Nem sempre perder é perder; ou ganhar é ganhar.

Outro dia Leni me abordou no trabalho com um adaptador de tomada na mão. Daqueles que ajudam a plugar equipamentos no padrão antigo. Com os olhinhos brilhando ela disse-me: Ricardim, dá uma crônica a importância de um adaptador na vida das pessoas.
Fiquei olhando para ela e para aquele objeto e entendi o sentido que ela queria apresentar.
Leni chegara há uns meses para trabalhar conosco. Por toda uma vida fez carreira nas agências do BB. Esse ano passou a trabalhar numa outra realidade, saindo da ponta do negócio para uma área de estratégica de TI.
Quando ela chegou, tudo deu errado com sua posse. 
Chave não acessava os sistemas, computador travava, senha de telefone bloqueada, acesso a rede sendo negado... Todos os dias, a doce e sorridente Leni chegava com um problema diferente.
Aos poucos ela foi vencendo um a um, a ponto de agora fornecer consultoria rsrs.
No início ficava apreensiva com o volume de serviços, com pedidos desencontrados, com demandas prioritárias das prioritárias se acotovelando.
Com um estilo de liderança que valoriza a autogestão do processo produtivo, que não fica em cima, que confia no potencial e deixa o outro ir desabrochando aos poucos.
Ela ficava doidinha comigo. Rsrs
Lentamente ela foi adaptando-se, ao estilo de liderança, à equipe, aos serviços.
Temos dentro de nós esse plug adaptador. Todos temos.
Mas é preciso saúde emocional para ativá-lo. Nem sempre estamos a fim de bancar o risco e pagar a conta.
E, tem certas coisas que se adaptar a elas é morrer um pouco a cada dia.
Portanto, esse adaptador funciona para umas situações de vida pessoal ou profissional, para outra o que funciona mesmo é o bocal-macho.
Mas o que é o bocal-macho. Calma que te explico.
O bocal-macho é um artefato que numa ponta é um soquete de lâmpada (um bocal) na outra é um plug de energia, daqueles que mais parecem um garfo.
Se tivesse um prêmio de inovação para o setor elétrico com certeza esse objeto estaria bem na fita.
Ele consegue transformar qualquer ponto de energia num ponto de luz. 
Se for conectado a uma extensão, teremos uma gambiarra portátil super útil. 
Então, algumas situações pedem que nos transformemos. 
Pedem mudança na nossa natureza. Não pedem adaptação.
São situações bocais-de-garfo-de-energia. 
Nas quais mudar e juntar duas coisas transformando-as numa terceira coisa, fruto da sinergia das originais é preciso.
No jargão popular, dizemos: fazer do limão uma limonada.
Então vim para casa com o adaptador e aqui no armário encontrei meu bocal-garfo.
Deixei-os à vista e fiquei feliz.
Ali, à minha frente, duas peças que resumem a trajetória humana: adaptação ou mudança dialética; ou ambos numa composição harmoniosa.
E quem se adaptar muda. Muda a si mesmo diante da realidade.
Adaptação é uma forma de mudança. 
Quem transforma adapta-se. Toda transformação carrega em si o gene da adaptação. É uma resposta.
Então as coisas são E e E. Tem casamentos que precisam de adaptação. Um mudar em relação ao outro, aos filhos. 
Tem casamento que precisa de transformação, de um basta, pensemos na situação-limite de uma mulher que é agredida por seu esposo.
Ou de uma mãe que vê seu filho sendo consumindo pela droga e que precisa agir.
Adaptar, renunciar, mudar, transformar são notas de uma mesma partitura da bela composição da vida e do viver. 
Importantíssimas para nossa evolução. 
Sem adaptação não aprendemos. Sem mudança não alteramos rotas e cursos de ação.
Tem muita gente por aí mal resolvida, desajustada, com crise de adaptação.
Tem muita gente por aí que se diz bem resolvida, adaptada, mas que no fundo é mesmo um cagão de um medroso. 
Tem muita gente por aí que mudar por mudar, sem consciência crítica, sem avaliar consequências.
Tem muita gente por aí que muda para melhorar, para crescer, mesmo que doa. Mudar dói.

Somos essa “muita gente”. Temos em nós adaptação e desadaptação. Mudança e estagnação.

Encontrar o tom é o segredo do bem viver. A dose de um ou de outro será o que fará a diferença. Mas, para isso tem que ouvir a consciência.
Tem que buscar o autoconhecimento. Fazer as perguntas filosóficas eternas:
Quem sou? O que quero ser? O que me agrada? O que me desagrada? O que me aprisiona? O que me liberta? O que gosto? O que não gosto? Qual sentido de minha vida? Quem é importante em meu viver?

Tem que ter a coragem de vez por outra fazer essas perguntas e optar, e escolher, e intuir se o que não está pegando mesmo não é a falta de adaptação, de flexibilidade, de aprendizado.
Ou será que o que está pegando não é justamente a vontade de mudar, de renovar-se, de transcender e romper velhos modelos.

A decisão é nossa!
A escolha também. 
Não há receitas, não há prescrições, fórmulas.
Que para um funciona, para o outro nem tanto.
Só sei que no limite, independente de fé, o Papa Francisco está certo. Como diz minha amiga Fernanda: Quando há reflexão, autoconsciência, humildade e respeito à coletividade (há quem queira que todos ao redor mudem para que os outros se adaptem a ele) é menos doloroso se adaptar.
Só não vale à pena se adaptar se for pra ceder às pressões de uma sociedade perversa. Nesses casos, o pensamento de Arnaldo Antunes é o melhor conselho: "Será que eu falei o que ninguém dizia? Será que eu escutei o que ninguém ouvia? Não vou me adaptar"

Desejo que você, adaptando-se ou movido pelo desejo de uma transformação radical, do tipo daquela do bocal-garfo que fundiu a característica de um bocal de luz à de um plug (garfo) de energia; transformando o objeto final numa outra coisa - fruto das duas, esteja sempre em paz consigo mesmo. Mesmo diante de decisões difíceis, caminhe sempre na verdade, ética e justiça. “É preciso coragem para ser feliz”. Ou como diz André, um amigo precioso, amar é decisão.

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