Sobre cuidar e admirar. (Autor Ricardo de Faria Barros)


Naquele domingo, a missa das 18hrs, na tricentenária Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem, em Recife-PE, estava lotada.
Com esforço achei uma vaga pra mamãe, num dos bancos de madeira.
Papai e JG subiram para o "puleiro" do coro da esquerda, onde tinha duas vagas.
Eu subi para o da direita, e achei uma para mim também.
Do banco à minha frente, saia uma fragrância de amor.
Não, caros amigos e amigas, não era perfume, nem alguma coisa do reino do erótico que à minha frente rolava.
Era amor, somente amor.
Tratava-se de um casal, na faixa dos cinquenta, que prestavam atenção à missa.
Mas, de minha vista privilegiada, atrás do banco deles, eu percebia que ela fazia pequenos carinhos nas costas dele, sobre a qual oceanava o seu braço, enlaçando-a ternamente.
Cada vez que o padre mandava sentar, ela recomeçava a expressar amor por ele.
E ele retribuía.
Timidamente, mas de forma segura, ele apalpava os ombros dela, como que a dizê-la: eu também estou aqui, te amo, conte comigo!

Tem coisa mais bonita que ver um casal expressando amor, um para com o outro?

Tenho sido privilegiado nestes meses por ver isto todos os dias e me inspirar.

Um casal de pássaros, da espécie Burguesa (um tipo de pomba), veio me dar a honra de fazer um ninho na jardineira da janela de meu quarto.
Acompanhei tudinho de perto, na vida deste casal que se ama.
Desde a escolha do melhor local para o ninho.
Ao ter que mudá-lo, por ter sido levado pela chuva e vento inclemente.
Bonito foi vê-los chegando com os gravetos, um a um, e irem moldando-o no leito de um vaso de suculentas.
Sentia o esforço deles, o dia da postura estava perto, e eles já tinham perdido outros dois ninhos, feitos em locais mais expostos ao vento.
Aí veio o dia da postura, e a mamãe ficou toda feliz, chocando-o pacientemente.
Uns quinze dias se passaram, e agora um filhotinho depende deles para crescer e voar, tal qual  nosso filhos.
Hoje vi uma cena linda, que está na sequencia de fotos que ilustra esta crônica.
Era pelas 7 da manhã, e o macho chegou para assumir o lugar nos cuidados do pequeno filhote.
UAUU!!!   Que exemplo inspirador para tantos homens que não dividem as responsabilidades pela criação dos filhos.
Ele chegou, ela olhou pra ele como que a dizer, olha como nosso filhote está belo.
Ela estava encharcada da chuva da madrugada, o ninho não é protegido de galhos e folhas, é exposto. Suas penas estavam eriçadas de frio, chovera e ventara muito.
Ela estava exausta. Ele então chega, assume a guarda, e dá o direito ao descanso de sua amada.
Não sem antes olharem-se, como que a despedirem-se. Agora, ela vai procurar local seco para se enxugar, vai comer, e mais tarde volta para o plantão.
Acho que a melhor expressão do amor é a ternura do cuidar e do admirar.
Aquele casal se admira.
Pois, na expressão de tanto carinho, um pelo outro, ali não havia espaço para disputas de egos, egoísmos, para solidão a dois.
As aves sabem expressar cuidado. Compreendem o limite do outro, assumem de forma compartilhada a missão de criar e educar para os vôos.
Creio que andamos precisando reaprender a cuidar do outro que amamos. Deixar de ficar só na postura de quem espera receber, para aí sim doar. Isto não é amar, isto é comercializar.
Quem ama o faz sem pré-condições, sem listas de avaliação de desempenho, ou testes de perfis psicológicos - como quem procede a um processos seletivo. Simplesmente ama.
Quem ama cuida e, admira. E, é capaz de renovar isto tudo, todas as vezes que ventaval levou o ninho, não se perdendo deles mesmos, a cada tremor de cotidianos que possa abalar a esperança.

Um comentário:

  1. Uau! Cheguei a me emocionar. Quando palavras conseguem fazer isso [e porque houve inspiracao profunda. O mundo esta carente de cuidados sem pedir nada em troca, simplesmente por amor.

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