Escutatória



Eu não sei o que você acha, mas para mim, o celular, telefone e a internet com seus emails, janelas de comunicação, possibilidades infinitas de interação e construção coletiva de significados são grandes companheiros. Outro dia ouvi no rádio umpastor divulgando a página do FB de sua igreja, conclamando os irmãos a curtirem, comentarem e compartilharem. Novos tempos. Voltemos ao velho e bom telefone. Quem já esperou um telefonema que poderia trazer notícias boas? Aquela espera pela ligação da pessoa amada, ao lado do aparelho, é uma viagem, não é? Como é bom ouvir o toque deste maravilhoso aparelho! Como é bom saber que alguém nos telefonou! É aquela sensação ímpar de que somos aceitos e lembrados. Telefone encurta distâncias e ameniza a convivência com a ausência. E é de ser ouvido que gostaria de falar.

Sempre tive uma agradável sensação de que não há melhor psicólogo do que as manicures. As manicures são "psicólogas da vida” por excelência. Elas interagem com seus clientes, ouvem suas estórias e histórias.

É esta capacidade de ouvir e ser ouvido que habilita o ato comunicativo. Você já percebeu como está difícil ouvir. Que não existe aulas de escutatória. Quando o outro começa sua fala a gente já se inquieta, já fica ansioso para intervir, ou "dar conselhos". Isto quando a gente está ligado...


Nosso descaso com o discurso do outro é tremendo. Enquanto ele fala, nós divagamos. Mantemos uma pose de escuta mas, no fundo, estamos noutro espaço, tempo e movimento.

Como perdemos a capacidade de ouvir criamos justificativas tais como :" Hoje não! É que não tenho tempo. " As manicures são sábias em ouvir. A cada semana, recebem seus clientes, e acolhem suas histórias de vida. Sem falar no toque de mãos. Ah! o toque, como é importante. Bloqueamos o toque e não damos expressão à afetividade, hoje em dia quase não damos e recebemos afagos. Tudo é tão mecânico que quem ousar romper este cerco é tido como "artista" - " Ah! Ele é assim tão carinhoso porque faz teatro"(pasmem!)

Acho que nossos ouvidos também podem ser afinados. Afinar os ouvidos é perceber a linguagem, às vezes escondida nas entrelinhas. É captar, exercitando a percepção integral, mais que os sons que nos rodeiam: o canto dos pássaros, o vento que sopra, o sapo que coaxa, captar os cantos das abelhas na dança do pólen. Porém, se não conseguimos mais ouvir nem os sons que brotam do diálogo, como é que podemos ouvir os que nossa mãe natureza expressa?

Não captamos o que o outro comunica verbalmente, imagine na multiplicidade de sua linguagem não verbal ! E quando nos damos ao luxo de ouvi-lo é sempre um ouvir carregado de ansiedade, de intervenções. Queremos intervir para abreviar a fala, dar conselhos e já falarmos de nós. Afinal, aprendemos a girar em torno de nosso próprio eixo e deixar o outro mergulhar em nós é violentar-nos.

Nossa incapacidade de ouvir gera um abismo entre nós e o outro.

Afinar nosso sentido da audição leva tempo. Aprender a arte do diálogo é tarefa difícil, exige treinamento e atenção para com o próximo.

Exige antes de tudo respeito.

É tão bom ser ouvido.

Você tem com quem desabafar?

Alguém pede emprestado "seu ombro" e contigo descarrega suas dores?

Se isto não acontece, não será que é você que está fechando os canais da comunicação?

Vamos aprender com as manicures. Aprender a construir relacionamentos mais verdadeiros, nos quais tenhamos a certeza de que podemos ser para o outro um porto seguro, sem ansiedades, sem olhares apressados no relógio, sem bocejos. Respeitando e ajudando este ser que, talvez dilacerado, procura em você um apoio e uma amizade.

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Créditos foto - APAE Magalhães Almeida-MA

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