Meu querido
pré-aposentado ou recém, continuo esse bate papo contigo, hoje, à sombra de uma
centenária figueira.
Hoje quero convidá-lo a refletir sobre mais uma das três síndromes que,
pedagogicamente, criei visando melhor ilustrar algumas situações psicossociais que ocorrem na aposentadoria. São
elas: a da Alienação Fantástica; a da Abstinência ao Sobrenome Corporativo; e a
do Ninho Vazio.
Hoje nossa conversa será
sobre a da Alienação Fantástica.
Esta Síndrome, caso não
tratada a tempo, causa muito sofrimento no
período de vida que chamo de pós-carreira: a aposentadoria.
Ela é fruto de
expectativas superdimensionadas.
Estava programando uma ida
à Jericoacoara com minha esposa. No caminho
íamos pousar em Trairi-CE, na praia de Mudaú. Trata-se de uma praia paradisíaca,
situada, justamente,
entre Fortaleza e Jeri.
Liguei para uma pousada e
reservei um quarto. Minha esposa sofre com alergia à picada de pernilongos e
foi logo perguntando se tinha aquele chatos insetos por lá.
Falei que sim.
“- Será que no lugar que ficaremos
hospedados têm muriçocas?
Tem. Mas já pedi que colocassem um mosqueteiro
no quarto.”
Pronto. Consegui
trazer a expectativa dela para a realidade.
Ao assim fazer, evitei
frustrações e desentendimentos futuros e desnecessários.
Ela, simplesmente, se preparou para as muriçocas.
Adicionalmente, pedi ao
hotel que colocassem uma espécie de rede de filó que no Nordeste chamamos de
Mosquiteiro, sobre a cama.
Tudo certo.
Ao chegarmos naquela
pequena cidade, nossa estada foi tão boa que desistimos de ir à Jeri. A visão
das dunas e barra do rio Mundaú entrando mar
adentro, no município de Trairi-CE, é fantástica.
Uma praia linda, deserta
e repleta de coqueirais, com uma população local vivendo da pesca e um povo
acolhedor.
Ali, ela mal se lembrou dos "abençoados" mosquitos que a
perseguem.
Agora imagine se eu lhe digo que não haveria mosquitos. Qual seria
sua expectativa?
A Síndrome da Alienação
Fantástica que criei para, didaticamente falar
sobre expectativas, é nutrida por uma
idealização da aposentadoria.
São fantasias, desconexas da realidade, que
são em muito ampliadas causando, quando de sua não realização, muito sofrimento
e sentimento de inadequação.
É a doença das expectativas irreais.
É como um glaucoma ou catarata, que alteram o olhar. Alteram a visão, ao ver o que dentro dos olhos habita.
Imagine um professor que nutre expectativa de pegar a pior turma do colégio.
Imagine um gestor que nutre a expectativa de receber um funcionário rebelde em sua equipe.
Imagine um casal que nutre a expectativa de que a cidade em que se hospedarão é suja e violenta.
Todos, sem exceção, verão aquilo que habita em suas expectativas.
Tendemos a moldar a realidade para que ela caiba dentro de nosso modelo mental.
Por isso expectativas poucas, ou muitas, são enganosas.
Distorcem a realidade.
É a doença das expectativas irreais.
É como um glaucoma ou catarata, que alteram o olhar. Alteram a visão, ao ver o que dentro dos olhos habita.
Imagine um professor que nutre expectativa de pegar a pior turma do colégio.
Imagine um gestor que nutre a expectativa de receber um funcionário rebelde em sua equipe.
Imagine um casal que nutre a expectativa de que a cidade em que se hospedarão é suja e violenta.
Todos, sem exceção, verão aquilo que habita em suas expectativas.
Tendemos a moldar a realidade para que ela caiba dentro de nosso modelo mental.
Por isso expectativas poucas, ou muitas, são enganosas.
Distorcem a realidade.
Então, caro
amigo ou amiga que irá trilhar seu novo caminho como aposentado, cuidado para
não esperar demais.
"Esperar"
demais.
Pé no chão.
São três ordens de
expectativas da Síndrome da Alienação Fantástica que se não forem bem
trabalhadas dificultarão a adaptação aos novos
tempos:
As Afetivas; as Sociais e
as Econômicas.
As Afetivas são em
relação aos filhos, amigos, cônjuges e familiares.
O aposentado acha que
eles estarão mais disponíveis e, na sua
alienação fantástica, acha que recuperará anos
de distanciamento, na sua primeira semana como aposentado.
Aposentados assim
destroem casamentos. Não os deles, mas os de seus filhos.
Pois, têm necessidade que
todos estejam em sua casa, em churrascos que duram meses, em todo tipo de lazer
ou celebração.
Sufocam seus familiares
reivindicando um excesso de atenção, pois "agora têm tempo".
Na vida afetiva, esquecem-se de reconquistar os espaços devagarinho, um dia
por vez.
Esquecem que o lar é
dividido com vários que aprenderam a não tê-lo por mais de 10 horas diárias.
Então, eles, quando voltam aos lares,
se sentem sem espaço. Até os netos, que
antes brincavam no seu lar sem serem importunados, passam a incomodá-lo.
Pegam no pé de seu
cônjuge, ou acabam por terminar relações, pelo "peso”
que passam a sentir nos silêncios que gritam entre os dois.
Passam a querer controlar
a vida dos filhos, do cônjuge, pois agora têm tempo.
E, em sua fantasia, acha que foi abandonado por todos. Passa o dia zapeando na TV, aguardando telefonemas e contatos dos seus, e ainda acha que foi abandonado.
Ele desloca o sentido de sua vida para os mais próximos e ficam carentes de atenção, muita atenção.
Coloca o kit aposentado e ainda culpa todo mundo por seu estado de desajuste. O kit consiste na cadeira de balanço, sofá ou rede, no controle remoto, palavras cruzadas, pijamas e tudo que lhe anestesie a realidade, dos tarjas pretas ao álcool.
Fica ranzinza, hipersensível e irritadiço. Literalmente definha a cada dia.
Planeja mil coisas para serem feitas junto aos que gosta, mas esquecem que eles não se aposentaram.
Ficam supercarentes, liga para os filhos várias vezes e quando os
filhos não lhes correspondem como queriam sentem-se impotentes e tristes.
Se o seu
cônjuge continuou a trabalhar, passa a
ser cobrado por uma maior dedicação e tempo para com quem se aposentou.
Como ele não se preparou
para ocupar sua vida, no pós-carreira, quer ocupar
sua vida ocupando a vida dos outros. Entende?
O problema não é seu
querer de afeto, é a dose que bota nisso. A intensidade.
A outra manifestação da
Síndrome é a social.
Ele acha que continua a
fazer parte do grupo que conviveu por décadas e espera ainda ser chamado para
os eventos sociais que o grupo articula.
Ledo engano. A fila
anda. O grupo se auto organiza numa agenda própria e nem sempre se lembra de convidá-lo.
E, como ele não planejou
outros espaços de convivência social, restando-lhe apenas o dos amigos do
trabalho, vai ficando infeliz e sentindo-se solitário.
No começo ele ainda
acompanha as notícias, depois chega ao ponto de querer acesso à Intranet da
Empresa para manter-se atualizado socialmente do que está rolando.
Ele não trabalhou em si
mesmo essa expectativa de vida social, pós-carreira.
Uma pena.
Não sai do lugar social em que se encontra para construir novos relacionamentos. Não se move.
O culpado são os outros que lhes abandonou.
Não se afilia a mais nada, nem ao clube dos amigos do dominó.
E, alienado fantasticamente, acha que será visto, notado, chamado... Sem que dele dependa reconstruir redes de relacionamento, reais ou virtuais.
Espera estímulos, reconhecimento, convites, de forma saudosista.
Não vira a página da empresa e assume sua nova carreira, nova jornada.
Não cria disciplinas, rotinas, projetos que possa preencher seu dia.
As expectativas sociais superdimensionadas causam angustia pelas não realizações.
Espera ainda ser
convidado para as celebrações sociais da turma do trabalho, ou da própria
empresa, e, ao saber que elas aconteceram sem ele presente, vai definhando.
Uma co-dependência social
mórbida. Doentia.
Não consegue construir
outros grupos de referência, ficando numa
espécie de saudosismo masoquista.
Somos seres sociais,
precisamos das redes de relacionamento. Imagine o sofrimento de quem as perde,
por se conceber como tendo só elas.
A terceira manifestação
da Síndrome é a Econômica.
Esta é muito propagada
pelas agências de turismo da "terceira idade”,
que vendem uma vida repleta de Cruzeiros e Volta ao Mundo.
Por um momento os
adoentados, psicossocialmente falando, pensam que a grana será suficiente para fazer tudo o que não fizeram durante suas extensas jornadas
laborais.
Aos poucos vão percebendo
que, quem se aposenta e vive só da
aposentadoria, empobrece.
E, que as contas a pagar continuam ali, pertinho, demandando atenção.
Noutro extremo estão os que nunca se aposentam, ao fazerem
as contas do quanto perderão.
Ficam igualmente presos a uma existência que só se realiza no poder
econômico.
Não fazem conta do que
vale poder ir pescar no Lago Paranoá, numa
segunda de sol.
Esquecem o prazer de pequenas coisas.
Alienam-se de si mesmos e buscam nas coisas um sentido para a vida.
Como não as consegue, culpam-se por não serem feliz.
Materializam e monetarizam a sua existência, sentido até vergonha de não terem acesso aos bens materiais que idealizaram para o período da aposentadoria.
Vivem na espera de convites para novos trabalhos. Para consultorias, condução de aulas, etc.
Esperam, esperam e esperam. E, a cada espera frustrada, mais se afundam.
Mas, não fazem nada que possa valer, do ponto de vista existencial, fazer que sua vida valha a pena de ser vivida.
Comparam-se aos outros e punem-se por não terem feito isto ou aquilo na vida produtiva de antes da aposentadoria.
Vivem uma espécie de luto nostálgico, com forte apelo econômico, que vai correndo-lhes os propósitos e sentido do viver.
Seus papos giram em torno do preço dos remédios, degradação do valor da aposentadoria, custos dos impostos e serviços públicos.
Alienam-se de si mesmos e buscam nas coisas um sentido para a vida.
Como não as consegue, culpam-se por não serem feliz.
Materializam e monetarizam a sua existência, sentido até vergonha de não terem acesso aos bens materiais que idealizaram para o período da aposentadoria.
Vivem na espera de convites para novos trabalhos. Para consultorias, condução de aulas, etc.
Esperam, esperam e esperam. E, a cada espera frustrada, mais se afundam.
Mas, não fazem nada que possa valer, do ponto de vista existencial, fazer que sua vida valha a pena de ser vivida.
Comparam-se aos outros e punem-se por não terem feito isto ou aquilo na vida produtiva de antes da aposentadoria.
Vivem uma espécie de luto nostálgico, com forte apelo econômico, que vai correndo-lhes os propósitos e sentido do viver.
Seus papos giram em torno do preço dos remédios, degradação do valor da aposentadoria, custos dos impostos e serviços públicos.
De um lado os que
monetarizam tudo, esquecendo o valor de um por do sol. Do outro, os que saem
torrando todas as economias, achando que as férias serão eternas e que, mais cedo ou mais tarde,
será chamado para novos trabalhos remunerados.
Vivem de forma
perdulária, ou entristecem-se por não poderem consumir o que, em suas fantasias de alienação fantástica, esperavam fazê-lo na aposentadoria.
Acreditam que os novos
trabalhos surgirão por osmose, e que a qualquer momento, bastando entregar seu
currículo, será chamado para lecionar, prestar consultoria, etc.
Ficam no aguardo. E
sofrem. Sofrem, pois currículo a currículo vão vendo que voltar a trabalhar de
forma remunerada, do dia pra noite, não é fácil.
Algumas pessoas me
procuram e me falam que conhecem muitas pessoas felizes na aposentadoria.
Também conheço. Um monte.
Mas, meus escritos são
duros e terapêuticos, para que funcionem como
uma vacina, produzindo anticorpos para prevenir possíveis depressões naquele
estado - como aposentado.
Não falo do que funciona,
nesse momento. Ainda falarei contigo sobre isto.
Falo do que não
funcionará, prevenindo-o e lhe ajudando a "focar" as expectativas
mitigando os riscos de sofrimento psíquico.
Falo das muriçocas que
existem na praia de Mundaú. Mas, ao falar delas, digo-lhe que foram as melhores
micro férias que tiramos.
Espero que sua
aposentadoria seja assim: plena, feliz, cheia de propósitos e de novos
projetos, remunerados ou não.
Mas, escute-me quando
falo das Síndromes. Essa minha fala é fruto de leitura e atendimentos que
fiz, ao longo de minhas pesquisas sobre o tema,
desde 1998.
Tome a vacina que lhe prescrevo. Nada de querer que o mundo afetivo gire
em torno de você, só porque se aposentou.
Nada de olhar a vida com
as lentes da emoção, quando sentir que está
difícil resgatar sentimentos que já teve para os que amou.
Faz parte do
pacote.
Nada de achar que está
sozinho ao sentir que seu antigo grupo social não mais lhe faz presença.
Lembre-se que você
passava 10 horas, no mínimo, com o grupo social do trabalho.
Fará falta. Ahh se fará!
Mas, outros grupos estão
só esperando tua chegada para se fazerem morada em teu ser.
Só te peço uma coisa: não deixe para procurá-los após aposentar-se.
Comece a cativá-los em tua vida anos antes.
Somos seres gregários, de
agrupamentos, mesmo que seja o grupo que se reúne para jogar dominó.
Por último,
recapitulando, qual assalariado tem dinheiro para viver esbanjando?
Curtindo a vida adoidado?
Isso é bonito nos filmes,
nos panfletos de agências de turismo. Na vida real, você ficará mais pobre,
contudo, garanto-lhe: não há riquezas apenas no contracheque do final do mês.
Há outras formas de
riquezas, além das coisas monetarizadas.
Há outras riquezas que, no corre-corre do trabalho foste deixando de lado,
ou não valorizando-as.
Quer riqueza maior do que
armar uma rede no Parque da Cidade e nela
balançar lendo um livro bom. Ou voltar a estudar?
Ou o tempo livre pra
fazer nada. Nada. Só banhar-se no sol e agradecer que está vivo.
Não se puna, ou culpe,
por continuar devendo, cheio de prestações, e muitos ainda garantindo o
sustento dos filhos.
Você chegou longe demais,
frente a milhões de brasileiros.
Relaxe e curta outras
oportunidades de acumular tesouros que nunca tinha percebido.
Tesouros de afeto, de
paz, de cidadania, de ética e solidariedade.
Vacine-se contra a
primeira das Síndromes.
Ajuste suas
expectativas.
E seja feliz sem esperar
tanto dos outros que lhe rodeiam.
E sem fantasiar e idealizar tanto sua existência.
E sem fantasiar e idealizar tanto sua existência.
Amarre seu arado a uma
nuvem e aprenda a ser feliz consigo mesmo.
Adorei o post, parabéns!!
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