Entre Luzes e Silêncios: o Cuidado Emocional no Fim do Ano (Por Ricardo de Faria Barros)

 


Outro dia, uma mensagem me atravessaram o peito:

“Tenho sentido um aperreio na vida... o coração fica apertado. Quando vejo as luzes coloridas e as vitrines decoradas, dá vontade de dormir e só acordar no dia 1º de janeiro.”

Minutos depois, era minha mãe, de 87 anos, ao telefone:

“Ah, eu adoro essa época! Montar a árvore de Natal é meu ritual. Faço uma festa que dura dias e todo ano coloco um enfeite novo — um símbolo de esperança.”

Duas vozes. Uma que sofre e outra que celebra. Ambas convivem em muitos de nós. O fim do ano tem esse poder: desperta emoções contraditórias e igualmente verdadeiras. É quando o coração se lembra do que viveu, do que perdeu, do que poderia ter sido diferente. Mas é também quando a humanidade parece se enfeitar de luzes, gentileza e gestos mais suaves.

Chamo essa montanha-russa de sentimentos de SFAM – a Síndrome de Final de Ano Melancólica. Mas talvez seja apenas o eco natural da vida, pedindo uma pausa, um pouco de ternura e presença.
É a alma sussurrando: “Respire. Olhe para si. Acolha-se.”

A psicologia positiva nos lembra que não é preciso negar a tristeza para viver bem. Podemos abraçar o que sentimos e, ainda assim, escolher cuidar do que é bom. Podemos estar tristes e, mesmo assim, gratos. Podemos sentir falta e, ao mesmo tempo, reconhecer o que permanece. Podemos, sobretudo, olhar para dentro com compaixão.

É a hora de fazer um Kintsugi emocional.

Os japoneses têm uma arte antiga chamada kintsugi. Quando um vaso se quebra, eles o colam com ouro. As rachaduras não são escondidas; tornam-se parte da beleza. Assim somos nós: cada perda, cada despedida, cada melancolia pode ser colada com o ouro da experiência, do aprendizado, da ternura. O que se quebra pode se transformar em arte, e o que dói pode nos ensinar a amar de outro jeito.

E há outro lado nesse tempo do ano. Enquanto alguns vivem a saudade, há também os que vivem a alegria — montando árvores, reunindo famílias, preparando ceias. E não há contradição nisso: há humanidade.

O fim de ano é, de alguma forma, um convite universal para sermos mais humanos. Parece que o mundo inteiro fica mais sensível. As pessoas se permitem sentir, lembrar, perdoar. Permitem-se reaproximar, aceitar diferenças, abrandar julgamentos. Talvez porque o Natal, em seu sentido mais amplo, seja isso: um tempo de reconciliação com a vida.

Mesmo quando o coração está cansado, as luzes continuam acesas. Podem estar mais suaves, mais íntimas, mais lentas, mas estão lá, dentro de nós. As luzes do Natal também se acendem no interior do coração humano — ainda que pareçam tímidas ou apagadas. Elas falam conosco em outro tom, um tom de lembrança, de cuidado, de ternura silenciosa. E é essa luz que nos lembra que, apesar de tudo, a vida segue, pulsando em nós.

Alguns gestos simples de autocuidado neste período:

  • Respeite seu tempo. Não é preciso forçar a alegria nem se envergonhar da saudade.
  • Abrace o que sente. Emoções não se combatem; se acolhem.
  • Pratique a autocompaixão. Seja gentil com suas falhas, seus limites, sua história.
  • Celebre, se quiser. E, se não quiser, também está tudo bem. O amor não exige festa; apenas presença.
  • Deixe a luz entrar, mesmo que aos poucos. Ela está aí, esperando o momento de brilhar em você.


E agora, um convite especial: enquanto você cuida de si, lembre-se que ao seu lado pode haver alguém sofrendo em silêncio. Alguém que sumiu, que não dá mais notícias, cujo "Abrir presentinhos sozinha, mãe" era um pedido de socorro disfarçado.

Vamos fazer um mutirão do afeto?

Que tal resgatar quem nunca mais apareceu? Quem se isolou? Quem está entrando em sofrimento e acha que ninguém se importa?

  • Ligue para aquela pessoa.
  • Mande uma mensagem de verdade, não só um "Feliz Natal".
  • Faça-a se sentir vista, lembrada e amada.

Este pode ser o maior presente: a certeza de que ninguém vai soltar a mão de ninguém. O cuidado com o outro é também uma forma poderosa de cuidar de nós mesmos.

E para quem não gosta do Natal e Ano Novo?

Se para você esta época não traz nenhuma nostalgia boa, apenas obrigação, barulho ou a sensação de estar deslocado, saiba que seu sentimento é válido. Não há nada de errado em você.

O convite, então, não é para celebrar as datas, mas para honrar o seu próprio ritmo. Permita-se:

  • Ignorar a festa sem culpa.
  • Criar seus próprios rituais: um bom livro, um filme, um passeio na natureza, um dia de total quietude.
  • Desligar-se das expectativas alheias. Sua paz é o seu maior presente.

O recado de "respeitar seu tempo" e "abraçar o que sente" é, talvez, ainda mais importante para você. O verdadeiro espírito desta época pode ser, simplesmente, a permissão para ser exatamente como você é — com ou sem luzes.

O maior presente de fim de ano é tratar a si mesmo com respeito e bondade. É entender que tudo passa, que o amanhã pode ser mais leve, que há beleza mesmo nas marcas da dor.

O kintsugi do coração é feito assim — colando as fraturas com o ouro da esperança. O importante é que a colagem seja feita por suas próprias mãos.

E que, ao olhar para dentro, você reconheça: ainda há vida, ainda há amor, ainda há recomeço.

Que neste fim de ano, possamos ser artesãos de nossa própria paz e faróis uns para os outros. Porque no grande tear da vida, cada fio — de alegria ou tristeza — é precioso. E o mais belo mosaico humano é aquele feito justamente da coragem de quem se reconstrói, e da mão estendida de quem ajuda a costurar as partes quebradas.

 

🌦️ Crônica de Novembro – A Black Friday da Alma (por Ricardo de Faria Barros)

 



Novembro é o mês da véspera.

E eu não sei se você é como eu — desses que se alegram antes mesmo da festa começar. Que saboreiam o cheiro do pão antes do forno abrir, que sorriem só porque há algo bom vindo de longe. Novembro é isso: um prenúncio doce de que a vida ainda vale a pena esperar.

Há algo de profundamente humano nas vésperas. Elas nos lembram que a alegria também mora no “ainda não”. E novembro é o “ainda não” mais bonito do calendário. É quando o tempo começa a se despir das pressas, das culpas, das mágoas que acumulamos como folhas secas nos cantos do coração. É quando o vento muda o tom da alma, e as pessoas começam, sem saber por quê, a desejar o bem.

Como se toda a humanidade, instintivamente, fizesse uma Black Friday emocional.
Em novembro, ofertamos perdão a preço de custo. Distribuímos ternura em suaves prestações de empatia. Reeditamos nossa esperança em promoções de leveza. E o melhor: tudo gratuito.

É o mês em que os “bom dia” saem mais espontâneos, as mensagens são respondidas com mais afeto, e até os cães parecem abanarem o rabo com um pouco mais de gentileza. A vida, de repente, fica mais disponível.

Talvez seja porque as chuvas serôdias chegam — essas que caem quando ninguém mais acredita. Elas lavam o pó da secura emocional e irrigam, generosamente, as flores dos afetos adormecidos. Novembro é uma chuva tardia de coisas boas, um banho de energia positiva que nos prepara para o fechamento e a abertura de novos ciclos.

É tempo de trocar as mudas — as das plantas e as da alma. De renovar a pele das emoções. De reciclar o humor, o olhar, o sentir. É tempo de dizer: “Vamos lá, você consegue!”.

Novembro é esse intervalo sagrado entre o que já foi e o que ainda vem.
Um ensaio de esperança.
Um sorriso em estado de véspera.

E eu, que sempre gostei de finais que anunciam começos, só posso dizer:
Novembrei. 🌻

💫 Dicas para Novembrar:

🌿 1. Faça seu inventário emocional.
Antes que o ano acabe, abra as gavetas da alma e veja o que ainda precisa ser perdoado, deixado ir ou simplesmente aceito. Desapegar é o melhor desconto que a vida oferece.

🌞 2. Exercite a gratidão retroativa.
Olhe para trás e agradeça até o que não deu certo — talvez aquilo apenas tenha lhe redirecionado para um caminho mais luminoso.

🌼 3. Reative suas pequenas alegrias.
Novembrear é reconectar-se com o prazer das pequenas coisas: o café coado na hora, a flor que brotou sozinha, o abraço demorado, o pôr do sol que não cobra ingresso.

🌈 4. Reaproxime-se de quem importa.
Ligue, escreva, envie um áudio, um bilhete. A ternura precisa de voz. Em novembro, as relações florescem quando regadas com presença.

🍂 5. Plante algo — literal ou simbólico.
Pode ser uma muda, um projeto, uma nova rotina, ou uma promessa a si mesmo. Novembro é solo fértil para recomeços.

6. Colha o que cultivou.
Reconheça suas conquistas — as visíveis e as invisíveis. A cada passo dado, há um florescimento interno que merece ser celebrado.

💧 7. Tome seu banho de chuva afetiva.
Permita-se sentir, chorar, rir. Não seque as emoções. Elas também são formas de limpeza.

🎁 8. Faça do bem seu presente antecipado.
Doe tempo, atenção, gentileza. Novembro é mês de generosidade gratuita — o tipo de promoção que nunca deveria acabar.

🕯️ 9. Acolha o silêncio.
Entre um ciclo e outro, há um instante de pausa. É nele que a alma respira.

💖 10. Espalhe a leveza.
Sorria mais. Julgue menos. Cuide da própria vibração — porque quem novembreia bem, contagia o mundo com sua serenidade.

Novembrear é deixar-se chover por dentro — sem medo de molhar os sonhos.
É permitir que a ternura se instale nas entrelinhas da vida.
É dançar no compasso das vésperas, com o coração preparado para o que vem.

E quando dezembro chegar, com suas luzes e seus balanços, as pessoas que souberam novembrear não estarão exaustos — estarão serenos.
Porque aprenderam a viver o mês das transições como um convite à leveza e à renovação.
Saberão brindar a chegada do Natal não com o peso do que faltou, mas com a gratidão pelo que floresceu.

E assim, de alma lavada e coração esperançoso, seguirão adiante, colhendo o melhor que a vida oferece a quem tem coragem de viver com doçura as suas vésperas.
Porque, no fundo, novembrear é isso: continuar acreditando — mesmo quando o ano parece cansado — que o amor ainda é o maior presente da humanidade.

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