Abro os jornais matutinos, das páginas de portais digitais, e flagro uma notícia de que dois trabalhadores da área da saúde foram demitidos.
O motivo da demissão foi a postagem de um vídeo, nas suas redes sociais, de uma dança performática que fizeram nos embalos da música “Que Tiro Foi Esse?”
Seria pura arte, se eles não estivessem trabalhando num hospital, chamando para contracenar, inclusive, uma cadeira de rodas do local.
Corta a cena, e recordo que recentemente uma das festas corporativas de final de ano no Brasil, escolheu como tema um Baile à Fantasia.
Contudo, um funcionário trocou o À pelo De, e apareceu no pedaço provocando a todos e todas com sua fantasia erótica.
Ele foi “vestido” de "Negão do WhatsApp", personagem erótico que circula pelas redes sociais, de dotes avantajados, qual uma bengala.
O cara se empolgou e passou a noite roçando aquilo ali em todo mundo, correndo atrás das pessoas e colocando-as em situações constrangedoras, para algumas, e reveladoras para outras, mais alcoolizadas e danadinhas.
Fiquem certos de uma coisa, nessa sociedade midiática, alguém está sempre com o gatilho da câmera apontado para nós. E foi o caso. Fizeram o vídeo do funcionário-bengala e ele viralizou. Chegando à sede da empresa, num outro país. O Presidente teve acesso ao material, não me perguntem como, e não gostou do enfoque da fantasia.
E pimba!
Tacou-lhe uma outra bengala no crachá do sem noção, e o demitiu sumariamente, por dano à imagem da empresa.
Demitiu também o chefe dele que defendeu a brincadeira como uma arte peniana, e também o chefe do chefe que disse que no Brasil isto era permitido.
É preciso desenvolver uma nova competência em nossos trabalhadores, nesse contexto de verdadeiras redes neurais de interações virtuais: fruto da simplificação, disponibilidade, massificação e democratização do acesso às tecnologias de comunicação e informação.
Seria ela a do “Se Mancol Digital.”
Colocando em termos mais nobres, a competência seria a do Discernimento Digital.
Coisa que antes fazíamos e que ficavam restritas a sala do trabalho, ou às quatro paredes do salão de festas, com pouca ou nenhuma repercussão, agora são propagadas beirando a velocidade da luz. E sem levar com elas o contexto do que realmente ocorria. Elas só levam a cena editada, os melhores momentos. Ou os piores.
Pare um pouco o que ler. Conte quantos grupos você tem no WhatsApp.
Imagine se você reproduz uma imagem, texto ou vídeo de algo nesse grupo. Quantas pessoas são atingidas? E se elas fizerem o mesmo, com o material que de você recebeu?
Valho-me de um texto de Cicília M. K. Peruzzo (2003), de seu artigo: Mídia Local e suas interfaces com a mídia comunitária no Brasil, para continuar essa reflexão:
“A efetivação das interações mediadas pelo virtual fez com que fossem criadas e ampliadas novas formas de relações sociais e pessoais, com base na proximidade de interesses e
identidades, a partir da emergência e consolidação das novas tecnologias de comunicação e
informação”.
O que Cicília nos ensina é que a proximidade de interesses e a busca por identidades podem contribuir para elevar o nível de exposição, como se a pessoa buscasse um certo tipo de reforço positivo, de aprovação, de seus pares. Como se fossem posts pedindo um help de atenção.
Então, quanto mais obtusa seja a cena, ou impensável, a pessoa acredita que será mais admirada, ou tida como corajosa.
Lembra os militares que dançaram com fuzis no ar?
“Vídeo que circula em redes sociais mostra soldados fardados, dançando e brincando com armas, enquanto cantam funk durante o expediente em Brasília. Os militares pertenciam ao 1º Regimento de Cavalaria de Guarda, tropa responsável pela guarda presidencial e popularmente conhecida como Dragões da Independência.”
É disso que estou querendo falar. Lugar de trabalho não é lugar de fazer este tipo de vídeo, nem tampouco em suas perigosas festas corporativas, ou clubes da empresa.
Porque essa pessoa que sente necessidade de gravar tudo, e sair mostrando para seus pares, no fundo está querendo ser vista. Então, ela pula o “Corguinho” e faz da vida uma encenação, como se estivesse em permanente self de si mesma e postagem de todo tipo imagem, vídeo, e de opinião, doa a quem doer, desde que atenda aos interesses daquele grupo de identidade dela, tido como similar, e aprovador do que publica.
E a pessoa vai entrando numa onda perigosa, com limites pouco definidos entre o público e o privado. Entre o pessoal e o profissional.
Destruindo sua imagem e se expondo indevidamente.
Creio que essa educação digital se faz muito necessária nos tempos atuais. Até como forma de se fazer uma melhor gestão de carreiras, e até de protegê-las.
Cabe as áreas de pessoas das instituições, geralmente as responsáveis pela formação dos quadros organizacionais, prover um espaço de reflexão sobre este tema, sempre balizado pela ética, respeito às diferenças e expressões de cada individualidade.
E, deixo um alerta final. Essa mesma reflexão vale para nós, nossos filhos e amigos, nos educar para um maior discernimento e melhor postura no mundo digital.
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