Balões ao Vento: Sobre a Vida que Permanece


O céu de Brasília tinha um tom de azul profundo, quase infinito, como se quisesse abraçar o Campo da Esperança em um gesto silencioso de conforto. A brisa vespertina sussurrava entre os galhos das árvores, espalhando pétalas que teimavam em florescer, mesmo em meio à tristeza. Era como se as flores soubessem que a despedida não era o fim, mas um recomeço. Lágrimas discretas escorriam pelos rostos, silenciosas, mas intensas, irrigando os canteiros de brevidades. Naquele campo sagrado, a eternidade parecia tocar o chão com delicadeza, enquanto o vento balançava suavemente os balões brancos que se preparavam para subir.

No Campo da Esperança, cada adeus era um sopro de saudade, e o vento se encarregava de levar as preces, os pensamentos e os gestos de carinho até onde nossos olhos não alcançam. Os balões, leves e flutuantes, carregavam consigo mais do que apenas ar: levavam histórias, sorrisos, abraços e toda a imensidão que Ronaldo deixava para trás. Não era apenas um ritual; era uma celebração da vida que permanece, mesmo após o último suspiro. Vida que se perpetua em legado, em afeto, em lembrança.

Sabe, Ronaldo, eu nunca tinha pensado em balões brancos como símbolos de despedida. Para mim, eles sempre foram sinônimo de festa: aniversários, formaturas, batizados, casamentos. Mas, naquele dia do seu adeus, eles ganharam um novo significado. Balões ao vento, subindo aos céus, também podem ser celebração da vida – da vida que não morre, da vida que deixa um legado e permanece conosco. E a sua é uma dessas vidas que não se apagarão.


Os balões brancos no céu celebravam sua entrega para a mãe-vida, em um estado de evolução contínua. Você evoluiu até o último minuto, Ronaldo. E só fez o bem. Agora, nos deixa um vazio imenso, pois sua presença transbordava alegria e fazia tanto bem a todos nós. Mas, olhando para o alto, eu tenho certeza de que você estará lá, entre as nuvens, sorridente, esperando um dia nos reencontrarmos.

Fiquei muito comovido com as inúmeras mensagens que seus colegas de trabalho compartilharam. Às vezes pensamos que o mundo corporativo é frio, impessoal, especialmente no relacionamento com os gestores. Mas você, Ronaldo, provou que pode ser diferente. Gerente de TI na ANABB, você mostrou que é possível liderar sem ser autoritário, sem ser truculento, sem perder a ternura. Na sua área, sempre tão exigida e cobrada, você conseguia manter a leveza. Sua presença zen e seu sorriso acolhiam a todos, quebrando o estereótipo do gestor distante e insensível.

Você, Ronaldo, era uma estrela rara no céu corporativo. Enquanto muitos profissionais antigos se tornam ranzinzas e descrentes, você permaneceu doce e amigo de todos. Em um curso de Psicologia Positiva que fizemos juntos, lembro como você participou com entusiasmo, provando que o coração também cabe na TI. Seu exemplo foi um alento para os colegas, mostrando que ser líder é, antes de tudo, acolher e incentivar.

Perto de você, todos ficávamos melhores. Sua casa, especialmente na época de São João, era um porto seguro de acolhimento e alegria. Você fazia questão de reunir pessoas, compartilhar histórias e fortalecer amizades. Até no ambiente de trabalho, sua capacidade de encantar e agregar pessoas fazia toda a diferença.

Eu queria balões no meu velório também, mesmo que seja depois da fogueira, mas não sei se merecerei tanto carinho. Hoje, aposentado, não tenho mais tantos colegas por perto como você tinha. Ainda me lembro da foto no Libanus, no encerramento do treinamento da ANABB em Psicologia Positiva. Naquele dia, planejamos tantas coisas juntos. Mas, pouco depois, veio a pandemia e o mundo entrou em compasso de espera.


Ronaldo, meu amigo, obrigado por tudo que você nos ensinou. Sua falta será sentida por aqui. Mas o legado que deixou sempre será inspiração. E, por favor, mande lembranças ao Papa Francisco, ao Mujica Pepe e ao Divaldo Franco. Agora vocês já podem jogar um carteado, porque formaram-se as duplas.

E quem disse que só existem poucos Ronaldos? Talvez a lição que ele nos deixa é justamente essa: cada um de nós pode ser um Ronaldo, doando paz, amizade e respeito por onde passar. Podemos ser aquele sorriso acolhedor, aquele abraço que conforta, a palavra que incentiva. A vida é curta demais para ser pequena, e Ronaldo nos provou isso. Que possamos inflar nossos balões da generosidade, soltar ao vento as amarras da indiferença e celebrar a vida, todos os dias, com a grandeza de quem sabe que amar é o verdadeiro legado. Até um dia, amigo.

Que o reencontro seja tão leve quanto os balões que te levaram, Ronaldo. Que o vento nos traga o sopro da tua paz, e que um dia possamos celebrar, juntos, o grande abraço que a eternidade promete.

E aqui, no Campo da Esperança, o canteiro de brevidades, irrigado pelas lágrimas, faz nascer frutos de amorosidades, que fortalecem a jornada dos que por aqui ficaram.

"A morte não é nada. Apenas passei para o outro lado do caminho. Eu sou eu, vocês são vocês. O que eu era para vocês, continuarei sendo. Me deem o nome que sempre me deram, falem comigo como sempre fizeram. Vocês continuam vivendo no mundo das criaturas, eu estou vivendo no mundo do Criador." Santo Agostinho

O Vigilante da Esperança e as Goteiras da Capela Sistina


Tem uma telha fora do lugar, e um pássaro alado, no telhado da Capela Sistina.

Na majestosa Capela Sistina, onde as obras de Michelangelo dançam sob o olhar atento dos fiéis e curiosos, uma goteira solene nos recorda a fragilidade das estruturas, tanto físicas quanto emocionais. Uma telha, solapada pelo vento, escorregou de seu lugar, permitindo que a água se infiltrasse, uma metáfora perfeita para as fissuras que surgem em nossos próprios sentimentos e pensamentos.

Perto da chaminé, um pássaro, incansável em sua vigília, parece ser um guardião da esperança. Ele pousa ali, como se soubesse que mesmo o mais belo dos templos pode enfrentar a erosão do tempo e das tempestades da vida. Sua presença nos lembra que, assim como as telhas, nossas emoções também precisam de manutenção. Não podemos permitir que as dificuldades nos tornem aborrecidos, rabugentos ou negativos. Precisamos, ao contrário, aprender com as pancadas que a vida nos proporciona.

Este pássaro, em seu voo gracioso, nos ensina a poetizar nossa existência, a olhar para a fragilidade humana com compaixão e misericórdia. É um lembrete de que não temos controle sobre tudo; os ventos da vida podem, a qualquer momento, deslocar nossas telhas emocionais. Assim, é imperativo que façamos revisões periódicas de quem somos. O autoconhecimento é a chave que nos permite evoluir e tapar as goteiras que ameaçam nosso bem-estar.

Por mais admirável que seja a versão de nós mesmos que apresentamos ao mundo, sempre há espaço para melhorias. Às vezes, é preciso que um olhar externo, um feedback amoroso, nos aponte as falhas que não conseguimos enxergar. Como é bom avisar ao Vaticano, por exemplo, que ali vem água, prestes a danificar o madeiramento do telhado. Esse gesto de cuidado é um ato de amor, tanto para com a estrutura física quanto para com nós mesmos.

A vida exige que não parem os aprimoramentos. Assim como um monumento grandioso, que requer atenção constante para preservar sua integridade, nossa essência também demanda carinho e revisão. Precisamos nos permitir olhar para dentro, aceitar a fragilidade e, a partir dela, construir um ser mais forte e resiliente. A cada goteira consertada, a cada telha realocada, encontramos um novo sentido, uma nova esperança.

Portanto, que possamos sempre lembrar do pássaro na chaminé da Capela Sistina. Que ele nos inspire a sermos guardiões da nossa própria esperança, a não temer as goteiras que aparecem em nossa jornada e a buscar sempre a beleza na fragilidade. Pois, a vida é uma obra de arte em constante construção, e o verdadeiro milagre está na nossa capacidade de renovação e crescimento.

Quando olhamos para um telhado antigo, a goteira que insiste em escorrer pelos cantos desgastados é um convite à revisão. Não é apenas um incômodo ou um problema a ser ignorado; é um sinal claro de que algo precisa de atenção, de reparo, de cuidado. As goteiras nos dizem que, por mais sólida que seja a estrutura, o tempo e as intempéries deixam suas marcas, revelando fragilidades. E, ironicamente, é por meio dessas fragilidades que enxergamos onde podemos melhorar.

Assim também acontece com as nossas vidas. As falhas que experimentamos — aquelas quedas inesperadas, os tropeços e os erros cometidos — são como goteiras em nossa estrutura emocional e cognitiva. Elas nos mostram onde existem vazamentos de autoconfiança, onde há rachaduras em nossa resiliência, onde a madeira do nosso caráter precisa de reforço. Ignorar essas falhas seria como tapar uma goteira com um pano: temporário e ilusório. Mas quando decidimos encará-las, entendê-las e, principalmente, aceitá-las como parte do nosso processo de evolução, abrimos caminho para o crescimento genuíno.

A aceitação das falhas é um ato de coragem. É reconhecer que, por mais que nos esforcemos, sempre haverá ajustes a serem feitos. Porém, esse reconhecimento não deve ser um peso, mas sim um incentivo à melhoria contínua. Assim como um telhado revisado e consertado resiste melhor às próximas tempestades, um ser humano que aceita suas falhas e trabalha nelas se torna mais forte diante dos desafios da vida.

A Goteira da Capela Sistina e a Manutenção da Alma


Há uma goteira no telhado da Capela Sistina. Ali, onde pincéis de séculos atrás traçaram o dedo de Deus tocando a criação, onde os afrescos desafiam o tempo e os olhares se perdem em contemplação, uma gota insiste em cair, lenta, persistente, um sussurro de vulnerabilidade em meio à grandiosidade.

Pode parecer um detalhe, um desvio quase insignificante no esplendor daquele lugar sagrado, mas essa goteira é um lembrete profundo da nossa condição humana. Por mais belas que sejam as obras que construímos — nossas vidas, nossos sonhos, nossas relações — elas estão sempre sujeitas aos ventos que afastam as telhas, à tempestade que desafia nossas estruturas. E é nesse ponto que compreendemos: precisamos de revisões periódicas do ser.

Assim como o Vaticano precisa saber que aquela gota insiste em cair, que a água aos poucos corrói a madeira, nós também precisamos ter consciência das nossas goteiras internas. Muitas vezes, acreditamos que somos versões acabadas de nós mesmos, como se o afresco estivesse completo e intocável. Mas, dependendo do ângulo de quem nos observa, há rachaduras que não enxergamos, falhas que o tempo revelou e que precisam de reparo.

Há uma beleza silenciosa em aceitar que não damos conta de tudo, que não controlamos os ventos que movem nossas telhas. Permitir-se ao autoconhecimento é abrir o telhado da alma, deixar a luz entrar, perceber onde há umidade, onde a estrutura está frágil. É ter coragem de aceitar que, por mais imponentes que sejamos, sempre haverá um ponto vulnerável — e que isso é belo.

Quando alguém nos avisa, com amor e cuidado, que há uma goteira em nós, é um gesto de graça. Como um peregrino que avisa ao Vaticano sobre o telhado, para que a história continue intacta, para que o legado permaneça. Não é crítica, é zelo. É amor que conserta.

E assim, seguimos em manutenção constante, impermeabilizando mágoas, trocando telhas quebradas de velhos traumas, alinhando as vigas da paciência, limpando as calhas do rancor. Porque evoluir é um processo infinito de reparo, onde cada goteira revelada é a chance de nos tornarmos mais inteiros, mais humanos, mais próximos da grandiosidade que habita em nós.

Se há uma goteira, que seja um convite para subir ao telhado da própria alma. Afinal, o que está por dentro também merece ser protegido da chuva.

A metáfora da goteira é poderosa porque ela não finge que o problema não existe; pelo contrário, ela o expõe. Da mesma forma, quando nos permitimos olhar para nossos erros com compaixão e lucidez, encontramos não só a oportunidade de corrigir o que está errado, mas também a chance de evoluir em aspectos que antes estavam ocultos. Cada falha, quando acolhida, é uma porta para o aprendizado.

Portanto, que possamos enxergar as "goteiras" da nossa existência com um olhar atento e um coração aberto. Que possamos identificar essas fragilidades não como um fim, mas como um começo, um convite ao aperfeiçoamento. Porque, no fim das contas, a evolução é feita de pequenos consertos, de revisões periódicas e de uma disposição permanente para sermos melhores do que éramos ontem.

Felicidades Mal Curadas


Hoje, acordei com dores de felicidades mal-curadas. Daquelas que o tempo não levou por completo, que ficaram presas nos cantos da memória, empoeiradas, mas vivas. Não doem como feridas abertas; ardem como um frio de outono que passa pela fresta da janela, lembrando que o calor do verão já se foi.

Lembrei de tantas dessas felicidades guardadas – aquelas que vivemos com a pressa de quem acredita que haverá outras tantas, em fila, esperando para serem sentidas. Era uma época em que achávamos que a felicidade era um estado permanente, um território vasto, quase infinito. Éramos tão jovens. Imortais em nossa ingenuidade. E fomos vivendo os dias como quem bebe água, sem sede, sem pressa, sem urgência.

A mesa cheia nos almoços de domingo, os sorrisos que se misturavam ao cheiro de comida caseira, as conversas atravessadas, a risada solta que fazia doer o estômago. Não sabíamos, mas aquilo era raro. Aquilo era felicidade pura, sem filtros, sem receios, sem o peso do tempo. Não soubemos guardar. Não soubemos prestar atenção suficiente.

Achávamos que as mãos que segurávamos estariam sempre lá. Que os abraços estariam sempre disponíveis. Que os olhares seriam eternos. Não sabíamos que o tempo viria, com sua marcha lenta e implacável, para nos mostrar que a maior parte dos dias é de luta, de preocupações, de rotinas apressadas. Só depois entendemos que aquelas felicidades eram exceções; pequenos milagres diários que passamos despercebidos, achando que eram apenas mais um dia comum.

Hoje, essas felicidades mal-curadas doem. E dói porque sabemos que não voltam. Porque sentimos que poderíamos ter vivido com mais intensidade, prestado mais atenção aos detalhes, aos cheiros, às vozes. Talvez se tivéssemos dado mais valor, segurado por mais um segundo, fechado os olhos para sentir mais profundo... talvez durassem um pouco mais.

Mas é isso o que elas fazem: voltam em forma de nostalgia, latejam no peito e lembram que o que foi vivido não pode ser remediado, apenas lembrado. São dores de uma felicidade que foi inteira, mas que, por falta de entendimento, ficou mal-curada. E talvez seja isso que as mantém vivas dentro de nós. Porque o que foi bem vivido, permanece; mas o que foi mal-curado, retorna sempre para doer de novo – e para lembrar que, quando a felicidade vier outra vez, saberemos que não é corriqueira.

Mas essas felicidades mal-curadas têm um propósito. Elas são um convite à gratidão pelo que ainda podemos viver. São um lembrete de que, mesmo que o tempo tenha levado alguns dias felizes, ele ainda nos oferece novas oportunidades de abraçar o que importa. Talvez de uma forma mais discreta, mais espaçada, mas ainda assim possível.

A maturidade nos ensina a identificar essas pequenas alegrias que, em outros tempos, poderiam passar despercebidas. O café quente numa manhã fria, o abraço de um amigo que chega sem avisar, o pôr do sol que pinta o céu de dourado... são esses pequenos milagres que, quando acolhidos com gratidão, preenchem os espaços vazios deixados pelas felicidades que ficaram para trás.

As felicidades mal-curadas são professoras silenciosas, que nos ensinam a amar mais devagar, abraçar mais demorado e agradecer mais intensamente. Porque agora sabemos que o tempo passa, que o vento leva e que as memórias são o que de mais precioso nos resta. E, se não podemos mudar o que já se foi, podemos sim, escolher viver o agora com mais presença, para que, no futuro, as felicidades não sejam apenas mal-curadas, mas bem vividas e eternamente lembradas.

Crônicas Anteriores