço só: empacados num trecho melodioso de dor, e em dó maior.
Já comeu algo que te deu indigestão?
Que te fez arrotar por dias?
Que só de lembrar a cabeça dói?
Pois bem, existem as indigestões da alma.
Coisas que entram atravessadas em nosso ser e nos abalam emocionalmente.
Em alguns casos, sugam de nós o viço e a motivação.
Processar esses sentimentos, convertendo-os em algo útil ao nosso crescimento é um desafio, digno de por ele ser vivido.
Mas, nada fácil.
Não é tão fácil virar a página, como os manuais e vídeos motivacionais apregoam.
Quem já foi vítima de uma injustiça sabe bem de que falo, de uma calúnia, de uma armação ou intriga.
Quem foi vítima da vaidade e invejas da corte, quem teve que engolir sapos para sobreviver, idem.
A verdade é que protegemos demais nossa autoimagem. Nos levamos a sério demais, E, não somos capacitados para sobreviver à frustração.
Sempre sofri muito com isso tudo.
Sofro de má digestão emocional.
Tenho azias homéricas de sentimentos mal digeridos.
Nos últimos anos tenho melhorado. Não curei. Ainda sofro mais do que devia com coisas sobre as quais não tenho controle. Mas noto em mim progressos.
Queria compartilhar contigo o que faço e vem dando bons resultados.
Eu virei um aboiador de sentimentos ruins.
Quando percebo que eles estão chegando os tanjo, qual tange-se uma boiada.
Luto contra a baixa autoestima com a razão.
Se vai chegando em mim aquela frequencia de desamor, mudo a estação imediatamente.
Se vai chegando em mim aquela frequencia de uma mágoa, troco a estação.
Como?
Penso racionalmente em outra coisas.
Falo com minha voz interior que está me azucrinando que ela pare. Que tenho mais o que fazer. E boto outros pensamentos pra rodar no meu HD.
Somos o que pensamos.
Não me curo pela emoção, pelo sentimental. Curo-me pela razão. Torno-me presente quando o sentimento ruim vem chegando. Identifico-lhe e, em cima dele, trabalho outros temas. Não querendo mudá-lo. Quem já sofreu, sabe que não adianta nada fingir que não dói. Dói. E a dor invade várias área de nosso ser. Chupa nossa essência. Tira nosso brilho, nos faz definhar.
Então eu luto, não contra a dor, mas desviando sua força para ela mesma. Qual artes marciais.
Luto, remodelando meus pensamentos para áreas que estão legais e que me sinto bem. Se não posso mudar uma situação, posso mudar a forma como por ela me deixo abater. Pense nisso! Aprenda com o acontecido, e, reprograme seus pensamentos para calar a voz interior que fica arranhada nessa cena de dor e melancolia. Salte a faixa arranhada do disco de seu viver. Como? Conscientemente. Coloque outros pensares para processar, assim virão outros agires.

Nas ondas do amor


Volto cansado após mais uma aula. Cada vez temos que nos esforçar mais para despertar a atenção de nossos alunos. Entro no carro e imagino que ainda estou a 30 km de casa. Os carros voam, passam por mim jogando-me para além da faixa dos lerdos. Todos querem chegar logo em casa. Pensativo, dirijo devagarinho, procurando me concentrar nas voz dos locutores de rádio. Vou zapeando, procurando propagandas, programas de auditório, comentaristas e postais sonoro. Gosto de programas de rádio bem populares. Sinto vida neles. Mas, gosto mesmo é de zapear pelas emissoras, até em AMs.
Ontem não conseguir tirar de uma rádio que achei. Fiquei hipnotizado. Não tive coragem de mudar o seletor. Passava um programa interessante. De um lado da linha, um pastor. Do outro, pessoas que queriam mandar uma mensagem para os apenados da Papuda, maior Complexo Penitenciário destas bandas.
Não havia comunicação com os apenados. Imagino-os coladinhos no rádio, ansiosos por receberem uma mensagem dos seus. O pastor cronometrava o tempo rigidamente, como quem sabe o valor daquelas mensagens para quem teve a liberdade cerceada por sua culpa, sua tão grande culpa. Ele queria otmizar a participação. Tá certo.
Eram filhos, mães, mulheres, irmãs... Cada um deles tinha uns 15 segundos. E, naquele 1/4 de minuto sempre saia algo belo. Algo especial a dizerem. Durante uns 20 minutos fiquei chorando sozinho, a cada telefonema que tocava no celular do pastor, e que ele botava o áudio ao vivo no ar. Imagino o frisson nas celas, com muitos apenados sintonizados na emissora e ouvindo aqueles acalantos.
As mensagens começavam tímidas, depois iam criando emoção. O pastor incentivava a produção, conduzindo para preces. O povo o desobedecia. rsrs Confesso que não ouvi muitas preces. Mas, ouvi muitas preces, as preces maiores, as do amor, da esperança, da confiança no outro.
Escute comigo algumas das frases que não me deixaram dormir ao chegar da aula.
"Baby, eu te amo, não desista!".
"A casa está ok".
"Nossos filhos mandam lembranças".
"Escute aqui, ele aqui falando: diz alô para o papai, vai...".
"Aqui quem fala é sua mãe, tenha força e fé meu filho."
"Estive com o advogado e ele vai pedir nova audiência".
"Avisa ao José que a Fátima está boa."
"Aqui está faltando de um tudo, mas o pessoal tem ajudado."
"Não se preocupe conosco. Cuide de você."
"Estou com saudades...não tenho podido faltar o trabalho pra te ver nas quartas".


São, ou não são, verdadeira preces? Feliz de quem sente o amor.
Feliz de quem se sente amado. Não tenho dúvidas de que cada um daqueles apenados, mesmo sem poderem interagir com as ligações, sentiram-se amados, abraçados, e naquela noite, estimulados a mudarem - nem que seja pela fração do tempo em que sentiram-se privilegiados de ouvirem seus nomes, em súplicas de desejantes.


O amor pede expressões, gestos, atitudes concretas. Pede telefonemas esperançosos para um pastor numa rádio qualquer, torcendo para que um radinho de pilhas esteja encostado no ouvido de quem se ama, e sintonizado naquela emissora.


Aquelas mulheres são a expressão do amor. Chorei com elas pelos seus amados.


A humanidade está carente de demonstrações de afeto, de amor, de cuidado, de interesse genuíno pelo outro. Mas, é só prover as condições que o amor brota e se revela em formas mil.


Com licença, nessa noite o amor pede passagem! Vou ali fazer meu gesto.

Moradas


Nesse domingo curto a casa

da árvore do JG. 
Ele diverte-se com lançamentos
de brinquedo no pai. 
Diverte-se mais ainda pulando
a janela e me deixando preso no interior. 
A tramela da porta da frente fecha por fora.
Uma questão de segurança que não pensou na traquinice de meu filho ao prender o pai. 
Depois de alguns apelos infrutíferos, ele vem me soltar. Rimos os dois. 

Aquela cena compensou a frustração de ter rodado 80 km, até Sobradinho-DF - ida e volta, e não ter visto o filho caçula. 

É que hoje saímos de casa cedinho com o firme propósito de visitar o jovem casal, na sua morada nova. Contudo, Rodrigo e Carol não estavam em casa. 

Tinham ido comprar pratos e talheres. Pensei, sou mesmo nordestino que cisma em visitar as pessoas queridas sem se anunciar antes, só pelo prazer da surpresa. Na semana que passou, assinei mais dois contratos de morada dos filhos. O do Tiago & Carol e o da Priscila & Hugo. 

Todos agora possuem um CEP alugado e pra chamar de seu aqui no DF. 

Agora todos os meus filhos possuem suas próprias tocas. Agora eles começam de fato suas construções interiores. 
Seus voos para um lugar no infinito, tão perto, tão longe.

Fico pensando no quanto somos caverna, toca, buraco, tenda, oca, gruta, cabana, casa, apartamento e , árvore e catedral. Somos morada. Um ethos que se faz sentido no nós. 
No fundo, queremos um lugar pra acender a fogueira, pintar as paredes, nos proteger, alimentar, orar, repousar e celebrar o desafio e a beleza de viver.
Estou lendo um livro do Seligman que me remete à beleza das moradas. Chama-se Florescer. Ele fala do que realmente importa para o bem estar: Emoções positivas, engajamento, relacionamentos saudáveis, sentido de propósito e realizações.
A busca da primeira morada, longe do ninho dos pais, tem dos cinco elementos do bem-estar um pouquinho de cada, por isso tão gostosa a sensação. 

A noite se aproxima. Vem ofegante abocanhando os mais tenros raios de luz, então vou na cozinha e preparo um capuccino, está frio.
Aproveito pra ligar para meus pais. Quem atende é Celina, que mora com eles há 20 anos. 
Celina pergunta-me se eu tava vendo na TV as cenas do enterro do Eduardo Campos.
Respondi-lhe que não, que optei por não ligar a televisão nesse domingo.
Mas, que como o tema do que estava escrevendo era sobre morada, aproveito para dizer:lhe: Celina, não se entristeça teu coração: "na casa do Pai há muitas moradas".
E, com certeza ele será recebido por lá. 
Todas as outras moradas acabarão um dia virando pó.
A única morada que ficará de pé, 
quando tudo for caos, é a de um espírito órfão que todos os dias chora e suplica em nosso peito com saudades do regaço de seu Pai.
Mas, só Ele saberá a hora e dia do encontro.
Podemos até estar tomando cafezinho num lugar em que um avião cairá, em poucos minutos, e de lá ter saído a tempo de não ter acontecido nada, e, ao orar agradecendo, uma porta passar voando por cima, motivada pela explosão do querosene do avião que jaz no quintal. Não era o dia.
Aí escuto um sussurro dizendo-me: "bota umas linhas Minhas aí na tua crônica". 

Obedeço.

"Ei, enquanto não Te chamo, contribua em tornar esse mundo melhor do que encontrou. Este é o valor do bilhete para a eternidade, um lugar em que cada lágrima tua, de choro ou riso, fez germinar frutos de um banquete de vida plena que tu ainda irás prová-lo."

Pequenas mudanças, grandes resultados.


Era um sábado de noite bela.
Meu irmão convidou-nos a inaugurar seu forno de pizza.
Adoro inaugurações, comemorações, celebrações de qualquer natureza. A vida pede pausas e marcações no tempo, feitas para eternizar momentos.
Botamos a lenha no fogo.
Nem ele nem eu tínhamos a mínima ideia do quanto precisaria de lenha. Fomos aos pucos. e, acompanhando no termômetro. entrei no Pai Google e vi que o forno tinha que chegar a uns 200 graus. Chegou a 100 e nada de passar daí. Tomávamos uns drinques, sempre botando mais lenha e olhando o termômetro.
Aí o Guga teve uma sacada. A lenha estava sendo colocada errada, em montinhos e no sentido vertical, uma por cima da outra.
Só queimava a extremidade interna.
Só uma das pontas.
O certo seria colocá-la no sentido horizontal, por cima das tenras brasas, para que toda sua extensão pegasse fogo.
Aumentando em 100%, no mínimo, a área de combustão.
Não deu dois minutos e o termômetro foi para 250...
E tome brindes. Ficamos alegres qual crianças que ganham sorvete.
Pronto, o forno estava aquecido.
Na bancada, minha sobrinha preparava a massa com a base de molho de tomates e os ingredientes. A que inauguraria o forno seria a do JG. ele recebeu essa honraria do tio. E foi uma calabresa. Dez minutos de forno foram suficientes
Dez minutos depois, saia uma pizza suculenta, tostadinha por fora e macia por dentro. Uma delícia. Se o JG não corre não sobrava nada pra ele. A noite era de comunhão familiar.
Umas cinco pizzas à frente fiquei pensativo. Minha caraminhola começara a processar o apreendido.
A diferença entre queimar só uma parte de si mesmo, quando nos envolvemos com algo, e o entregar-se totalmente. doar-se totalmente, mergulhar com paixão dando o melhor de si naquilo que faz ou sente.
Todos somos omo esse pedaço de lenha de madeira. As coisas com as quais nos vinculamos geram fogo, aquecem nosso coração.
Dão motivos, propósitos, e porquês viver.
O problema é quando não colocamos todo nosso potencial, ou pior, quando as pessoas que nos cercam não têm o dom de sacar nosso potencial e melhor aproveitá-lo. .
Não têm a sacada que meu irmão teve, ao perceber que o potencial daquela lenha, para a combustão, estava sendo parcialmente atendido.
Quantas famílias castram o potencial de seus filhos, super protegendo-os.
Quantos gestores castram o potencial de seus funcionários, repreendendo-os à menor falha.
Quantos relacionamentos afetivos são fogo baixo. Um deles, ou os dois, em jogos dramáticos, passa a diminuir a labareda do outro, anulá-la. O que antes era admiração agora é ódio velado. Chiste, rancor, ironias nada finas. Foca-se no que dá errado e deixa-se de admirar o outro.
Um parceiro anula o potencial do outro. Deixando de incentivá-lo, estimulá-lo a crescer, de acreditar que ele é capaz de superar e vencer as dificuldades.
Sê inteiro em tudo que tocas. Coloque mais disciplina, mais vigor, mais paixão na tua vida. Identifique áreas nais quais um simples girar da lenha seca poderá fazê-las funcionar melhor.
Entendeu a metáfora?
Mude comportamentos, ou se mude de comportamentos, mas não se anule, ou deixe que outros anulem a beleza da chama que aguarda sua vocação. Há séculos adormecida em teu peito.
Fomos feitos para ser luz. Não adormeça teus sonhos. Construa-os, chama à chama, lenha á lenha.
Quem sabe não é a tua posição perante a vida que está adormecendo potenciais em teu ser? Assim como a madeira na vertical, citada no início desse texto.
Pense nisso, e não se acostume com o que faz infeliz, com a mediocridade. Antes de culpar os outros, renove esperanças e lute pelo seu espaço da chama, no forno vital de teu coração.
Sinta o crepitar de teus sonhos aquecendo teu coração.
Verás que logo logo muitos procurarão morada em teu peito, nos dias friorentos pelos quais passa a humanidade. Um frio de valores.

Efeitos da marcas dos outros em nós.


O sábado era frio em Brasília-DF, uns 12 graus, um frio desses é algo incomum por estas bandas.

Na cozinha da casa do Ricardo e Cristiane, deliciávamos-nos com um cafezinho recém passado, acompanhando por biscoito de queijo, além de uma prosa revigorante.

Uma bênção poder frequentar a cozinha de amigos.

Entre um pão de queijo e outro, o Ricardo me convida para conhecer seu Atelier, de arte em concreto, localizado no terreno aos fundos de sua casa.

Fui logo vendo a limpeza da oficina: cimentos, ferro, prensa, tinas para cura, formas, tintas e pinceis, troncos de árvores, tudo numa ordem e limpeza impecáveis.

Mais à frente algumas peças prontas, aguardando a entrega e outras curando em água.

Engulo em seco quando as vejo. Sempre admirei peças de madeira velhas, tipo dormentes, portais, roletes de tronco, madeira de demolição.

Creio que elas carregam uma história, quase falam.

Com o boom de sua utilização, encontrar madeiras de demolições a preço acessível tem se tornado uma luta inglória. Tem até gente que dá um jeito para envelhecer umas madeiras e enganar os clientes.

As peças em concreto que o Ricardo produz são imitações fieis das que sempre procurei comprar. Até as marcas de pregos retorcidos nelas estão presentes.

Falhas nas madeiras, sulcos que o tempo esculpiu, vales, grutas, fendas e montanhas na madeira existente, nada escapa à arte.

Fiquei embevecido e encomendei 5 dormentes. Sempre quis ter dormentes em casa, e esse que comprei agora é mais sustentável.

E a um preço 200% inferior ao tradicional, hoje vendido em lojas de decoração.

Muitas árvores velhas estão sendo abatidas para que delas se extraiam lascas dos troncos que deem tábuas decorativas, uma pena.

Queria um milhão de “atelieres” do Ricardo, de arte em concreto, para que essas irmãs-árvores centenárias pudessem viver em paz.

Ele consegue reproduzir tudo, até uma tábua de tronco do cerrado, cheio de gomos que mais parecem uma cortiça, está à venda.

Ele me diz que é um garimpeiro de troncos velhos, procurando-os como tesouros pelas marcenarias, restos de demolição, derrubadas, ou até nas casas de amigos.

Ao encontrá-los, os imita numa arte que embevece os olhos.

Primeiro, ele prepara a peça de concreto, sempre com hastes de ferro em seu interior para reforçarem a estrutura. Depois, com o concreto moldado, e ainda macio na forma, ele molda o tronco escolhido na mesma, usando a força de uma prensa hidráulica.

Em seguida, começa a arte, propriamente dita, que é a reprodução fidedigna das cores – no produto recém moldado, utilizando-se como modelo as tábuas escolhidas para tal finalidade, retirando da prensa as tábuas que serviram de modelo.

Após sua limpeza, elas “posam” de modelo para que sobre peças ainda monocromáticas, sem graça e formosura, vá depositando uma variedade enorme de tons sobre tons, tornando-as, agora, coloridas que ficaram bem parecidas com aquelas peças que em si fizeram morada por um tempo, nem que seja no útero de uma prensa hidráulica.

As cores são os sorrisos da vida.

Aquele velho tronco, aquela velha tábua, agora toda formosa se embeleza e numa altivez impressionante posa para que nas mãos do artista um quadro dela própria seja pintado no frio e distante cimento duro.

No final, de tão perfeito que fica, só se descobre o que é madeira, e o que é concreto, se tocarmos nas peças.

Cada deck com elas feitas, cada revestimento, cada piso, semeia um pouco de esperança na preservação e sustentabilidade de nossas madeiras de lei: Castanheira-do-Pará, Copaíba, Cerejeira, Pau Brasil, Ipê- amarelo, Carnaúba, Angelim-Pedra, Cedro, Andiroba, Aroeira, Jequitibá, etc...

Ricardo sorridente diz que guarda os moldes, ao final de cada prensagem. Eles são tesouros. Um molde bom transmite para umas 1000 peças adiante suas marcas, suas cores, ou seja sua forma.

Podem ser diferentes, o modelo e a pintura final, contudo entre si guardam semelhanças profundas, tal qual a modelo secreta da Monalisa de Michelangelo.

Com certeza tinha um sorriso discreto e que sorria com o ser.

Notando que eu estava embevecido, ele convida-me para seguir terreno abaixo, mostrando as aplicações de sua arte no jardim, pomar e horta.

Fiquei profundamente tocado naquele dia. Voltei pra casa pensando em quantas pessoas deixaram suas marcas em mim.

Meus pais, irmãos, amigos, afetos, filhos, mulheres amadas, namoradas, ficadas, os amigos da Ong GAV, do EJC, do ECC, dos grupos jovens e das pastorais da Paróquia do Rosário, do Banorte, das Damas, do BB.

Outros amigos, mais recentes, continuam a esculpir a obra de Deus em meu ser. Esculpem em mim seus talentos tais como os amigos Metodistas, os da UniBB, os da Ditec, os meus alunos e professores da Unip, Católica e Ibmec, os do Facebook e tantos outros que tive a felicidade de conviver nos cursos e palestras que ministrei.

Carregamos as marcas de tantas pessoas com as quais convivemos ou tenhamos cruzado pela vida afora.

Também podemos deixar marcas nos outros.

Marcas podem ser boas, nos elevarem, esculpirem em nós novas criaturas.

Por isso é fundamental, pela vida afora, encontrar bons troncos para conviver. Árvores boas, mansas, sábias que com certeza, pelo exemplo, lhe tornará uma pessoa melhor ao conviver com elas.

E, caso tenha convivido com gente má, infeliz, pessimista e medíocre – cuidado para não ter ficado com os seus sulcos, suas marcas, impressas em teu ser, mesmo que seja em teu inconsciente.

Um famoso estudioso da aprendizagem, Piaget, descobriu que uma das formas mais utilizadas pelo nosso cérebro para aprender é a imitação.

Esse é o perigo de se conviver com troncos podres, eles podem moldar em nós suas piores características.

Outro perigo são os sepulcros caiados. Pessoas que por fora aparentam uma coisa e que na verdade, em sua essência, são outra. Ardilosos, manipuladores, enganadores de toda natureza, fingem a mais correta atitude: perigo, tudo fachada.

Na metáfora com o atelier de arte em concreto, são os troncos falsos. Que por fora são belos, íntegros, fortes... mas em seu interior habita famílias de cupins. A madeira então, aquele belo exemplar cujas característica irão ser imitadas, não aguenta a pressão e rompe-se ao menor esforço da prensa hidráulica. Sua estrutura desmorona, cede ao teste da força.

Outras madeiras hipócritas são aquelas que madeireiros sem escrúpulo a envelhecem na marra, enterrando-as em terreno úmido por um ano. Após o que, as mesmas ficam com aparência de velhos dormentes, tábuas e portais antigos. Muito valiosos. Pura enganação. Na verdade, esse processo mentiroso de envelhecimento afeta a estrutura interior da madeira apodrecendo-a internamente. Então, ao ser prensada ela rompe-se facilmente.

Meu amigo Ricardo, contou-me que esse é o maior problema: distinguir troncos-modelo verdadeiros dos falsos, e aí só no dia a dia mesmo. Lembra aquelas pessoas que no mundo lá fora são uns cordeirinhos, uns anjos de retidão. Contudo, entre quatro paredes revelam-se lobos predadores de toda autoestima existente, de toda boniteza da alma que encontre.

São feras sanguinárias da família e de quem lhe rodeia mais de perto.

Fariseus que pregam uma coisa e fazem outra.

Fiquei matutando como isso é parecido conosco. Quantos tidos como exemplos, como baraúnas sagradas, quando se encontram sob pressão, seja da ambição, do dinheiro, do poder, da fama, revelam quem de fato são: troncos carcomidos, almas corroídas, espíritos de porco.

Como distinguir então? Procure os frutos de líder-exemplo. Frutos são gestos concretos de compaixão, de solidariedade, de amor, de perdão, de ética, de honestidade, de justiça, de gentileza, de misericórdia, de educação e de respeito aos seres humanos.

Simulacros de exemplos, sepulcros caiados, não frutificam...

Essa recomendação é muito útil em tempos de eleição também.

A boa notícia é que a fé, o autoconhecimento, a educação e a consciência crítica funcionam como o atelier do Ricardo. Produzem mudanças, transformações significativas usando a força da poesia, da arte, do amor. Conseguem até revitalizar madeiras podres por dentro ou cheias de cupins na alma.

A educação, aliada ao autoconhecimento e amor, criam condições para que a autonomia do ser, seu eterno vir a ser, aconteça e transforme realidades, tidas antes como imitáveis..., perdidas.

Essa tríade mágica: amor, educação e autoconhecimento, pode transformar a pior forma impregnada em nossos ser, em algo belo, e pelo de sentido da vida.

Ela transforma velhos seres, em novas criaturas. Agem como o atelier do Ricardo.

A força da tríade processa para melhor os preconceitos, traumas e mágoas; além de lavar os corações encanecidos pela dor, culpa e luto.

Tornando novas, as velhas criaturas moldadas ao longo da vida e do viver pelos troncos feios e podres com os quais conviveram.

Prepare sua estrutura do ser para deixar-se novamente moldar, leve-se á prensa hidráulica da mudança, procure exemplos que em si carreguem o que realmente importa: a paz, a gratidão, a ética, a justiça, a bondade...

Leve-se ao “Atelier de Concreto do Ricardo”, procure um bom modelo para aprender com ele novas maneiras de agir e ser.

Caso ainda assim esteja difícil mudar, quem sabe não é a hora de ajoelhar e pedir ao bom Deus que interceda.

O Espírito Santo tem a força de milhares de prensas hidráulicas alterando seres já petrificados, formados, e endurecidos pela força do concreto e ferro da realidade do viver.

Peças já moldadas e secas, paras as quais o Atelier do Ricardo não conseguiria mais nelas imprimir novas peças. E que só restaria destruí-las para aproveitar a ferragem interior.

Mesmos essas peças, já prontas, Deus não as destrói. Ele converte água em vinho no coração delas, transmutando-as numa vontade de sentido em novas criaturas.

Mesmo que a madeira de lei de seu ser interior esteja cheio de sulcos, marcas, cicatrizes de pessoas ruins, sempre é tempo.

Desaprenda velhas lições e comportamentos e permita-se a um outro ser possível.

Os bons exemplos, a educação, o amor e a fé libertadora podem transformar pessoas e a própria humanidade.

Criando espaço fecundos em autonomia, valores, consciência crítica e agir político-cidadão, que nos libertarão de condicionamentos emocionais, ou os sócios históricos, que já não fazem mais sentido e nos empobrecem como coletividade.

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Quem quiser visitar a obra do Ricardo é só acessar: 

Arte em Concreto


Selfiar a Vida



Na pose para a foto da vida,
há momentos em que você 
precisa se lançar, 
para nela sair. 
Não deixe que te diminuam, 
joguem você ao lado,
e excluam a tua possibilidade 
de nela vir a sair.

Projete-se na vida 
com amor e vigor, 
carregando a ti mesmo,
irradiando teus valores 
e acreditando no teu potencial. 
Nem que seja aquele que te faz saltar, buscando uma possibilidade 
remota, num infinito de um clique. 
Num instante mágico, 
que poderá durar uma eternidade,
a vida voltará a ter sentido para ti. 
Lance-se nela, 
plante o futuro que almeja.
Aí, num dia sem nada especial, 
como quem chega do vazio, 
o sopro da mãe vida trará 
consigo o orvalho da manhã vindoura, 
que alimentará tuas raízes sequiosas 
e te fará renascer da dor. 
E, num instante mágico, 
tal o clique desta foto, 
a vida voltara a ter sentido 
e acontecer para você.

Mas, repito, lance-se nela!
E, tenha esperança, 
mesmo contra toda desesperança que teima em habitar teu ser.

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