Enquanto observo.




Sabe papai, aqueles teus olhos tristes no domingo, enquanto almoçávamos, não me saem da cabeça e quis conversar contigo.
Nem de JG tu me chamou. Ouvi um "João Gabriel, deixe de ser bicho do mato."
Papai, vou fazer sete anos e ainda não me sinto muito à vontade de me aproximar de outras crianças e com elas brincar. Você vê e fica bravo, e me chama de tímido seletivo. Não sei bem o que é isso.
Sei que tu quando pegas em minha mão e me leva para conhecê-las quer me ajudar. Fico com mais medo ainda.
Domingo passado vi que escolheu uma mesa próximo do parquinho. Vi você me olhando, torcendo para que eu saísse do banco e me aproximasse dos meninos, e eu só fiquei ali penando.
Vou, ou não vou? E se eu não souber o que eles estão brincando? E se não for aceito? E se eles não quiserem brincar comigo?
Essa cena da foto foi na mesa, enquanto tu desistia de mim e seguia para outra, mais bem longe do parquinho, e próxima do grupo que tocava.
Tu deve ter pensando: "Por que vou abrir mão da música, que toca perto daquelas mesas dali, se nas daqui, próximo ao parquinho, o meu filho não aproveita e vai brincar nele?". Pensou ou não pensou?
Eu fico pensando essas coisas, quando o grupo é estranho. E vejo você aflito. Querendo me ajudar, integrando-me às outras crianças.
Mas, talvez papai, eu seja assim mesmo, um pouco tímido nos primeiros contatos, depois me solto.
Se eu for assim você ainda irá gostar de mim?
Se eu não for como seus outros filhos, que chegam logo e vão fazendo amizade, ainda assim você não ficará bravo comigo?
Sabe papai têm horas que gosto de brincar sozinho mesmo, de correr, subir em árvore, de sair com um pedaço de pau batendo no chão.
Mas, estou crescendo. Peço que não me apresse.
Sei de teu amor, cuidado e proteção. Sei que queres agilizar as coisas. Mas, só fico mais atrapalhado e me sentindo mais estranho ainda com teu agir.
Sou assim, vou devagarinho. Tateando o ambiente, fico olhando pelos cantos, querendo entrar nos grupos.
Depois, me solto. Tenho amigos, não se preocupe. E sei brincar com eles.
Só não me apresse a ser o que acha que devo ser. Tenho meu ritmo, e posso até não vir a ser o que quer que eu seja, mesmo assim gostaria de ser amado, sem causar em você estranheza.
Não quero estragar mais seus almoços. Portanto, fique comigo na mesa, enquanto de lá eu olho as crianças brincarem.
Não me apresse. Eu posso não ser ainda o que espera de mim, em termos de desenvolvimento infantil, mas estou crescendo. Cada dia descubro coisas novas.
E eu voarei. Confie e deixe de aperreio. Essa sua ansiedade de eu me enturmar só agrava as coisas.
Penso que pais precisam respeitas as diferenças de personalidade entre seus filhos, eles não são iguais. Não é papai?
Faça como fez hoje coma vovó. Que anda se perdendo quando está passeando. Ela se esquece os caminhos de já onde veio, por não fixar mais e não lembrar por onde já passou.
Lembra o que fez hoje? Lembra que foi seguindo-a de longe, pois ela insistia em querer andar na Feira dos Importados sozinha, dizendo-lhe que você a apressava nas compras?
Lembra?
Siga-me de longe papai. Eu vou desenvolver, me ajustar e adaptar ao crescer. Não me sufoque.
Faça como fez com a vovó. Melhor ainda, lembra que você mudou a estratégia e deixou de segui-la, simplesmente ensinando-lhe como chegar sozinha onde você estaria?
- "Quando quiser me achar mamãe, pergunte como faz pra chegar no Portão 4, ao lado no Restaurante Oriental."
Lembra que ela chegou lá?
Só me ensine os caminhos papai, mas confie que vou me esforçar para trilhar por eles. Me espere lá na frente que chego, mas quero chegar por meus próprios pés, pleo meu próprio caminhar, não me carregue nos braços sempre, fará mal ao meu desenvolver. Faça como fez com a vovó, que ao lhe encontrar ficou toda orgulhosa.
Só me eduque para os objetivos da vida, mas deixe que eu mesmo faça minhas próprias rotas até eles. Como com a vovó.
Não te decepcionarei, poderei ser diferente do que planejou, mas, ainda assim, terás orgulho do que vim a me tornar ser.
E, valorize aquilo que sou e o que vou me tornando ao longo da rota. Não queira imprimir você em mim. Mesmo que por amor.
Aí, não serei eu no futuro quem caminhará sozinho, precisarei sempre de você - abrindo veredas, ou levando-me até os novos amigos, e me tornarei inseguro ao caminhar.
Desculpe pelo almoço que ficou bravo. No próximo, juntos poderemos brincar na mesa, enquanto encontro meu ritmo de me aproximar dos outros ao lado. Não apresse meu rio do desenvolver. Acredite papai, mesmo que fique bravo comigo, ele está fazendo seu papel e vai correndo e crescendo dia a dia.
Pode não ser no teu ritmo, mas é no ritmo que dou conta. Então, relaxe e curta a travessia comigo.

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