Festar é preciso

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Outro dia via o Globo Rural, cedinho pelo domingo, gosto de ver as coisas da roça e curto o programa. No daquele dia, de 26/06/2016, um dos destaques era a festa de São João que um empresário agrícola deu para os funcionários de sua fazenda.
Festão para São Pedro nenhum botar defeito.
Numa das cenas, o repórter passa a entrevistar os peões, tratoristas, pessoal dos viveiros e quem lida com a criação.
Todos expressavam muita alegria, até que um deles, o Diogo Santos, definiu numa frase lapidar o momento que vivia:
“É hora de festar. É hora de compartilhar felicidades...”
Juro pessoal, não editei a frase. A frase que o Diogo falou foi exatamente essa.
Diogo nos deu uma aula sobre a arte de bem viver, do alto de sua simplicidade de peão de “bate-volta”. Aquele que leva e traz o gado para o confinamento.
Suas palavras ensinam muito, ditas com tanta ênfase aos 4min50seg do vídeo aqui disponível:
Creio que andamos perdendo a capacidade de “festar” a vida.
Nossa sociedade anda muito mau humorada. Pode até saber fazer festa, ou participar de festas, mas desaprendeu a festar.
Depois, explico-lhe o que quis dizer.
Andamos craques em procurar razões para ser infeliz, e vamos perdendo o encanto de uma vida simples, virtuosa e em paz. Imagine a pessoa que passa o dia consumindo intrigas, mágoas, reclamações e rabugices, como o “festar” vai fazer morada no coração dela?
Festar e compartilhar felicidade é uma questão de saúde emocional. Não que devamos nos alienar, fechar os olhos para as críticas e dificuldades. Nada disso. Mas temos que ter cuidado para não ficarmos envenenados, ou contaminados, pelo apenas ruim, negativo e por aquilo que nos apequena.
Amanhã estou pensando em festar o nada. Você sabe festar o nada? Festar o nada é quando nos lembramos que estamos vivos, e escolhemos uma hora para comemorar o fato.
Festar o nada é quando nos lembramos de gostar de nós mesmos, e conosco vamos compartilhar felicidades, abrindo o baú de bons momentos vividos, alguns deles encardidos em velhas fotografias.
Festar o nada é lembrar do que ainda temos, e anda passando despercebido, escondido nos subterrâneos da indiferença.
Festar o nada é escolher um momento para brindar o que nos sobra, deixando de lado, mesmo que um momento, as preocupações com o que nos falta.
Festar o nada é parar para celebrar o caminho, mais que a chegada. Festar o nada é agradecer estar vivo.
Amanhã tem festa do nada lá em casa. Uma festa que farei para mim e para quem quiser aparecer. Traga cerveja gelada, caso vá, e uns ovos cozidos e amendoins.
Eu tenho uns camarões, tipo lagostins, guardados no freezer, e vou fazê-los para minha família. Não darei aula, e aproveitarei a folga para festar. Nada de tablet, celular ou TV. Vou desconectar-me.
Só o prazer de cozinhar uns camarões no alho e óleo, daqueles de preguiçoso mesmo.
Na vitrola, Geraldo Azevedo. E vou ver fotos antigas, degustar conservas emocionais.
Vou fazer a barba e ficar bonito para esperar mim mesmo. Acho que vou inaugurar a panela nova que comprei em Londrina. Já não tenho tanta vontade de guardar coisas novas, para um uso num futuro qualquer, que nunca que chega.
Uma amiga postou que foi professora destaque do Centro de Ensino no qual leciona, ela compartilhou felicidade. Fiquei feliz. Tem gente tão pobre de espírito, daquelas que colecionam razões para ser infeliz, que fica incomodada com postagens de realizações, conquistas e passeios dos outros. Eu não.
Eu acho que elas estão fazendo o que o Diogo nos ensinou, estão compartilhando alegrias.
Hoje degustei felicidades compartilhadas. Um amigo postou que foi aprovado na bolsa de pós-graduação, ele estava feliz, e eu com ele.
Um outro amigo compartilhou um vídeo no qual um patinho que seguia sua mãe pata, caiu num bueiro de esgoto, daqueles com grades na abertura.
Pessoas perceberam o drama e pararam tudo para resgatar o patinho, erguendo a grade. Fiquei feliz, ao ver a bela cena solidária.
Sim Diogo, você está certo, precisamos arranjar mais motivos e tempo para festar a vida e compartilhar felicidade, degustar felicidades.
Arranjar motivos, sabe como é? Olhar as beiradas da vida, tirando o foco somente no que angustia, preocupa ou aflige.
Hoje, após o almoço, fui tomar um café com o Pauletta, no Marzuk.
Comprei por lá um quibe para o JG, um ninho de nozes para dona patroa, e uma kafta de carneiro para mim, agora, perto das 21hrs vou festar com carneiro.
Não precisa de muito para re-aprender a festar.
A atitude de festar pede simplicidade, humildade e gratidão. Pede paz interior e o cultivo de um jardim de espiritual. Pede perdões. Mil perdões.
Tem também que saber se desconectar do que não interessa, e conectar-se ao que realmente importa.
Você pode festar a vida fazendo um arroz com ovo, dançando sozinho, cantando no chuveiro, revendo lembranças dos passeios que fez.
Você pode festar a vida orando ao Deus que tudo cuida, ligando para um amigo, ou surpreendendo com alguma atitude, na relação a dois, já “monotizada”.
Você pode festar a vida permitindo-se ir a um parque, ao cinema. Permitindo-se ao nada do tudo que acontece ao teu redor.
Paulo estava certo quando escreveu aos Filipenses apelando para que “tudo o que for verdadeiro, tudo o que for honesto, tudo o que for justo, tudo o que for puro, tudo o que for amável, tudo o que for de boa fama, se houver algo de excelente ou digno de louvor, nisso pensai.” Fl 4,8
Para Paulo, essa era a receita do festar e do compartilhar felicidades. Ele marcou um bingo, ao sacar que o festar e a felicidade habitam nossos pensamentos, caso sigam sua receita (justiça, pureza, amabilidade, honra, verdade e louvor).
Mas, para que esses pensamentos habitem nosso ser, temos que eliminar outros, não tão edificantes. Para ter essa postura temos que ter cuidado com o que ingerimos e o que expelimos de emoções, sentimentos e verbalizações diante da vida, do outro e de nós mesmos.
Têm tristezas, lutos, decepções e melancolias que precisamos ousar botá-los momentaneamente numa gaveta, segrega-los num canto de nosso coração, para que outros humores possam em nós agir. Para dar uma chance ao bem-estar. Saber apreciar um bom vinho, num copo de extrato de tomate.
Mas, pra fazer isso tem que ter coragem de sair da posição de dor, de vítima das circunstâncias, e permitir-se – mesmo que por um breve momento, encapsular o triste, para que ele não saia contaminando tudo em nosso viver.
Agora vou ali pré-festar amanhã, comendo aquela kafta de carneiro, acompanhada de uma latinha.
O pré-festar é tão bom quanto o festar, aprendi isso festando. É a festa do caminho.
Compartilhemos felicidades, não temamos ser mal compreendidos, vítimas de inveja ou de falsas interpretações. Sejamos autênticos, sem ostentação, sem esnobismo.
Quem faz isso – critica a alegria do outro, fará de todo maneira, com qualquer tipo de post.
Não tem jeito, então não limite sua expressão feliz ao que o outro pode pensar, ou achar.
Se ele for mal, você pode postar até desgraça que ele vai achar que é pouca.
Vai criticar. Simples assim.
Portanto, festeje sua vida sem escrúpulos, ou medo do que vão achar, e aprenda a compartilhar felicidades.
Os de bem vão se deliciar com tuas vitórias e alegrias.

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