Os 4 Portais da Saúde Emocional (Por Ricardo de Faria Barros)



Era um daqueles dias de sofrência emocional.
Sabe quando um monte de coisas chatinhas ocorre ao mesmo tempo?
Quem já não teve um dia desses, heim?
Contudo, deixando o estado de desânimo de lado, lembrei-me que eu precisava comprar a ração do cachorro.
Mas, quando cheguei ao carro, que estava estacionada na área externa do bloco, ao lado de um enorme vão-terraço sob pilotis que os prédios do Plano Piloto de Brasília possuem, não consegui dar partida no motor.
Meu cérebro parou um pouco de focar no modo preocupações, desviando a força dos pensamentos e emoções para uma cena de rara beleza, de profunda sensibilidade e intensa amorosidade que à minha frente acontecia.
Na mesma hora, registrei a foto, para não perder este momento e poder um dia compartilhar com vocês.
E é a fotografia que ilustra esta crônica.
Na qual, uma mãe cadeirante aposta corrida com seu filhote, ambos na maior alegria e algazarra.
Fiquei alguns minutos, contemplando aquela cena.
A mãe tocava potência na cadeira motorizada, e o filho ora corria para pegá-la; ora era a mãe que corria para pegá-lo.
Depois, ambos paravam e ficavam gargalhando com o resultado da disputa.
Que mãe resiliente e de bem com a vida, apesar das limitações!
Que filho amoroso e brincante com a sua mãe!
Um show, o show da vida, ali à minha frente!
Liguei o carro e parti pra minha agenda do sábado. Mas, não era o mesmo que tinha chegado àquele veículo.
Algo em mim mudou a polaridade emocional. Abri um sorrisão, contemplei as flores das Paineiras Rosas, sorvi cada aroma que entrava pelo carro. E, esqueci completamente do estado de sofrência.
Eu tinha acessado um dos quatro Portais para restaurar o tecido emocional, o de se alimentar de boas coisas.
Como assim, Ricardim?
Deixa-me me explicar melhor, usando a metáfora de nosso corpo físico e os cuidados para com ele.
Durante nossa vida, desde cedo vamos aprendendo cuidar de nosso biológico-físico. Seja na higiene básica, banho e escovação dos dentes, por exemplo. Ou a também, aprendemos a nos socorrer em dores, traumas, infecções, febres e ferimentos. Por exemplo, muitos têm nem casa um bolsa para compressas, um Band-Aid pertinho, e até analgésicos. Também aprendemos a nos alimentar, para podermos sobreviver adequadamente. Sabemos que precisamos de água, que sal em excesso faz mal, e que ninguém pode comer um prato de sopa cheio de açúcar, e que não se deve tomar um copo de óleo, como se fora um suco. Por último, em algumas situações, aprendemos que chegou a hora de intervir em nosso corpo: malhando em academias, mudando a cor e forma dos penteados, aplicando uma tatuagem, ou até colocando aparelhos ortodônticos.

Por que será que também não fomos aprendendo a cuidar da saúde de nossas emoções e pensamentos?

Creio que podemos usar a mesma metáfora do biológico e propor um modelo de quatro portais para este aprendizado para uma melhor saúde mental. Vamos a eles.

O Portal da Higiene Emocional – Na metáfora com nosso corpo, são nossos cuidados básicos de higiene pessoal. Este é um Portal muito legal que precisamos aprender a acessá-lo. Todos os dias vamos entrando em contato com sujeirinhas emocionais que vão se acumulando. Qual as sujeirinhas em nosso corpo. É um ressentimento ali, é uma ingratidão acolá. É uma palavra sobre nós que entrou errado, que não digerimos. É um medo sobre algo que tomamos conhecimento. Ou uma insegurança sobre alguém que conosco se relaciona. A Higiene Emocional ajuda a zerar esta conta de coisinhas chatas e não as deixar virarem "grude" em nossa alma. Quais são algumas habilidades e atitudes que fazem esta limpeza?

a) Não levar tudo a ferro e fogo. Dá um desconto, ter mais compaixão e empatia com o imperfeito, com o que não é o que esperava ser. Permite-se ao auto-perdão e se acolher como é, e com menos rigor. Intervir na criação de mágoas de estimação e não as deixar crescer.

b) Ter coisinhas que limpam as emoções e pensamentos sempre por perto. Bons livros, fotos, fé, amigos, músicas e filmes. Evocar estas coisinhas com regularidade.

c) Permitir-se a um banho de alma. Vez por outra. A, de forma ritualizada, dá uma incensada em si mesmo(a), levar-se para passear, colecionar pôr do sol, escrever algo bacana para alguém. Doar tempo e recursos para uma causa.

O Portal dos Primeiros Socorros Emocionais – Na metáfora que tenho usado, com o nosso corpo, são os cuidados que temos com ele quando algo o traumatiza, ou fere. Têm horas, na vida e no viver, que algo dá errado e nos fere. E, feridos que estamos, acabamos por ter nossas energias emocionais drenadas. Perdemos vitalidade e saúde mental. Todos os processos de luto e perdas causam ferimentos. Maiores, ou menores, mas causam. Expectativas mal resolvidas, também causam a ferida da frustação. Entregas não realizadas, do jeito que combinamos, causam a ferida da decepção. Ser passado para trás, em situações amorosas, pessoais, ou profissionais, podem causar a ferida do abandono. Ser desconsiderado, ou não valorizado, pode causar a chaga da rejeição. Ter feito algo, ou não feito algo, pode causar corte na alma que se chama culpa, ou arrependimento. Quais são as habilidades e atitudes emocionais podemos executar que ajudam a não infecionar estas feridas?

a. Apoio social. Quando estamos passando por um ferimento emocional, tendemos ao isolamento. Nós fechamos para todos e todas, e achamos que o tudo gira em torno de nós e para nos fazer mal. Então, nada como colocar nestas feridas uns band-aids de amigos e pessoal da família em quem confiamos. Procurar o apoio social.

b. Cura interior. Buscar instâncias terapêuticas de cura interior. Seja em apoio especializado, na área de saúde mental, seja nos processos de fé. Participar de retiros existenciais, fazer uma viagem de autoconhecimento, iniciar um novo projeto. Tudo isto pode abrir um espaço de cura interior.

c. Cutuque não! Temos a tendência de ficar remoendo o sofrimento, "catucando" a ferida. Se a dor é de amor, ficamos lendo velhas cartas, tão belas. Se a dor é de alguém ter pisado na bola para conosco, ficamos falando daquilo por semanas a fio, postamos nas redes sociais. E vamos alimentando o desejo de vingança e ódio. Faça isto não. Só vai ampliar, enrizar e reverberar mais ainda a intensidade da dor. Evite a ruminação do que deu ruim (Congeminação), intervenha em teus pensamentos e emoções. Brigue consigo mesmo(a), se ajude.

O Portal do Alimentar Saudável – Na metáfora que uso com nosso corpo, são os alimentos que consumimos que irão definir a qualidade de nossa vida, crescimento e energia vital. Em alguns momentos vamos consumindo muitas coisas ruins da vida. Notícias, fofocas, histórias de vida que deram errado. Tanto nos alimentamos do negativo, como vamos tendo uma predileção por este tipo de pauta, e até de pessoas. Consumimos coisas ruins, ouvimos coisas ruins, vemos coisas ruins e falamos de nossas vivências destacando o ruim. Então, a nossa alimentação emocional e dos pensamentos fica doente. E de tanto operar nas coisas erradas da vida e do viver vamos ficando murchos, a nos expor a tantas coisas pesada. Quais atitudes e habilidades podem nos alimentar melhor, do ponto de vista emocional e dos pensamentos, e nos fazer crescer - emocionalmente falando?

a. Seja um vigia da qualidade do que roda na tua mente. Fique de olho nela. Faça intervenções em si mesmo evitando a construção de crenças sobre si mesmo, sobre os outros e sobre a vida que comecem com as palavras Nada, Nunca, Ninguém, Tudo, Todos e Sempre, e os seus sinônimos. Permita-se ao contraditório do que anda pensando e sentindo. Se coloque em xeque. Pratique o que está contido no livro dos Filipenses, 4,8: "Tudo que é bom, amável, justo e digno de louvor, habite os teus pensamentos."

b. Tenha uma dieta de coisas boas pra consumir, fazer ou ver. Boas leituras, boas músicas, bons vídeos, amigos e grupos edificantes. Um pouco de poesia, uma boa fotografia. Ou momentos de contemplação, relaxamento e meditação, tal o que vivi ao ver a corrida de cadeira de rodas.

c. Faça um diário de três coisas boas a realizar, a ver, ou a sentir que fizeram para contigo, relembrando estas coisas antes de dormir. Pode até anotá-las. Module tua percepção seletiva para isto, tal qual uma meta de crescimento interior.

O Portal das Mudanças Estruturais – Na metáfora com o corpo, é quando fazemos uma intervenção radical nele, seja na cor do cabelo, seja na colocação de um aparelho dental. Em alguns momentos de nossa vida a roda gira. Entramos no carrossel do destino e sentimos que algo nos ocorre para o qual a vida de nós espera uma resposta. Muitas vezes nosso estilo de vida não faz mais sentido. Coisas que antes valorizávamos, que por elas mobilizámos recursos, hoje pode não ter mais sentido. Pode ser quanto à relação a dois. Na relação com filhos e amigos. Na relação profissional, ou familiar. São situações que pedem muita força de mudança, que “não dão mais para continuarem a acontecer, ou explode o coração...” Quais atitudes e habilidades podem nos ajudar a mudar, de forma estrutural?

a) Mude, mas mude devagar e sem perder o ritmo à frente. Toda a vida é feita de mudanças. Muitas coisas em nosso estado emocional, e na qualidade dos pensamentos, que nos aperreiam é derivada de mudanças que estão sendo adiadas. Faça um inventário de ônus e bônus da mudança que se quer e se mexa. No limite, só a você mesmo(a) é que deve satisfações.

b) Questione seus hábitos, e pesos que carrega, achando que os outros precisam dele. Muita coisa em nosso estilo de vida justificamos que fazemos pelos outros. Sem combinar com eles, sem saber se realmente eles querem isto. Ou se passariam sem aquilo. Então, terceirizamos para eles nossas escolhas, e com eles, acabamos por justificá-las. “A minha família não pode passar sem este almoço de final de semana que preparo para eles...”. Será? Quantos hábitos vamos inserindo em nossas vidas que são pesos, que são até como que prisões. E que podemos romper com eles e ser mais leve e feliz.

c) Rompa com o modelo de vida consumista e materialista, que torna tudo descartável e produtivo, fugindo de um contato e experiência mais intensa para consigo mesmo(a). Invista em temas e práticas de paz, ternura, amorosidade e emoções positivas. Participe de grupos com esta pauta, faça cursos. Saia de um modo de vida autocentrado, individualista, para um a proposta mais sustentável, mais coletiva, contribuindo para um bem maior. Seja participando da turma do pedal, da caminhada, do trabalho na Igreja, ou da ação solidária. Há mais vida ocorrendo lá fora, dos que a teimam, e insistem em querer que a vida gravite em torno deles mesmos(as).



São estes os quatro Portais para uma maior qualidade de vida emocional, que no meu entender funcionam muito bem. Cada um de vocês, que me leem ,devem ter outras dicas e práticas, neste sentido. E, o que funciona pra um, nem sempre funciona para o outro.

Mas, o importante mesmo, é começar efetivamente  a também cuidar de nossa mente, assim como fazemos com nosso físico-biológico.

 


2 comentários:

  1. Excelente texto, Ricardim. Parabéns e muito obrigado por compartilhar!
    Também me esforço muito para ter um outro modo de ver as coisas. Perdemos muito tempo em não fazer nada. Fazendo ou não o tempo passa. Aspectos emocionais e interiores estão sendo os desafios deste século. Um forte abraço! 🙏

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  2. Exatamente amigo, esta modulação cerebral exige esforço, intencionalidade e muita disciplina.

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