Somos Ipês


Andar por Brasília nos meses de agosto,setembro e outubro é como andar num jardim de belas flores, e a céu aberto. Logo cedo dá pra sentir o orvalho da esperança anunciando mais um dia azul anil. As florezinhas do Cerrado, alegres e sapecas, vão se vestindo para nos receber na ante  sala da vida.

É terapêutico passear pelas suas largas avenidas, olhando as diversas espécies que aqui foram plantadas, quando de sua instalação. Cagaita, Cambuí, Pau de Rosas, Canafístula,Cássia, Quaresmeira, Sapucaia, e os estonteantes Ipês.

Os Ipês são quase um patrimônio do Distrito Federal. Quem mora aqui, pode regular o ciclo de sua vida pelas suas floradas. No auge da seca, e da baixa umidade, quando respirar em Brasília fica doentio, eles chegam para nos ajudar a suportar as adversidades do tempo. Primeiro, chegam os Rosas. Depois, os Amarelos. E,agora, os fugidios Brancos. Os brancos passam somente 15 dias de florada. São geniosos. Quem não os fotografou ainda, que se cuide, amanhã poderá ser tarde demais. Acho que os Ipês, nas suas várias espécies e tonalidades, falam de amor.

Os que vão de rosa à lilases brotam no final de julho, inicio de agosto. Eles nos remetem ao amor das paixões, das tesões, da buscas infinitas por algo que nos tornem imortais. Falam de uma vida cor de rosa,uma vida boa,prometida, alegre, uma vida que emerge no "tom de rosa choque". Falam da delicadeza, dos encontros com amigos e das primeiras descobertas afetivas. Eles falam de uma amor ao eu. Um amor de autoestima. Um amor de saber o que nos faz bem e feliz. Um amor de encontros consigo mesmo, de formação de identidades.

Os de flores amarelas revelam sua magnifica do final de agosto para o setembro. Para mim, eles representam os aprendizados com as experiências vividas. O amarelo da sabedoria, do discernimento, do sentido da vida que vamos pulsionando nosso ser. O amarelo das escolhas, escolhas que nos amarelam pelo medo de assumi-las. O amarelo nos encanta, pois sedimenta as paixões, acalma o coração. Eles falam de um amor ao outro. Aos filhos, parceira(o) afetiva(o), aos amigos mais próximos. Um amor de criação de vínculos. Agora eu sei com quem sou feliz. E, quero ficar perto deles, na sombra de ipês amarelos.

Agora, em pleno setembro, chegam as arredias flores dos Ipês Brancos. Eles conseguem manter suas pétalas brancas, mesmo com altas doses de fumaça e poeira no ar. Pessoas sobem os acostamentos para os contemplarem. Outros, divulgam em suas redes os pontos melhores para sua observação. Eles trazem o branco da harmonia, da tolerância, da paz. Eles nos remetem às nuvens, aqui na terra, "venha a nós o Vosso Reino". Eles falam de um amor de nós, um amor à humanidade, a todos os povos e culturas. Um amor de pertencimento a uma causa maior: a causa da coletividade. Um amor de cidadania. Já não somos eu, tu... agora viramos nós - nos vários grupos que nos afiliamos e nos representam.

No dia do Cerrado(11/09), o ciclo das flores dos Ipês nos ensinam a não parar o nosso crescimento interior.

A semear mais ipês rosas onde faltar a paixão. E, nos lugares em que nos perdemos de nós mesmos, achando que somos pequenos demais para existir: rosa neles!

A cultivar mais ipês amarelos, a nos alertar que sem os outros não somos pessoa. Quem sem os amados nossa vida fica sem sabor e encanto. Somos os elos que criamos com aqueles, para os quais, viver vale a pena.

Por último, as floradas dos ipês no Distrito Federal, na exuberância dos ipês brancos, grita a cada esquina que a vida é breve. Que precisamos de tempo para delicadezas, afetos e subjetividades do ser. Tempo para as coisas do Alto. Tempo para o autoconhecimento, tempo para nos afiliarmos a uma causa. Eles nos convidam à contribuição, para edificarmos um outro mundo possível. Melhor do que o encontramos. Impossível ficar ao lado de flores tão frágeis, que desafiam o mês mais seco do DF, sem sentir seu sutil perfume que anuncia profeticamente que a Primavera vem logo ali, e inundará de esperança os corações dos Homens de boa vontade.

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