Vidas Editadas



Tem dias difíceis de pegar o fio da meada e recomeçar. Dias que tudo se avoluma, tudo preocupa, tudo agita, tudo parece tão grande que não daremos conta. Dias de ressaca existencial. Dias nos quais ao folhear um Best Seller qualquer de auto-ajuda parece mais uma coleção de piadas de duvidoso gosto.

O sol brilha menos. As mulheres parecem malvadas. O canto dos pássaros incomoda. Dias de infeção emocional.

Dias que gritam em nosso ser que não conseguiremos superar os desafios. Dias de pânico, de tristeza, de angústia. Na vida editada, postada no Facebook, eles não aparecem. Por aqui não há lugar para postar aperreios. E eu compreendo.

Recebi um pedido de socorro de um leitor de meu blog, o bode com farinha. Para ele escrevo nessa manhã dizendo-lhe, calma, tambéem passamos por isso.

Só não divulgamos ou escrevemos como você. Mas também temos medo, temos crises, temos momentos de revolta, daqueles que algo entrou errado em nosso sistema operacional. E que, para sobreviver, precisaremos restaurar nosso sistema à configuração anterior. Tenho dias assim. Só evito postá-los. Então caro amigo virtual, minha vida não é mais feliz que a sua. Minha vida também tem momentos trevas, momentos de impotência. Por analogia, JG, meu quarto filho de quatro anos nem sempre está sorrindo. Tem dias de birra, muitos dias de birra. Só edito os momentos dele e prefiro, opto, por escolher seus melhores momentos para compartilhar.

Quem tem filho birrento e vê as fotos do JG pensa que com ele é diferente. É nada. Tem dias que ele está um porrinho. Vidas editadas são parecidas com aqueles melhores momentos de um jogo de futebol, que tarde da noite são passados em algumas emissoras. Vendo aquele taipe achamos que o jogo foi maravilhoso. Vendo-o na sua integridade percebemos que houve momentos monótonos, chatos, de pouca expressão futebolística. Assim é com nosso viver.

Então deprimidos do mundo todo, tristes dessa manhã, infelizes por qualquer dor interior... calma!

Você não está só! Todos temos problemas parecidos. Todos temos nossos monstros interiores, imaginários ou não.

Uma coisa me ajuda, quando vivo esses momentos de TPM interior. Penso que meu espírito está malhando numa academia existencial. Que as pancadas, as dores, os sofreres e o luto, estão queimando calorias da minha alma e me tornando mais forte para as próximas batalhas. Não me apresso para sair da angústia. Também não a alimento. Deixo que ela evolua, como uma infecção emocional. A própria vida possui os antibióticos para curá-la. Eles estão nas pessoas que gostam de você. E, um belo dia, ao se olha no espelho você voltará a sentir prazer em fazer a barba, em botar um perfume, em se sentir bonito. Verá flores em cada calçada. Extasiará-se com o canto dos pássaros. Todas as mulheres lhe serão bondosas. Dias de júbilo. E, entre a angústia e o júbilo, componentes do mesmo fio do qual é feito o tecido do viver, vamos avançando no precioso processo de amadurecer.

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