Amigos são assim, excedem nossas expectativas e atendem muito mais do que pedimos em nossas necessidades.
Após o café da manhã, nos despedimos do Ari, e partimos apressadamente para adentrar o pior sertão do Brasil, com a hora ainda a nosso favor. Nosso alvo era chegar no badalado Lajedo de Pai Mateus, um conjunto de formação rochosa, esculpido sobre pedras planas, ou lajedos, que formam uma área de impressionante beleza. Esse ponto turístico fica na cidade de Cabaceiras-PB, cidade que menos chove no Brasil, situada na região do Semi-Árido chamada de Cariris Velhos.
No caminho, passamos pela minha primeira casa. Um lugar de muita esperança, que é sempre bom voltar às origens para vermos o que crescemos e como conseguimos superar tantas dificuldades do início da vida adulta. Eu entrei nela num sábado, dia 5 de janeiro de 1985, o dia em que saí de casa aos 20 anos. Quando entrei no carrossel do destino, grávido do Tiago, de 4 meses.
Demos a volta e entramos na Getúlio Vargas, para que eu relembrasse do colégio em que fiz parte do primário, o de Eneida Agra, hoje demolido. Como fui feliz naquela escola!
Após essas breves paradas, seguimos estrada adentro passando passamos por Queimada-PB, uma cidade que tem como seu portal um conjunto de montanhas rochosas que lhe dão um toque surreal, entre elas uma que intitulei de "Fole de Sanfona", e até imaginei Flávio José tocando nela um bom Luiz.
Era a primeira vez que adentrava nos Sertões, desde que cheguei na minha cidade. Antes, passeei na Zona da Mata e no Brejo, áreas bem úmidas. Agora, estávamos do outro lado da Cordilheira da Borborema. Do lado em as chuvas não chegam, pois são barradas antes.
A cena é de impressionante e trágica beleza. Mata de caatinga, jurema, algarobas, vegetação que de tão seca ficou da cor cinza. Quilômetros e mais quilômetros sem nenhuma expressão de vida, nenhuma. E muitas fazendas abandonadas, em mais de dez anos de seca inclemente.
Mas, o sertão tem seus mistérios, aromas, imensidões e tonalidades, para além do cinza de folhas causticadas pela seca.
Olhando bem para ele, encontram-se flores, árvores que teimam a morte e ainda estão verdes, um ou outro grito de esperança, expressos em pequenos poços que são escavados, metro a metro nos leitos de rios secos, à busca de águas nas profundezas de seu leito. O Sertão é a esperança que o amanhã será melhor e que isso também passa.
Assim como Euclides da Cunha disse, eu também acho que os Sertões não são uma região geográfica, os Sertões somos todos nós, humanidade. Somos essa contradição entre morte e vida. Entre cinza e verde. Entre flores e murchamentos Entre o aparente leito seco de um rio, e as fontes de água de que brotam de seu interior, caso os homens se permitam escavarem-se em si mesmos, na busca pelo auto-crescimento e iluminação interior
Abastecemos em Boqueirão, cidade que ficou conhecida por abrigar um imenso açude, de mesmo nome, que quando era tempos de chuvas, e ele sangrava, a população fazia a festa e a fartura era garantida. Cresci vendo imagens da sangria de Boqueirão, que foram ficando cada vez mais tênues e espaçadas.
Chamou a atenção a qualidade das estradas da Paraíba. O trecho de Boqueirão até Cabaceiras, por exemplo, apesar de curvas sinuosas, é de um asfalto espetacular de bem feito. Todas estradas deveriam ser assim, não é? O problema é que contratam um tipo de asfalto, para um tipo de peso que a estrada foi dimensionada a suportar, e trocam esse asfalto por um que receba menos peso, e bem mais barato, e a diferença é embolsada. Uma pena, mas esse é um dos golpes mais comuns ao Estado Brasileiro. Aprendi isso nos meus três anos de Engenharia Civil.
Voltemos ao passeio, ando vomitando para assuntos de política.
À medida em que entrávamos, Cariris Velhos adentro, a vegetação da Caatinga era mais prevalente. Cactos e mais cactos, alguns bem altos. O sol judiava conosco, e o ar-condicionado do carro de papai sofria para dar conta. De longe, avistamos a placa de Cabaceiras, e ainda era 10hr, ufa!.
A placa anunciava que estávamos entrando na "Roliúde" Nordestina. Cidade na qual foi filmada muitos filmes com cenários dos Sertões, entre eles o Auto da Compadecida. E que tem na festa do Bode Rei uma de suas maiores atrações. Cidade fundada por um De Faria: o Domingos de Faria Castro. Nos sentimos em casa, era tudo parente. rsrs Aliás, no Nordeste para você se sentir em casa não precisa muito. Sente em qualquer mesa de bar e veja o que acontece com a mesa vizinha, que logo interage com a tua, e todo mundo vai sair daquela noite "irmão".
Passeamos pela simpática cidade. com suas ruas e calçadas limpinhas, limpinhas, e casa com fachadas bem cuidadas e pintadas. Um deleite para a vista. Entramos na igreja, fotografamos a praça do coreto, e visitamos o museu do cinema, uma iniciativa digna de louvor, que fortalece a autoestima local, mostrando aos filhos da terra as produções culturais que ali foram realizadas.
Então seguimos em direção ao Lajedo de Pai Mateus, por uma estrada de terra, comendo poeira, e adentrando pela Caatinga uns 10 quilômetros.
Mas, a paisagem que víamos pagava tudo. A sensação era que os Sertões nos engoliam, de tanta força de querer viver que eles possuem.
A placa anunciava que estávamos entrando na "Roliúde" Nordestina. Cidade na qual foi filmada muitos filmes com cenários dos Sertões, entre eles o Auto da Compadecida. E que tem na festa do Bode Rei uma de suas maiores atrações. Cidade fundada por um De Faria: o Domingos de Faria Castro. Nos sentimos em casa, era tudo parente. rsrs Aliás, no Nordeste para você se sentir em casa não precisa muito. Sente em qualquer mesa de bar e veja o que acontece com a mesa vizinha, que logo interage com a tua, e todo mundo vai sair daquela noite "irmão".
Passeamos pela simpática cidade. com suas ruas e calçadas limpinhas, limpinhas, e casa com fachadas bem cuidadas e pintadas. Um deleite para a vista. Entramos na igreja, fotografamos a praça do coreto, e visitamos o museu do cinema, uma iniciativa digna de louvor, que fortalece a autoestima local, mostrando aos filhos da terra as produções culturais que ali foram realizadas.
Então seguimos em direção ao Lajedo de Pai Mateus, por uma estrada de terra, comendo poeira, e adentrando pela Caatinga uns 10 quilômetros.
Mas, a paisagem que víamos pagava tudo. A sensação era que os Sertões nos engoliam, de tanta força de querer viver que eles possuem.
Ao adentrar na área de um hotel que funciona como o portal do Lajedo, fomos barrados na porteira. Um guarda, com cara de poucos amigos, disse-nos que o Lajedo estava fechado para visitas. E pelos próximos 6 meses.
Que a Globo "comprou os direitos de sua área" para preparar alguma de suas atrações. Como assim?
Quer dizer que quando vão procurar financiamento para aquela área com base no patrimônio turístico do Lajedo o vendem como de acesso público, como patrimônio da humanidade. Mas, quando o vil metal chega na frente, esquecem os projetos de turismo, que franqueiam o acesso ao cidadão comum, e fecham a área?
Pode isso Arnaldo? Que esculhambação é essa entre o público e o privado, herdada desde as Caravelas, no que se chamava de Patrimonialismo. Uma tremenda falta de ética coma coisa pública que a confunde com a privada, e faz-se do Estado uma Casa Grande - e para poucos, deixando a Senzala para os muitos, o povo brasileiro.
De nada adiantou meu protesto silencioso. Descobrimos que o Lajedo é particular aos interesses dos proprietários, e público, quando atende as esses mesmos interesses. Sendo de um ou de outro, por quem oferta a melhor proposta, e que o turista que volte por onde veio, comendo o pó da areia, agora levantada do rastro que deixara.
Pensamos o que fazer, já que o objetivo fora frustrado, e nos lembramos de ir visitar o Açude de Boqueirão, que tinha saído de sua quase morte, ao receber as milagrosas águas do São Francisco.
E foi um programão. Ficamos num restaurante erguido sobre o balde do açude. Dele, de nossa mesa, víamos aquela imensidão de água, as do Velho Chico, que agora fazia uma transfusão de vida para nada menos do que 500.000 pessoas que estavam sofrendo um severo racionamento de água, por 4 dias na semana, os habitantes de minha cidade, Campina Grande-PB. O apocalipse seria agora, em outubro, com o encerramento do bombeamento de água, caso não chegassem as águas da tranposição que entram por Monteiro-PB, e descem pelo leito do Rio Paraíba até ele.
Almoçar ali, comendo aquele peixe e pirão, e olhando para aquele milagre dos Homens, nos acalmou do Lajedo e deu um novo significado ao nosso passeio. Sim, é um programão, ir comer um peixe num dos dois restaurantes que margeiam, na esquerda e na direita a represa (balde) do açude.
Que a Globo "comprou os direitos de sua área" para preparar alguma de suas atrações. Como assim?
Quer dizer que quando vão procurar financiamento para aquela área com base no patrimônio turístico do Lajedo o vendem como de acesso público, como patrimônio da humanidade. Mas, quando o vil metal chega na frente, esquecem os projetos de turismo, que franqueiam o acesso ao cidadão comum, e fecham a área?
Pode isso Arnaldo? Que esculhambação é essa entre o público e o privado, herdada desde as Caravelas, no que se chamava de Patrimonialismo. Uma tremenda falta de ética coma coisa pública que a confunde com a privada, e faz-se do Estado uma Casa Grande - e para poucos, deixando a Senzala para os muitos, o povo brasileiro.
De nada adiantou meu protesto silencioso. Descobrimos que o Lajedo é particular aos interesses dos proprietários, e público, quando atende as esses mesmos interesses. Sendo de um ou de outro, por quem oferta a melhor proposta, e que o turista que volte por onde veio, comendo o pó da areia, agora levantada do rastro que deixara.
Pensamos o que fazer, já que o objetivo fora frustrado, e nos lembramos de ir visitar o Açude de Boqueirão, que tinha saído de sua quase morte, ao receber as milagrosas águas do São Francisco.
E foi um programão. Ficamos num restaurante erguido sobre o balde do açude. Dele, de nossa mesa, víamos aquela imensidão de água, as do Velho Chico, que agora fazia uma transfusão de vida para nada menos do que 500.000 pessoas que estavam sofrendo um severo racionamento de água, por 4 dias na semana, os habitantes de minha cidade, Campina Grande-PB. O apocalipse seria agora, em outubro, com o encerramento do bombeamento de água, caso não chegassem as águas da tranposição que entram por Monteiro-PB, e descem pelo leito do Rio Paraíba até ele.
Almoçar ali, comendo aquele peixe e pirão, e olhando para aquele milagre dos Homens, nos acalmou do Lajedo e deu um novo significado ao nosso passeio. Sim, é um programão, ir comer um peixe num dos dois restaurantes que margeiam, na esquerda e na direita a represa (balde) do açude.
Isso também o sertão nos ensina, a nos recuperarmos rapidamente da dor, luto e da decepção, às primeiras chuvas que caem em nossas almas, nascendo em nossa vida babujas (primeira e mais tenra relva após a seca) de esperanças. Somos assim, um povo forte, por sobrevivente que é!
No caminho de volta, papai fala em voz alta, para, para, para, dá meia volta.
Brequei e atendi o pedido, ele queria parar num pequeno estabelecimento comercial, daqueles de beira de estrada, por ter reconhecido um amigo de uns 30 anos atrás.
E não era que era ele mesmo. Que encontro gostoso de testemunhar. Ele era o dono da pequena bodega na qual papai às vezes tomava uma cerveja, voltando todo coberto do pó da estrada, após mais uma missão de educação profissional cumprida. Vou bacana vê-los conversando como velhos amigos, e sobre os tempos antigos em que tudo era tão difícil para ambos.
Chegamos em casa e fomos preparar a laje do quintal para receber meus amigos. A noite seria de celebração pelos meus 5.3 e pelos 6.5 de Ari.
São amigos que construí ao longo de minha carreira no Banco do Brasil, trabalhando e aprendendo muito ao lado deles. Nosso filhos se criaram juntos, nos programas que fazíamos nos feriados prologados unindo quatro famílias: A minha, a de Catão, a de Gouveia e a de Ari. E fui ficando tão apegado a eles que os sinto como parte de minha família, e me sinto também padrinho dos filhos deles, padrinho de amor, daquele tipo que não necessita de papel passado para atestar.
Nós temos nossas histórias repetidas, que sempre que nos encontramos as repetimos mais uma vez, e sempre damos boas gargalhadas com elas, como se fosse a primeira vez que as contássemos.
Uma espécie de doidice. E, naquela noite não foi diferente. Num determinado momento, Catão disse que eu voltei a sorrir. E eu falei pra ele: "amigo, quem não sorri sendo levantado todas as manhãs pelo sopro da brica aracati, e que no anoitecer divide um pôr do sol com o amanhã, e quando anoitece é contemplado pelo toque cheio de ternura e amor de uma borboleta azul, dizendo-lhe: "persevere, a vida é o fruto das escolhas que fazemos, após batemos a poeira com aquilo que ela fez conosco?"
Todos emudeceram, e caíram na gargalhada, Gouveia soltou um: "Num entendi nada, repete".
Eu emendei, escutem a canção de Charles Chaplin, de nome Smile, ela explica melhor, eu já bebi mais de uma lata e nem me lembro das abestagens que eu disse. rsrs
Celina, Guia, mamãe e papai não sabiam onde colocavam tanta alegria e quitutes que prepararam: era fava, arrumadinho, ovos de codorna, era o dos meninos: costela de bode na brasa, carne de sol, queijo,castanha, amendoim, porco e assemelhados, tudo chegando com fartura.
Mamãe e papai fizeram surpresa, compraram um bolo para nós e lá fomos apagar as velinhas.
Quem tem amigos têm bênçãos. Eles são parte constituinte de uma vida plena, para os quais deveremos sempre guardar as melhores palavras e gestos de gratidão e de amor.
E não era que era ele mesmo. Que encontro gostoso de testemunhar. Ele era o dono da pequena bodega na qual papai às vezes tomava uma cerveja, voltando todo coberto do pó da estrada, após mais uma missão de educação profissional cumprida. Vou bacana vê-los conversando como velhos amigos, e sobre os tempos antigos em que tudo era tão difícil para ambos.
Chegamos em casa e fomos preparar a laje do quintal para receber meus amigos. A noite seria de celebração pelos meus 5.3 e pelos 6.5 de Ari.
São amigos que construí ao longo de minha carreira no Banco do Brasil, trabalhando e aprendendo muito ao lado deles. Nosso filhos se criaram juntos, nos programas que fazíamos nos feriados prologados unindo quatro famílias: A minha, a de Catão, a de Gouveia e a de Ari. E fui ficando tão apegado a eles que os sinto como parte de minha família, e me sinto também padrinho dos filhos deles, padrinho de amor, daquele tipo que não necessita de papel passado para atestar.
Nós temos nossas histórias repetidas, que sempre que nos encontramos as repetimos mais uma vez, e sempre damos boas gargalhadas com elas, como se fosse a primeira vez que as contássemos.
Uma espécie de doidice. E, naquela noite não foi diferente. Num determinado momento, Catão disse que eu voltei a sorrir. E eu falei pra ele: "amigo, quem não sorri sendo levantado todas as manhãs pelo sopro da brica aracati, e que no anoitecer divide um pôr do sol com o amanhã, e quando anoitece é contemplado pelo toque cheio de ternura e amor de uma borboleta azul, dizendo-lhe: "persevere, a vida é o fruto das escolhas que fazemos, após batemos a poeira com aquilo que ela fez conosco?"
Todos emudeceram, e caíram na gargalhada, Gouveia soltou um: "Num entendi nada, repete".
Eu emendei, escutem a canção de Charles Chaplin, de nome Smile, ela explica melhor, eu já bebi mais de uma lata e nem me lembro das abestagens que eu disse. rsrs
Celina, Guia, mamãe e papai não sabiam onde colocavam tanta alegria e quitutes que prepararam: era fava, arrumadinho, ovos de codorna, era o dos meninos: costela de bode na brasa, carne de sol, queijo,castanha, amendoim, porco e assemelhados, tudo chegando com fartura.
Mamãe e papai fizeram surpresa, compraram um bolo para nós e lá fomos apagar as velinhas.
Quem tem amigos têm bênçãos. Eles são parte constituinte de uma vida plena, para os quais deveremos sempre guardar as melhores palavras e gestos de gratidão e de amor.
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