Para ser + feliz, também é preciso saber "festar". (Autor Ricardo de Faria Barros)



É dia de jogo em Brasília, da seleção de futebol do Brasil.  À noite, Brasil e Qatar vão se encontrar às 21h30 , no Estádio Mané Garrincha.
A última vez que fui ao campo ver um jogo de futebol, o clássico da Paraíba: Campinense x Treze, foi pelos anos 80, do século passado.
Também não me lembro de ter levado meus três primeiros filhos, o Tiago (33), a Priscila (31) e o Rodrigo (29) num campo de futebol. 
Creio que a renda apertada de minha primeira família foi um dos principais motivos que me levou a não vivenciar qualquer tipo de lazer, que multiplicado por 5 – éramos 5, tornava-se muito caro para quem ganhava salário de escriturário do BB.
Então, optávamos pelo investimento do tempo no lazer em família, ou nas coisas da igreja, ou em viagens - para usar as diárias do título de que pagava mensalmente, da Bancorbrás.
A verba era tão curta, mesmo para estes passeios, que a opção de fazer uma farofada na praia não era charme, era estratégia de multiplicação dos reais.
Assim como, a estratégia de prorrogar ao máximo o horário em que levava os meninos para tomarem o café da manhã, pois economizava fome para o almoço, postergando-o par ao fim da tarde, numa espécie de almoço-janta.
Mas, depois consegui uns cobres a mais, e mesmo assim continuei bicho do mato. Os filhos vieram para Brasília, o JG nasceu, e mesmo assim eu continuava sem ir no campo, ou fazer alguma viagem para o exterior com eles.
Não vou me deter fazendo grandes análises do que ocorreu comigo que me levou a não mais ir a um estádio., ou me tornar uma espécie de ermitão para vários tipos de turismo de lazer-entretenimento, do tipo Disney.
Quantas coisas vão passando por nossa vida e não as aproveitamos?
Não estamos ali, presente a elas, vivendo aquela experiência.  Seja por comodismo, seja por apatia, seja por medo do desconhecido. Sei lá.
O fato é que tomei consciência disso recentemente. De que é importante ser testemunha da história, viver experiências únicas, que não se repetem. Poder dizer, eu estive ali!
Acho que entrei no modo sobrevivência, com uma vida muito corrida, adaptando-me a grana curta para qualquer tipo de lazer que custasse mais que 50 dólares.
 Ou fiz outras escolhas de preenchimento do tempo livre. Ou me adaptei ao estilo de vida da parceria. Ou, tudo isto junto e misturado.
Outro dia pensei comigo: “Daqui a duas semanas o Brasil vai jogar aqui contra o Qatar, que tal você levar o JG?”
Assustado de ter que enfrentar meus medos e mudar, ainda tentei argumentar dizendo que eu iria ver se ele estaria comigo no dia do jogo, uma vez que tenho a guarda compartilhada dele.
Tipo, vou adiar o assunto e ela vai esquecer.  Mas, esperta e conhecedora de meu estilo ermitão, soltou um: “Será na quarta à noite. E toda quarta ele fica contigo”.  Eita!
Então, resoluto e decidido, respondi que nós iríamos ao jogo.
Comecei a fuçar e descobri o site pra comprar os ingressos. A primeira aventura foi entender o sistema deles.
Os dois ingressos, a meia e a inteira, saíram em meu nome. E não havia opção de escolher as cadeiras, portanto saíram em poltronas diferentes, embora no mesmo portão 17.
Aiaiai pensei! Só comigo.
Mandei mensagens para a Fanpass, e-mail, tentei os fones, WhatsApp, bati bombo, soltei fumaça e ninguém respondia.
No dia do jogo, após mandar um último help pelo Zap, eles enfim responderam que não havia cadeiras marcadas e que a meia entrada, também com o meu nome impresso nela, não seria problema. (Sic!) Não entendi nada, mas lhes confesso que fiquei com o “chu” na mão. É que tenho fobia com acesso a prédios, ter que passar por guardinhas. Além da de achar que o meu lugar de sentar estará com outra pessoa nele. Bem, pelo menos a segunda fobia não seria alimentada, já que o assento era livre. O problema, na cabeça de um fóbico, é que criamos um cenário no qual nenhuma dupla de cadeira estaria disponível, lado a lado, para mim e o JG. Coisa de louco, ao pensar um estádio com mais de 70.000 lugares. Mas, quem não tem também suas próprias bizarrices que me atire a primeira pedra.

Na manhã da quarta saio feito doido pelo setor comercial sul procurando o povo das bandeiras e camisas. Nada. Eles não fizeram o ponto. Dou uma voltinha pelo estádio e por lá eles ainda não houveram chegado.  Disse-lhe que iríamos “normal”, mas que iríamos.
Pelo meio dia, ela vem aqui em casa e me salva com uma bela camisa canarinha para o JG.  Quem ama cuida!
Fiquei emocionado com o gesto inesquecível dela, e fui logo tratar de achar as minhas camisas amarelas. Tinha dito a ela que eu tinha uma da seleção, mas me enganara. Logo decidi por uma camisa de um evento do BB, bem estilosa e amarela.
Fui buscar o JG no colégio, e no caminho de volta disse-lhe que à noite iríamos ver o jogo do Brasil. Ele, entretido com o celular, respondeu com um protocolar: “ok, papai”.
 Aí continuei dizendo que ele precisaria provar a camisa que ganhou, e que tinha que fazer todas as tarefas na parte da tarde, para que fossemos ao estádio.
A cena que ocorreu a partir desta minha frase não cabe em palavras. Caíram todas as fichas ao mesmo tempo. JG ama futebol. Ele treina todos os sábados. E, ele perguntava, nós vamos ver o Brasil? Eu dizia, sim. Ele continuava, no estádio? Eu dizia, sorrindo, siiimmm!!! E ele vibrava de felicidade, esquecendo o celular.  Aí foi me falando que o Gabriel Jesus jogará, que o Neymar – o pegador, jogará.  E que talvez o Brasil consiga fazer um gol de falta. E que tem tempo que não faz. Eu não sabia de nada disso.
O jogo começava 21h30, mas saímos de casa 17hrs. Estacionamos perto da Torre de TV e fomos eletricamente esfuziantes em direção ao Estádio. No caminho bandeiras, camisas, e adereços marcavam o momento: é dia de jogo do Brasil. Fomos dos primeiros a acessar as catracas de fiscalização do acesso.  Elas nem estavam abertas ainda, visto que era 17h30, mas nos juntamos a outros 50 ansiosos que nem nós. E tudo era festa. 18h40 elas abriram e fomos para a revista. E, pimba, o só comigo ocorreu. Fomos barrados.
Não autorizaram meu ingresso com a câmera fotográfica. JG ficou desolado, olhos cheios de lágrimas. Disse-lhe, filho bora correr até o carro. Se eu tivesse ido de Uber o problema seria mais sério. Corremos uns 1,2 km, deixamos a máquina, e voltamos arfando, mas felizes. Já não havia filas na segurança e passamos legais pela vistoria.
Nos dirigimos à segunda barreira, agora a da conferência do ingresso. Com o chu na mão, a moça só passou no leitor de código de barras, que deu ok nos dois ingressos.
Mas, tinha uma terceira barreira, que pegava um outro papel para checar a validação do ingresso, e logo o cara nos liberou.
Entramos naquele mostro de concreto, feito com mais de 40 esguias colunas gregas de uns 100 metros de altura. A primeira sensação foi de retorno à minha juventude. Aquele frisson no ar, ao subir para a superior, entremeado de enormes colunas, aquela primeira visão do campo, uauuu, as pessoas alegres, famílias e mais famílias. Logo descobrimos um lugar bacana, na arquibancada superior, a primeira de suas fileiras, a mais próxima da inferior. Estávamos protegidos à frente por um vidro, e ficamos sentados ao lado de uma das escadas de acesso ao wc, e com uma segurança nela fazendo guarda.  JG bem que tentou ainda ler o resumo de história e geografia da prova que faria nesta quinta.
Mas, era impossível. O clima de jogo do Brasil é indescritível. E muitas coisas vão ocorrendo, mesmo a 2 horas do início. Tem jogo de bolas e camisas pra torcida, o que JG reclamou pois não alcançavam as superiores. Tem música, tem a batucada chegando com festa. Tem fogos a escalação anunciada nos telões. Tem o povo levando banho dos jatos de água do campo, e todo mundo sorrindo. Tem treino dos goleiros, tem os doidinhos dos reservas. Tem a entrada dos titulares para aquecimento e primeira saudação pra torcida.
Então, a prova de Geografia e História que nos perdoe, mas dela existe recuperação. De uma vivência como aquela não! E, liberei o JG da leitura. Ele não podia perder nada daquilo, nem eu. Acho que éramos os mais animados do pedaço onde estávamos.
E foi uma comilança, graças a Deus levei dinheiro trocado. Era um tanto de gente passando vendendo churros, pipoca, cachorro-quente, batatas e amendoins, água e cerveja sem álcool.
Uma festa de sabores. Tudo embalado pelo animado do estádio que não deixava ninguém parado, ensaiando as famosas Olas.  JG logo se aclimatou e já estava indo sozinho ao WC e repor comidas, direto no bar. Sempre eu ficava apreensivo, mas como a lotação estava em 50% da capacidade do estádio, eu o deixei treinar autonomia e protagonismo. E ele se saiu super bem.
Aí veio a entrada dos times, a emoção dos canhões de ar que lançam as fitas amarelas na torcida, as torres de fumaça branca, e o hino. Ahh, o Hino Nacional Brasileiro, o povo todo cantando à capela, como não encher os olhos de água?
Acho que só viver a cantata coletiva do Hino já teria valido à noite.  Mas teve dois gols, dois momentos que eu e o JG parecíamos enlouquecidos, abraçados, pulando e em pé festejando.
Faltando 15 minutos pra terminar resolvi sair para poder pegar menos trânsito e chegar mais rápido em casa. JG vinha esfuziante no carro. Comentando cada lance, inclusive o bendito gol de falta que anda rareando na canarinha.
Uma tímida lua nova nos acompanhava, até em casa. No meu coração só gratidão. À namorada por ter me possibilitado viver esta experiência.
E a Deus por ter dado tudo certo. Chegamos em casa, nos abraçamos emocionados com o que vivemos, e, antes de dormir, dissemos um a outro: voltaremos a fazer isto! 
É preciso mesmo. Para estas e tantas outras coisas que ocorrem, ali pertinho de nós, e nem sempre as valorizamos e delas participamos como deveríamos fazer.
Não posso consertar meu passado, nem devo me julgar com severidade e culpa, contudo posso reescrever meu presente!
Chega de ser ermitão, um monte de coisas ocorre todos os dias mundo afora, dignas de serem saboreadas – com a família, amor, amigos ou sozinho.
E, muitas delas, ocorrem a custo zero.
Como, por exemplo, ver nos primeiros domingos de cada mês a troca da bandeira do Pavilhão Nacional, na Praça dos Três Poderes, aqui em Brasília.  Espetáculo belíssimo, para o qual em 20 anos por aqui, só fui uma vez.  Este tempo acabou, está decretado, lavrado e passado em cartório!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário é uma honra.

Crônicas Anteriores