Para uma vida mais feliz, precisamos diariamente tomar um AAS. (Autor Ricardo de Faria Barros)

Na noite anterior, eu e o JG (João Gabriel) fizemos os preparativos para uma viagem até Goiânia-GO. Eu iria palestrar no Hospital das Clínicas da UFC, e aproveitaria para passear com o JG que está de férias.
Malas arrumadas, check-list feito, material da palestra conferido, power-point na nuvem e no pendrive. Agora era a hora de dormir.
No outro dia, acionamos o WAZE e o JG assumiu a navegação.
Pegamos a BR 060, com trânsito intenso de ambos os lados, contudo no sentido de Brasília a intensidade era dobrada.
Aos poucos, conseguimos atravessar os trechos mais lentos e galgamos os piores 20 km do trajeto, agora restavam 180.
Mentalmente começo a conferir o check-list.
Escovas, pente, desodorante? Ok. Material palestra, cartões e livros? OK.
Paletó? Xiiii, esqueci!
Esqueci a mala do paletó, e na que levava, só havia bermudas e camisetas. Pegamos o primeiro retorno, e voltamos, agora enfrentando um verdadeiro caos que é a chegada da BR 060 para Brasília.
JG mangava e sorria de meu esquecimento. Eu, nem tempo pra ficar bravo tinha. Dado a atenção que precisava focar no trânsito.
Chegamos em Goiânia esbaforidos de calor, já pelo meio dia e tanto. Ao entrar na cidade nos perdemos, mesmo com o WAZE, e o JG morria de rir com a voz dizendo: “Recalculando Rota”.
Finalmente chegamos ao Hotel, que fica na movimentada Avenida Anhanguera. Desfizemos as tralhas, pedimos um UBER, melhor assim, e nos dirigimos para um clube antigo da cidade, que tem um monte de atrações e piscinas, o Jaó. Eu tinha tempo, a palestra seria no dia seguinte.
Chegamos no JAÓ e fomos barrados na entrada. Ocorre que eles não têm mais o serviço de day-use. Aquele que pagamos uma taxa pra usufruir determinado local, por um dia. A informação que acessei num site de turismo estava desatualizada.
Eu e o JG nos entreolhamos, suados e decepcionados. Então, da portaria mesmo, decidimos ir almoçar numa das maravilhosas churrascarias de Goiânia. Chamamos o Uber e quando ele perguntou pra onde, botamos o nome Churrascaria, aparecendo as mais próximas primeiro. Escolhemos uma com nome estiloso, a La Pampas.
Após dois cancelamentos, finalmente o terceiro Uber aceitou a corrida e nos resgatou, uma meia hora depois. Esperada na calçada e no mormaço.
Silenciosos, cansados e com fome esperávamos ansiosos desembarcar na La Pampas.
E isto ocorreu. Só que ao nos dirigirmos à porta de entrada, percebemos que a mesma estava fechada. E, pela poeira e papeis jogados por baixo da porta, já fazia uns meses.
Seguimos para o hotel, e já era perto das 15 horas. Perguntamos à atendente se tinha almoço, e ela nos falou que como hotel era pequeno, o serviço de restaurante já estava fechado, só estando disponíveis o de lanches rápidos.
Aí, olhei para JG e apontei para a pequena piscina, de águas azuis convidativas, e sem pestanejar mergulhamos nela. Primeiro iriamos matar o calor e o suor, depois ver o que iriamos afina comer.
Nem 5 minutos se passaram, e eis que nuvens carregadas se aproximam, trovões espocam ao longe. Aí começa a pingar e saímos de dentro d´agua, por precaução. JG gargalhando dizia: “Que dia, heim pai!”
Eu respondia, pelo menos estamos no hotel. Poderíamos ter pago caro no JAÓ e estarmos agora tendo que sair das piscinas.
Nos enxugamos, e quando preparávamos para ir ao quarto, uma senhora se aproxima. Ela pergunta se queremos almoçar. Alegres, respondemos que sim.
Ela disse que é a cozinheira e que soube de nossa fome. Que poderia fazer uns bifes com arroz e uma salada para nós, e em menos de 30 minutos. Topamos na hora. E ficamos emocionados com o gesto dela. E, foi o melhor bife com arroz que comi na vida. E o JG idem. Aliás, nunca vi o JG com tanto apetite, nestes dez anos que já fez. Vagando em mil pensamentos, processando o dia, saquei que na vida, para ser mais feliz, muitas das vezes, é preciso aceitar, acolher e seguir caminho, sempre que algo não ocorre conforme planejamos.
Fiquei com aquilo matutando por muito tempo. Aceitar. Acolher. Seguir. Lembrei que as iniciais destes verbos formam o acrônimo do AAS, santo remédio infantil. Um AAS curava tudo. Chamávamos, à época, de Melhoral infantil.
Acho que ela está muito certa. Precisamos de um AAS diário para ter uma vida de mais harmonia, bem-estar, paz e felicidade. Vejamos mais um pouco do que se constitui este AAS existencial:
A de Aceitar. E este é o primeiro Portal da transformação do ser, em sua jornada de crescimento. Aceitar nosso corpo. Aceitar que não ganhamos todas. Aceitar que as pessoas nem sempre são o que esperávamos que fossem. Aceitar nossa família. Aceitar que os filhos não nossos bens. Aceitar nosso trabalho. Aceitar uma doença crônica que nos sobreveio. Aceitar que amores se vão. Aceitar nossa posição social. Aceitar que dias ruins ocorrem. Aceitar que não temos controle sobre tudo. E que algo, mais cedo ou mais tarde, poderá sair diferente do que esperávamos.
A de Acolher. E este é o segundo Portal, que se só se chega a ele após atravessar o do Aceitar. Acolher a dias cinzentos. Acolher momentos de luto. Acolher partidas e despedidas. Acolher o que pensa diferente. Acolher o outro em sua essência, para além das aparências. Acolher aquilo que em nosso colo cai, sobre e o que nada podemos fazer, nada podemos mudar, a não ser a nós mesmos, diante daquilo que nos ocorreu. Acolher é uma postura contemplativa diante da vida. Não é de acomodação, nem alienação. É de gratidão. Gratidão por dias bons, por dias ruins. Gratidão, apenas por viver. Quem acolhe se abre à gratidão.
S de Seguir. E aqui temos o terceiro Portal, que na verdade é um caminho. Que só se chega até ele depois dos anteriores: Aceitar e Acolher. Seguir caminho. Refazer-se juntando os mil cacos. Fazer germinar novos sonhos, semeados em terreno irrigado com as mil lágrimas choradas. Seguir é fechar as janelas de mágoa, culpa, ressentimento e sofrer e não olhar ais para trás. Perder o vício de ficar sempre olhando pelo retrovisor da vida, lamentando-se do que deixou pra trás, do que perdeu, do que não viveu. Seguir é postura dos sobreviventes. Dos fortes e corajosos. É preciso muita força de espírito, muito ânimo, para ousar seguir um novo caminho. Mas, seguir preciso. Não é possível crescer ficando na posição de vítima, desilusão ou decepção com o viver. É preciso fornecer respostas à vida, no lugar de ficar apenas esperando respostas dela, e a isto chamamos de seguir o caminho.
Aceitar, Acolher e Seguir, são nosso Melhoral existencial. Uma vida mais feliz e prazerosa passa por estes verbos de posturas ativas tão sábias. Aprendendo eficazmente, e com inteligência emocional positiva, a lidar melhor com situações adversas, a enfrentar momentos tensos e a se relacionar com as quebras de expectativas, imprevistos e fatalidades, como um paletó esquecido, um clube para nós fechado, uma churrascaria falida e trovejadas que nos expulsam da piscina.

Na foto, o JG pulando na piscina, antes do temporal chegar.

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