Cartas ao JG – Frases Que Aquecem Corações (Por Ricardo de Faria Barros)


Ontem, eu e meu filho saímos para jantar em Brasília. Ele se chama João Gabriel, tem 13 anos, e é o meu quarto filho. Após um brinde, de suco de laranja e um chope, ele me perguntou se eu podia ajudar-lhe numa tarefa da escola. Falei que faria com prazer, caso eu soubesse como.

- Filho, qual a tarefa?

- Pai, a professora pediu ao nosso grupo que elabore 4 frases que aqueçam o coração.

Faíscas de emoção brotaram de meu coração. Afinal, este tipo de tarefa vale para a vida. Desenvolve humanidades. Curioso, perguntei do ponto de vista de quem o coração ficaria aquecido.

- Aquecido como, meu filho? O coração de quem fala a frase? Ou, o de quem a escuta?

JG, demorou a responder. E saiu com um:

- Não sei pai, a professora não falou.

E, não era para falar mesmo. Minha pergunta é besta. Afinal, quando se fala uma frase de aquecer corações, ela aquece a ambos. Emissor e receptor, não é mesmo?

É um movimento recíproco de soprar brasas cardíacas-emocionais, tanto para quem a ouve, tanto para que lhe profere.

Não é mesmo?

Creio que foi intencional que a professora deixou nas entrelinhas isto.

Engraçado que na manhã deste dia, eu revirava um HD antigo, atrás de vídeos e textos para usar em um novo curso. E, não tive como deixar de rever antigas fotos e vídeos de minha vida.

E, não foram as fotos e vídeos de coisas, paisagens, comidas e passeios os que mais mexiam comigo. Os que faziam aquecer meu coração com aquelas saudosas memórias.

Eram os registros nos quais tinham pessoas no enquadramento das fotos e vídeos.

Relembrá-las iluminou meu ser. Pessoas aquecem nosso coração. O outro importa. Mas, não tem como construir uma frase assim.

Disse pra o JG ligar o gravador do celular dele que eu iria falar. Que seriam frases para ele, que ele escutasse no futuro, tal qual eu fiz ao revirar aquele HD antigo.

O futuro do JG é algo que me preocupa, visto que para esse meu quarto filho sou como um pai avô, do alto de meus quase 58 anos.

- Grava aí, JG.

Frase 1 – “Eu confio em você”.

Como é bom escutar alguém dizer isto para a gente. É ou, não é? Na maioria da vida o JG não vai ouvir muito esta frase. Pois estamos perdendo empatia social. E, só fala este tipo de frase quem se interessa e confia na outra pessoa. Coisa que tem ficado mais rara. Desejo, meu filho, que durante tua jornada muitas pessoas confiem em você, e expressem esta confiança.

Frase 2 – “Foi mal, me perdoa, eu pisei na bola contigo”.

Admitir que erramos e tentar restaurar relacionamentos é tão importante. Uma verdadeira fogueira de afetos positivos incandesce o coração de quem pede perdão e de quem o acolhe. Está todo mundo cheio de razões. Muito agressivos e individualistas. Admitir que nossas atitudes e comportamentos podem ter magoado os outros é algo de muita sabedoria. Pois vai nos desenvolvendo. Sabe filho, você poderá machucar pessoas, até sem querer. Ou por omissão, ou por confusão mental, ou por não saber bem avaliar o impacto de teu ser na vida dos outros, ou até por irresponsabilidade afetiva. Mas, aprenda a voltar atrás. E oferecer uma chance à paz. Se a outra pessoa aceitará, não sei. Só sei que o coração dela e o teu ficarão mais aquecidos, com o simples gesto, caso verdadeiro, de pedir desculpas.

Frase 3 – “De que você está precisando, eu posso te apoiar?”

Eita que frase bacana de ouvir, e de falar. Ninguém se basta sozinho, e um galo sozinho não faz uma manhã, como diz o poeta João Cabral de Melo Neto:

“Um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue, se vá tecendo, entre todos os galos.”

Na vida, precisaremos de pessoas. E, esta postura de ajuda, de se colocar presente na vida do outro e tentar torná-la mais fácil, menos áspera e árida, é bênção. O coração de quem ajuda fica aquecido e o de quem é ajudado. Sabe filho, não se nivele por um mundo no qual ninguém mais ajuda ninguém. Seja um subversivo, um revolucionário, indo contra esta sociedade tão narcisista, tão eu, eu, eu, eu, e se coloque como um nós. Como coletivo, tendo consciência das necessidades e expectativas das pessoas. E tente atendê-las. No que for possível. Esteja atento às pessoas, todos nós estamos muito sozinhos. E, muitos não têm a quem pedir socorro, sofrem calados. Esteja atento a estas pessoas, e seja um porto seguro para elas.

Frase 4 – “Muito obrigado, eu sou grato pelo que você fez”!

Esta frase é como dormir com um amado cobertor de orelha, naqueles dias bem frios. Sentir e expressar gratidão constrói coletividades sadias. Hoje todo mundo acha que merece tudo. E vai ficando cego às coisas boas que lhe ocorrem, e que só foram possíveis porque existem pessoas. Vamos ficando com os olhos opacos da indiferença e deixamos de reconhecer e valorizar as pessoas que tornam nossa vida melhor. Valorizar nosso colaborador. Valorizar nossa família. Valorizar a pessoa com a qual dividimos a jornada da vida. Valorizar os amigos. Valorizar a diarista, o lavador de carros, o copeiro, o zelador, o porteiro, o motorista do carro de aplicativo. Valorizar a vida que temos, mesmo não sendo nem sempre a que pensávamos que teríamos. Sabe filho, nunca seja ingrato. A gratidão é um músculo. Ela precisa ser treinada, para que não fique flácida, e sem mais potência e ação. Treine os músculos da gratidão nas pequenas coisas. Com um olhar perceptivo da vida sob este prisma. Filho, uma atitude de gratidão, de sentir e expressar gratidão, te fará muito bem. E, não espere que façam isto para contigo. Pois, cada vez farão menos. Faça sem esperar retorno, nem retribuição. Valorize por saber que o que ocorreu foi importante para você. As pessoas estão tão carentes de serem reconhecidas que cada vez que você fizer isto elas ficarão muito felizes. Lembro que recentemente pedi a um garçom que chamasse o chef, caso ele pudesse vir. Minutos depois, vi um senhor alto e com toda pinta de chef se dirigindo à minha mesa. Observando-lhe pude sentir seu medo, preocupação e ansiedade, que eram explícitas. Então, disse-lhe que o jantar estava excelente, que eu nunca tinha comido um bobó de bacalhau, e que adorei. Ele abriu um sorrisão, estendeu a mão e deu aquele aperto de mão de quem está feliz. E, soltou uma frase que marcou minha noite: “Ufa, geralmente quando me chamam é para reclamar: do tempero, do coentro, do sal, da textura, da temperatura...”

Então, meu filho JG, não seja mais um que chama o Chef para reclamar. Procure ter olhos para ver: a graça, a bênção, o bom, o belo e o virtuoso. Pois, o ruim, a desgraça, o caos, as decepções, as perdas, o que falta, e o que não saiu como esperava já lhe será dado, neste início de século XXI, tão involuído.

E você que me lê, quais seriam tuas 4 frases? Coloca nos comentários desta postagem.

  





5 comentários:

  1. Obrigada prof, por compartilhar tanta sabedoria!

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  2. Quanta sensibilidade e afeto 🥰 esse legado importa para esse século tão hostil

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  3. Gostei bastante do desafio que seu filho lançou e, mais que isso, de sua carinhosa e inteligente abordagem.

    Não sei se aquece corações, mas fico comovido quando escuto alguém falar em público para outra pessoa, de forma genuína, frases curtas como estas:
    “Me ajuda!”
    “Vacilo meu. Você tem razão!”
    “Bença?!”
    “Preciso de você”.

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  4. Fiquei muito feliz em encerrar o feriado com um afago literário. JG com sua tarefa de escola, aqueceu o coração dele, provavelmente o da professora, o do pai dele e o meu.

    Acredito que ninguém ajuda o outro sem ajudar a si mesmo. Valeu grande Ricardo, excelente reflexão, ilumina nossa mente e aquece o coração. Acredito que o JG terá êxito na sua tarefa. Grande abraço.

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