Para além do marrom!



Estava catalogando os discos quando percebi um papel brilhante, com uma cor entre o azul e o lilás, passeando por entre as 
seriguelas caídas no chão. 


Demorei mais um pouco,
e fitei o olhar novamente no pomar e ali estava mais uma vez o dito papel, agora dando piruetas no ar.
Suspeitei que ali estava a borboleta mais linda que já pousara em meu lar e aproximei-me devagarinho, um tanto incrédulo diante de tanta beleza.
No caminho ainda achava que era um papel desses que anima festas infantis, brilhantes e chamativos.

Aproximei-me devagarinho e vi que era uma bela borboleta. Ela era caprichosa, na face exterior de suas asas de um marrom cor de mogno, nas faces interiores um azul indescritível e de rara beleza.

Tinha um monte de coisas programadas para o sábado pela manhã, como todos temos, mas a partir de então comecei a brincar com ela de pique esconde.

Eu chegava perto e ela alçava um vôo mostrando toda a beleza de suas asas agora planando à minha frente. Depois pousava pertinho, agora com as asas recolhidas, escondendo o belo azul-lilás.

Esperei umas três horas para conseguir as fotos que ilustram essa crônica, dado a velocidade com a qual ela ao abrir as asas partia, sempre que se sentia insegura.

Engraçado que quem chegasse ao meu pomar e me visse não saberia que haveria nada de especial naquela borboleta. Alguns até diriam que a cor marrom dela estaria desbotada, sem nenhum apelo visual. Só saberiam o que ela realmente era se esperasse, se deixassem que ela abrisse as asas sobre nós e alçasse pequenos vôos.

De perto, uma cor monocromática e igual a tantas as outras...
Mas se olharmos bem... havia algo na face interna das asas que a distinguia de tantas outras, havia uma cor diferente.

Muitos de nós já passamos por situações que tiraram nossa cor, nosso brilho de viver, nosso viço e ânimo interior.

São situações limites, pesadas e um tanto penosas. Seja a percepção do amor que se esvai, seja o luto por um ente querido, ou um amor não correspondido, seja uma doença debilitante, seja o futuro incerto no trabalho, ou uma crise nas finanças.

São dias sem cor. Todos temos deles.

Nossa amiga borboleta é uma mensagem aos sofridos, cansados, aflitos e desanimados e aos que com eles estão lidando e os amam.

Nenhuma dor, luto ou situação difícil é para sempre. Suas feições podem estar abatidas, sem brilho e formosura alguma. Você pode até estar pensando se de fato vale a pena continuar vivendo.

Digo-lhe coragem!

Você tem em seu interior a cor de Deus e a chama do Espírito Santo.

Mesmo que seu exterior se desfaleça, lembre-se dessa amiga borboleta, e não esqueça sua beleza interior: que são seus valores mais preciosos, daqueles que brilham uma luz na escuridão. São a fortaleza, a esperança e a coragem de se aceitar, na dor e num estado sem cor, sabendo que logo logo abrirá novamente as asas e voará, em esplendido e gracioso vôo.

Sinta-se amado(a). Sei que é difícil até se olhar no espelho. Sei que é difícil levantar da cama, prosseguir e ouvir os malditos: "o que você tem?".

Só apelo para que se veja para além da carcaça, veja o que pulsa em teu ser, a vida que teima em acontecer, quer queria ou não.

Você é a borboleta mais linda que já vi. Profundamente humana, que carrega em si momentos de alegria e tristeza, momentos cor e momentos sem cor, dias perfumados, dias nem tantos.

Não se diminua mais do que a situação já o fez em teu viver. Não desista de você mesmo(a).

Aguente mais um pouquinho, mesmo sem sentir graça alguma em viver.

Logo verás que pessoas gostam e precisam de ti, mesmo sem cor.

Logo verás que ainda ferida(o), e mesmo sem se sentir bela(o), ainda assim poderás polinizar vida nos outros, ajudando-lhes também a resistirem um pouco mais.

Quanto de nós julgamos as pessoas pela carcaça exterior e perdemos a oportunidade de deixá-las que se revelem na sua completude, em todo seu potencial, desistindo delas muito cedo, ou ao menor tombo relacional.

Quanto de nós olham para os outros como eu olhava para a borboleta, esperando pacientemente que ela se mostrasse por inteira, da face das asas interior.

Pessoas pacientes e esperançosas quanto ao potencial do outro.

Que são capazes de esperar anos a fio que eles se revelem, e quando isso acontece, com eles se alegram e celebram.

Todos nós temos essa cor interior que só é libertada quando voamos nas asas do amor, da misericórdia, da generosidade, gratidão e perdão.

E, Aquele que colore nosso livro da vida tem poder para resgatar nosso ser do abismo mais profundo no qual ele se encontra, e no maior breu em que ele caminha.

Eu vejo cor em você, e tenho a paciência de Jó. Ainda te fotografarei com as asas bem abertas e bem bonito(a).

Eu acredito!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário é uma honra.

Crônicas Anteriores