Não foi apenas uma Pirarara, foi amor. (Ricardo de Faria Barros)
“Aviz Júnior, depois quero uma foto tua e de teu pai (sr. Aviz) com um peixe, para eu usar nas minhas palestras sobre longevidade feliz”. 3/8/2019
Fiz este comentário num post de uma foto que o Aviz Júnior publicou no Face, documentando uma nova pescaria que faria com o seu pai.
Dessa vez, a pescaria tinha como destino um rio em Rondônia, e fariam uma surpresa ao Aviz pai, levando na viagem um de seus netos, e um outro filho.
Considero o Aviz Júnior um de meus melhores amigos e por um bom período de tempo, lá no BB, trabalhamos juntos. Hoje, ambos somos aposentados. E ambos, eu e ele, decidimos não nos aposentar da vida.
Acompanho estas pescarias dos Avizes (rs) há uns cinco anos. Tem ano que meu amigo se desloca de Brasília pra SP umas duas vezes, para levar seu papai para pescar. Inclusive para bons pesqueiros na América do Sul.
Ele me diz que faz isto por amor, que não é obrigação. Embora tenha que deixar a sua esposa sozinha aqui em Brasília, eles negociam estas saídas como prova de amor. A Shirley ainda está na batalha do trabalho formal. Shirley, incentiva estas aventuras de pescaria com o seu sogro. A isto chamamos de amor, amor de cumplicidade, de parceria e companheirismo.
O Sr. Aviz faleceu recentemente, um mês após chegar da viagem de sua última pescaria.
Tive acesso a um vídeo de sr. Aviz, dias antes de embarcar para sua última pescaria, a de agosto de 2019. Ele estava todo feliz ao saber que o seu neto iria também, além de dois filhos, Aviz Júnior e o seu irmão. Então, ele cantou para o neto a música que o inspira, quando sai pra pescar, e que nunca entra na jangada sem antes cantá-la. Cantou com voz firme, entoado, no ritmo e muito emocionado. A música é Mucuripe:
"Aquela estrela é dela
Vida, vento, vela, leva-me daqui
As velas do Mucuripe
Vão sair para pescar
Vou levar as minhas mágoas
Pra as águas fundas do mar
Hoje a noite namorar
Sem ter medo da saudade
Sem vontade de casar."
De forma predestinada, naquele vídeo, ele deixou documentado que precisamos seguir nossa jornada da vida, com o vento, e aprumando as velas...
Ganhei minha foto que pedi, e a usarei com carinho, já na semana que vem numa palestra que darei na Itaipu. Na foto que Aviz Júnior me mandou, seu pai pesca uma pirarara, cumprindo um dos objetivos desta pescaria, um peixe por ele muito cobiçado e nunca antes pescado.
Se Aviz Júnior não tivesse ido pescar com o pai em agosto como estas cenas ficariam nas memórias afetivas dele e família?
Se Aviz Júnior não tivesse sido este filho exemplar, que apoia incondicionalmente os pais na velhice, a que velhice estaria destinado o seu pai? Será que ele sozinho iria para dispendiosas, e ousadas, do ponto de vista logístico, pescarias?
Sabe Aviz Júnior, você nos inspirou e inspira. Todos nós que temos pais já velhinhos nos sentimos motivados a seguir teu caminho.
A reservar alguns dias do ano para ir visita-los e sair com eles para fazer algo legal.
Se tivéssemos o mesmo carinho que temos com animais que chegam a velhice para com os nossos pais idosos seria tão bom.
Ontem, vi uma vizinha passeando com a sua cadela, de 12 anos, e no braço. Pois, ela não consegue mais andar e tomar sol. Ela foi proporcionar uma das coisas que sua cadela mais gostava, acompanha-la nas caminhadas pelas entre-quadras aqui de Brasília. Doze anos num cachorro equivalem a 84 no ser humano. Será que fazemos este mesmo ato com nossos pais idosos?
Será que temos o espírito do Aviz Júnior de proporcionar momentos de intenso prazer a eles.
O espírito de quem nos últimos anos visitou o pai a cada três meses, deslocando-se uns 1..300 km, de Brasília para São Paulo.
Na maioria das vezes nos fixamos em um monte de muletas para não fazer isto. Dizemos que estão velhos para saírem. Que não gostam. Que estão muito frágeis. Que demandam cuidados médicos. Etc, etc. etc.
E vamos deixando eles mofando em suas casas, ou em abrigos. Quando muito os visitamos, achando que isto basta. E são visitas rápidas, de quem tem algo a fazer depois. Logo nos aborrecemos com o “tédio de uma casa de idosos”, ou com suas conversas antigas - mil vezes repetidas, ou com algumas doses de sincericídios que idoso nos prescrevem.
O Brasil está envelhecendo. Daqui a alguns anos ter um pai com 80 anos será super normal. E não podemos deixa-los à margem de nosso viver.
Precisamos de filhos cuidadores. Eles não desistem de seus pais, mesmo não recebendo deles, muitas das vezes, palavras amistosas. E, não fazem isto por obrigação. Como bem me disse o Aviz Junior, fazem-no por amor.
Nossos pais gostam de conhecer coisas novas. Também querem se divertir, relaxar. Eles dizem que não querem. Que não podem. Que não têm saúde. Etc. etc. etc. Desconsiderem.
Eles querem. Só não querem dar trabalho e não podem gastar $. Por nos amarem, eles dizem que não querem se divertir, que preferem ficar onde estão.
Recentemente enfrentei momentos tensos junto aos meus pais de 82 e 81 anos. Papai precisava de cuidados médicos, e passei uma semana por lá. Nesta semana, não deu para ir pra praia, mas deu para botá-los no carro e fazer uma rota pela vizinhança da cidade de Campina Grande-PB, num horário em que o dia estava bem fresquinho, e em estradas vicinais que cruzavam pequenas propriedades rurais. Num determinado trecho paramos o carro, para apreciar as flores da Jurema Branca, e sentir seu perfume que encanta de tão gostoso.
Quando é que terei a oportunidade novamente de levar meus pais para turistar pela roça?
Quanto isto me custou? Nada. Só o querer. Só mover uma montanha para convencê-los a entrar no carro e comigo partir. E foi uma delícia de passeio, de umas três horas.
Aprender a cuidar e ter empatia pelos nossos pais nos torna melhores. Desenvolve em nós as competências do capital psicológico positivo (esperança, otimismo e resiliência), bem como as da inteligência emocional (empatia, relacionamento interpessoal, capital social).
Fazer um turismo de aventura com os pais idosos, abrindo uma brecha na tão sobrecarregada agenda de filhos que ainda trabalham, ensina muito mais sobre gestão, comportamento humano e liderança do que muito treinamentos comportamentais.
Sr. Aviz pai, obrigado pela foto que fez pra mim e mandou pelo seu filho. Com certeza, o senhor foi um exemplo edificante de uma longevidade feliz e plena de sentido.
Aviz Júnior, meu amigo, obrigado pelas mais de 8 pescarias que fez com teu pai, ao longo destes cinco anos. Tu nos inspira a procurar as nossas próprias pescarias com os nossos pais.
Brisa, obrigado por não desistir de tua ranzinza mãe. E, continuar dando amor.
Papai e mamãe, em janeiro iremos conhecer o Projeto do Peixe Boi Marinho.
Arruma a mala aí!
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Parabéns pelo texto, Ricardo. Penso que cuidar de pais idosos seja tarefa tão natural aos filhos quanto cuidar de filhos pequenos é atribuição dos pais. Quando mãe ou pai se recusa a cuidar de um filho ou abandona-o, a sociedade se revolta com a atrocidade contra um incapaz. E quando o inverso acontece? Um idoso dependente é tão vulnerável quanto um bebê, ou seja, não tem condições de se alimentar sozinho, de se vestir sozinho e de defender-se. Nem de ser feliz sozinho ele consegue.
ResponderExcluirNote que a dependência a que me refiro não é simplesmente material, mas sobretudo espiritual.
Perdi meu pai muito cedo. Daria tudo para poder pescar com ele, como fazia Azis Jr. A vida quis de outro jeito. Mas não dispenso sempre que posso comer a galinha guisada com purê de batatas que minha mãe prepara só para lembrá-la de que ninguém nunca fará uma comida tão gostosa como aquela.
É rua de mão dupla. Sei que ela é dependente de meu elogio sincero para seguir seu caminho em paz. E isso me faz bem.
Amor tudo resolve.Deus é Amor. Lindo texto,belas histórias.
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