Era dia de final do torneio de futebol Sub-10, um campeonato
interescolar do qual você participava.
Estávamos muito ansiosos. Cada um por suas razões. Você por
atuar no gol. Eu, por ser pai de goleiro, que só perde em aflição pra mãe de
juiz, antes do VAR.
Chegamos bem cedo, umas duas horas antes, e você disse que
iria treinar com os colegas.
Fiquei no carro ouvindo música, esperando mais um pouco para
ir torcer, já que o jogo só começaria 19h30.
Pelas 18h30, encostou outro carro ao lado do nosso. Dele,
saiu um menininho, de tua idade, mas com o padrão de outro colégio. Puxei
conversa com ele, perguntando se iria jogar contra o teu time. Ao que a mãe dele,
toda orgulhosa, disse que não. Que o seu filho iria disputar o terceiro lugar,
na outra final. Ahh, esclareci então que
o teu jogo era a disputa do primeiro lugar.
Teu jogo começou e o resultado não nos foi favorável. Embora
você tenha defendido muitas bolas, de tanto eles tentarem conseguiram fazer
dois gols. E, o ataque de teu time não conseguia passar do meio do campo.
Na hora da premiação, parte dos teus amiguinhos choravam.
Você estava de cabeça baixa. O técnico distribuiu as medalhas de segundo lugar
para os pais presentes, e eu tive a honra de te premiar com uma delas.
Tentei te animar, mas vi que era melhor te deixar quieto, na
tua sofrência.
Por uma das coincidências da vida, ao retornarmos para nosso
carro ao nosso lado também retornava o menininho do estacionamento e sua mãe.
Vi que no peito dele estava a medalha de terceiro lugar. Cumprimentei ele, ao
que fui correspondido com um sorrisão do mesmo, que era todo alegria. Nem me
fale da mãe dele, que não se cabia em tanto orgulho.
Voltamos silenciosos. Então, te perguntei qual dos dois
times venceu mais partidas durante o campeonato. Se o teu, ou o dele. Tu fez as contas e chegou a conclusão que
ambos. Só que em momentos diferentes. As
vitórias do teu time, o percurso que trilhou, permitiu chegar ao 2 lugar. A do
outro time, permitiu chegar ao terceiro lugar.
Mas, parece que o time que consegue a medalha de bronze vibra
mais do que o que perde a de ouro.
Não é?
No de bronze, fica o sabor da vitória. E valorizam ter chegado
ao pódio.
No de prata, fica o desgosto da derrota. E desprezam ter
chegado ao pódio.
Esta metáfora vale pra nossa vida. Temos esta característica
também, de desvalorizar os feitos ao longo da jornada. Assim como tu esqueceu todas as vitórias que
te levaram chegar ao segundo lugar, também esquecemos as nossas.
Basta que algo de ruim nos ocorra, num fechamento de um
ciclo, numa transição, que pegamos aquela cena e a extrapolamos para todo o
conjunto de nosso viver. Ampliando, ecoando e reverberando a intensidade daquele
sofrer.
Vamos dizer que em tua carreira você progrediu em 10 anos
por cinco níveis, sendo três neles na carreira técnica e dois na carreira
gerencial. Aí, tu vai participar de uma seleção para o próximo nível da
carreira gerencial, e não passa na entrevista.
Aí tu passa um tempão de tua vida com esta mágoa remoendo
teu viver. Tu fica ruminando a seleção que não passou. Esquecendo as vitórias
que já teve e o lugar que já chegou.
Do mesmo jeito que tu ficou em relação ao segundo lugar.
Esquecendo que o segundo lugar é melhor que o terceiro.
Se tu pode aprender algo é esta lição. Nada na vida é para
sempre. Nem a alegria, nem a tristeza.
A vida não pode ser medida como quem mede uma safra de
inverno. A vida precisa ser avaliada numa perspectiva temporal maior, e sempre
em referência social, para poder ser contextualizada.
É preciso intervir no processamento cerebral, modulado para sintonizar
no negativo, sempre que algo de ruim ocorrer que possa querer tirar o brilho da
jornada até então percorrida. Focando com força na cena atual que não é boa,
que causa desprazer, mas perdendo de vista as anteriores, que num somatório
causam tanto orgulho em teu existir.
Isto é arte. Exige treino. Nessa sociedade somos treinados
para sermos os melhores, maiores e mais fortes. Uma sociedade que diz que o
segundo lugar é do primeiro perdedor. Uma sociedade que não perdoa o fracasso,
e que vive querendo nos iludir com promessas de prosperidade a todo custo, com frases
ditas desde a infância:
“Você é o mais demais de todos...”
“Você merece tudo!”
“A natureza conspira para você, é só mentalizar.”
“Você é o cara e logo vai arrebentar!”
Filho, você não é demais de todos. Não merece tudo Não adianta
mentalizar, não funciona assim, precisa se esforçar. E nem vai arrebentar logo,
e talvez nunca.
Mas, mesmo assim, pode encontrar a paz, o sentido na vida,
se sentir bem em ser quem é, sem precisar viver personagens para ser aceito.
Verá que nem todos ganham, e que perder faz parte do processo
de aprendizado. E, que muitas vezes, aquilo que almejava tanto, talvez não
tivesse sido tão bom para ti.
A vida vai nos ensinando isto, pouco a pouco, mas é preciso estar na frequência
certa, para aprender isto.
É preciso aprender a carregar menos fardos. Deixar de perseguir
um estilo de vida insustentável, cheio de ambição, inveja e cobiça.
O preço disso é a nossa saúde emocional. E é um preço
caríssimo.
Então, da próxima vez que ganhar uma medalha de prata,
valorize-a.
Lembre-se que do ponto de vista do pódio, ela está mais no
alto do que a de Bronze!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário é uma honra.