Lares Útero


Andando pelo jardim vi no meu limoeiro esta cena insólita. Uma reunião de lagartas numa folha de limão. Saquei logo da máquina e documentei o encontro, mais parecido com uma procissão. Elas estavam paradas, pensativas. Umas poucas levantavam o focinho em minha direção, como que a dizer: sai daí rapá! Fiquei matutanto o porquê delas terem escolhido aquela folha. O que aquela folha teria de tão especial? Sim, é verdade. Dei uma batida no limoeiro e em nenhuma outra folha havia aqueles espécimes. Só naquela, e frente e verso. Umas 20 em cada face. Estariam com frio? Sentiriam-se protegidas? Fora sua mamãe quem as mandou ficarem ali? O que tinha aquela folha de tão especial? O que a distinguia das outras? Engana-se quem pensou que elas estavam degustando a folha. Não, nem um pedacinho sequer. Estavam apenas sentindo-se amparadas. Fiquei lembrando que também somos assim. Escolhemos nossas folhas-útero dentre várias que se nos achegam. Existem lares-folha-útero-de-limoeiro. Lares que de tão acolhedores aproximam, unem, celebram a vida e são locais de ajuntamento. Conheço alguns. O de minha cunhada e irmão, o de minha ginecologista (é o casal quem engravida), e outros Brasil afora. Eles são como esta folha, locais de encontro, de harmonia, de delicadeza. São lugares para onde vamos e nos sentimos bem, amados, reconhecidos e valorizados. Ali, nos juntamos com tribos das mais diversas, e naqueles lares parece que há uma mágica, uma mística que consegue tudo juntar e nele ser presença, sem destoar, mesmo que sob sua face-folha frequentem tribos das mais diversas estirpes. Mistérios, mistérios da mãe natureza que nos falam. Sempre que receber alguém aqui em casa vou lembrar que posso ser folha-útero. Proteção, carinho, aconhego para quem chega. Qual o destino daquelas lagartas, que por medo do desconhecido juntam-se umas às outras para enfrentá-lo? A vida, a vida é o seu destino. Viver é juntar-se. Viver é comungar valores, criar solidariedades, buscar empatias, tecer uma tribo comum, que nos faça sentido. Quem se junta, até na dor, sofre menos. Ou sofre com, e quem sofre com, dilui o sofrer. Esta foto é uma homenagem aos amigos que de tão acolhedores representam ponto de encontro e mutação em nosso viver. Bem aventurados vocês o são! Obrigado por nos abrigarem em suas vidas.

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