Era como se uma onda lenta e mansinha passasse por sob mim, e meu apartamento estivesse numa boia de mar.
Naqueles poucos segundos, conectei-me a uma força enorme, vinda das profundezas da terra, que com magnitude 4,0 atingiu Brasília em ondas sísmicas, oriundas de um terremoto na Bolívia.
O lustre da sala tremeu, como que a me saudar.
Estava no sexto e último andar de um prédio da SQS 205 Sul, em Brasília, e digitava um texto sobre a importância da liberdade, quando fui tomado dessa súbita emoção. Na hora pensei que estava tendo um desmaio, segurei-me na mesa. Depois, vi que o lustre da sala estava tremendo,e as janelas estavam fechadas, afinal chovia fininho.
Era um tremor de terra, pensei. Ou uma forte ventania. Fiquei uma fração de segundo imóvel, com medo do que viria a seguir.
Posso nunca ter visto um vulcão, ou os flocos da neve, ou até mesmo a beleza de uma geleira... mas das forças da natureza senti o balanço da terra, aos meus pés.
Naqueles segundos, confesso-lhes que não me veio a mente arrependimentos a arrepender, nem velhas mágoas não resolvidas, e ainda rendendo na poupança do coração.
Só me veio um único temor, partir sem dizer que amava aos meus. Mas, como tinha estado com eles recentemente, estava tudo ok.
Refeito do cagaço, liguei para a portaria e o Cláudio me disse que muitos desceram correndo as escadas, e por ali estavam.
Decidi ficar em casa mesmo. Botei um cafezinho pra fazer, uma boa música na radiola, e continuei o texto que escrevia, sobre as prisões que acabamos nos metendo na vida.
Um texto de uma mãe que voltava para a cadeia, vítima de uma uma prisão injusta por uma calúnia e armação, após os dias de Páscoa que passou com seu filho de 9 anos, cortava meu coração. Como a liberdade é um bem tão precioso, principalmente quando se lhes priva o amor.
Um outro relato de um pai, sobre as besteiras que seu filho anda fazendo, pelo excesso de álcool que vem consumindo, quase que diariamente, emocionava-me. Aquela luta daquele pai, do alto de seus 75 anos, para resgatar seu filho é um manifesto à liberdade.
Isto sim são terremotos. Terremotos emocionais que levam toda a família a estremecer junto.
Quem tem um(a) amado(a) preso, fica um pouco preso também.
Quem tem um(a) amado(a) doente pelo vício, acaba adoecendo um pouco também.
Botei uma xícara de café, e fui esperar um possível novo abalo vendo as plantinhas da varanda do quarto.
Eis que um beija-flor aproxima-se e beija as flores violetas que crio na sacada.
Ele nem reparou em minha presença, nem tampouco das prisões a que eu evocava, e num show de bater de asas mirava seu bico para cada vulva daquelas florzinhas, beijando-as com prazer e alegria.
Entregues ao momento estavam aquela flor e aquele pássaro. Um completava o outro.
Esqueci os tremores, esqueci as injustiças dos Homens da lei, esqueci a besteria de arruinar a vida com drogas, acordando pior do que ontem, e a cada amanhã, e deixei aquele passarinho entrar em meu ser.
Ele rodopiava. Ora mirava nas florzinhas que estavam mais abaixo da copa da plantinha. Ora nas que estavam ao lado. Ora nas que estavam acima.
Nenhuma delas ficou sem seu beijo de amor, que desafiava a natureza das coisas, dos dias, das pessoas e dos corações.
Creio que esse beija-flor que cumpre sua missão, de ao se alimentar polinizar florezinhas pelo beijo, é a expressão da maior liberdade a que possamos almejar.
Creio firmemente que ser livre é amar. Uma mãe que ama seu filho, ao dele se despedir para voltar às celas, não está presa.
Um pai que chora por seu filho que não consegue vencer o álcool, não está preso a esta sina e saga.
O amor que eles expressam é o mesmo do beija-flor, que alheio aos tremores nas árvores, prédios e pessoas, aquele que assustou a tantos naquela manhã, continuava sendo belo e grande.
O amor não nos deixa desistir diante dos tremores que a vida nos dá.
O amor nos impulsiona ao impossível, nos torna imortais, nos faz depositar nosso melhor pólen naquele que é o sujeito de nosso amor.
Como aprendi com meu pequeno JG, o amor nos torna lendários, no sentido de eternizar raros momentos, tais quais as cartas lendárias de seu álbum de figurinhas.
Temos uma força enorme dentro de nós que nos impulsiona ao outro, em todas as formas de amor, inclusive na solidária empatia junto aos mais necessitados.
Falei de dois relatos de prisão que tive, nesse final de semana, e da liberdade do amor de seus envolvidos.
Também tive um relato que muito me comoveu nessa Páscoa, finalizando essa tríade a que compartilho.
Meu sobrinho, o Artur, aluno de medicina, participou de uma missão, no estilo Médicos Sem Fronteiras, numa cidadezinha do Tocantins.
Ele veio diretamente da rodoviária, para o almoço de Páscoa do domingo, recém-chegado dessa missão.
E nos contava o que puderam fazer junto às populações muito carentes e humildes. Cada caso que resolviam, era motivo de orgulho para todos aqueles voluntários, tão jovens.
Mas, cheios de idealismo, de amor ao próximo, de vontade de fazerem com esse mundo algo melhor do que com ele encontraram.
Todas as formas de amor, e de amar, são expansão de nós mesmos.
São libertadoras.
Desafiam o impossível.
Criam possibilidades.
Confrontam a natureza das coisas a que muitos teima em acreditar que: "são como são, não mudam".
Quem ama revoluciona ambientes, pessoas, destinos e a si mesmo.
Elas são fontes de propósito.
E, este talvez seja este o maior apelo da Páscoa: lutar pela libertação dos cativos, e com a força do amor. Não desanimar da missão de beijar as flores, de esperançar outras vidas em pólens vadios, mesmo em meio aos tremores do arriscoso e fecundo processos de existir.
Naqueles poucos segundos, conectei-me a uma força enorme, vinda das profundezas da terra, que com magnitude 4,0 atingiu Brasília em ondas sísmicas, oriundas de um terremoto na Bolívia.
O lustre da sala tremeu, como que a me saudar.
Estava no sexto e último andar de um prédio da SQS 205 Sul, em Brasília, e digitava um texto sobre a importância da liberdade, quando fui tomado dessa súbita emoção. Na hora pensei que estava tendo um desmaio, segurei-me na mesa. Depois, vi que o lustre da sala estava tremendo,e as janelas estavam fechadas, afinal chovia fininho.
Era um tremor de terra, pensei. Ou uma forte ventania. Fiquei uma fração de segundo imóvel, com medo do que viria a seguir.
Posso nunca ter visto um vulcão, ou os flocos da neve, ou até mesmo a beleza de uma geleira... mas das forças da natureza senti o balanço da terra, aos meus pés.
Naqueles segundos, confesso-lhes que não me veio a mente arrependimentos a arrepender, nem velhas mágoas não resolvidas, e ainda rendendo na poupança do coração.
Só me veio um único temor, partir sem dizer que amava aos meus. Mas, como tinha estado com eles recentemente, estava tudo ok.
Refeito do cagaço, liguei para a portaria e o Cláudio me disse que muitos desceram correndo as escadas, e por ali estavam.
Decidi ficar em casa mesmo. Botei um cafezinho pra fazer, uma boa música na radiola, e continuei o texto que escrevia, sobre as prisões que acabamos nos metendo na vida.
Um texto de uma mãe que voltava para a cadeia, vítima de uma uma prisão injusta por uma calúnia e armação, após os dias de Páscoa que passou com seu filho de 9 anos, cortava meu coração. Como a liberdade é um bem tão precioso, principalmente quando se lhes priva o amor.
Um outro relato de um pai, sobre as besteiras que seu filho anda fazendo, pelo excesso de álcool que vem consumindo, quase que diariamente, emocionava-me. Aquela luta daquele pai, do alto de seus 75 anos, para resgatar seu filho é um manifesto à liberdade.
Isto sim são terremotos. Terremotos emocionais que levam toda a família a estremecer junto.
Quem tem um(a) amado(a) preso, fica um pouco preso também.
Quem tem um(a) amado(a) doente pelo vício, acaba adoecendo um pouco também.
Botei uma xícara de café, e fui esperar um possível novo abalo vendo as plantinhas da varanda do quarto.
Eis que um beija-flor aproxima-se e beija as flores violetas que crio na sacada.
Ele nem reparou em minha presença, nem tampouco das prisões a que eu evocava, e num show de bater de asas mirava seu bico para cada vulva daquelas florzinhas, beijando-as com prazer e alegria.
Entregues ao momento estavam aquela flor e aquele pássaro. Um completava o outro.
Esqueci os tremores, esqueci as injustiças dos Homens da lei, esqueci a besteria de arruinar a vida com drogas, acordando pior do que ontem, e a cada amanhã, e deixei aquele passarinho entrar em meu ser.
Ele rodopiava. Ora mirava nas florzinhas que estavam mais abaixo da copa da plantinha. Ora nas que estavam ao lado. Ora nas que estavam acima.
Nenhuma delas ficou sem seu beijo de amor, que desafiava a natureza das coisas, dos dias, das pessoas e dos corações.
Creio que esse beija-flor que cumpre sua missão, de ao se alimentar polinizar florezinhas pelo beijo, é a expressão da maior liberdade a que possamos almejar.
Creio firmemente que ser livre é amar. Uma mãe que ama seu filho, ao dele se despedir para voltar às celas, não está presa.
Um pai que chora por seu filho que não consegue vencer o álcool, não está preso a esta sina e saga.
O amor que eles expressam é o mesmo do beija-flor, que alheio aos tremores nas árvores, prédios e pessoas, aquele que assustou a tantos naquela manhã, continuava sendo belo e grande.
O amor não nos deixa desistir diante dos tremores que a vida nos dá.
O amor nos impulsiona ao impossível, nos torna imortais, nos faz depositar nosso melhor pólen naquele que é o sujeito de nosso amor.
Como aprendi com meu pequeno JG, o amor nos torna lendários, no sentido de eternizar raros momentos, tais quais as cartas lendárias de seu álbum de figurinhas.
Temos uma força enorme dentro de nós que nos impulsiona ao outro, em todas as formas de amor, inclusive na solidária empatia junto aos mais necessitados.
Falei de dois relatos de prisão que tive, nesse final de semana, e da liberdade do amor de seus envolvidos.
Também tive um relato que muito me comoveu nessa Páscoa, finalizando essa tríade a que compartilho.
Meu sobrinho, o Artur, aluno de medicina, participou de uma missão, no estilo Médicos Sem Fronteiras, numa cidadezinha do Tocantins.
Ele veio diretamente da rodoviária, para o almoço de Páscoa do domingo, recém-chegado dessa missão.
E nos contava o que puderam fazer junto às populações muito carentes e humildes. Cada caso que resolviam, era motivo de orgulho para todos aqueles voluntários, tão jovens.
Mas, cheios de idealismo, de amor ao próximo, de vontade de fazerem com esse mundo algo melhor do que com ele encontraram.
Todas as formas de amor, e de amar, são expansão de nós mesmos.
São libertadoras.
Desafiam o impossível.
Criam possibilidades.
Confrontam a natureza das coisas a que muitos teima em acreditar que: "são como são, não mudam".
Quem ama revoluciona ambientes, pessoas, destinos e a si mesmo.
Elas são fontes de propósito.
E, este talvez seja este o maior apelo da Páscoa: lutar pela libertação dos cativos, e com a força do amor. Não desanimar da missão de beijar as flores, de esperançar outras vidas em pólens vadios, mesmo em meio aos tremores do arriscoso e fecundo processos de existir.
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