Solidariedaids!

Ministrando Palestra  -  Causa da AIDS
Em 12 março de 1994 fundei, junto com minha ex-mulher e Eliana, o Grupo de Apoio à Vida - GAV.
Dedicamos nossas vidas a este grupo; místico, mágico e mobilizador.  Todos os serviços que prestávamos eram gratuitos. E toda a ajuda que recebíamos era voluntária, principalmente de colegas do BB Campina Grande-PB. O grupo tinha mais de 30 voluntários, nas mais diversas especialidades. Ainda existe. Chama-se GAV - Grupo de Apoio à Vida, e foi a primeira Ong-Aids da Paraíba. Fazíamos visitas domiciliares, tínhamos um disk-aids, campanhas por alimentação e medicação, protestos para aumento da assistência e fim do preconceitos. Semanalmente nos reuníamos para avaliar a situação e trocar experiências, além de chorar e esperançar juntos.

Abaixo um extrato de nosso caminhada.
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APENAS SÓ MAIS UMA NOITE DE Solidariedade ...

18:00 (Sábado)

Telefone toca no disk-aids.
As informações passadas, colhidas por todo o dia, do paciente R. apontam para um preocupante estado depressivo. Preocupante, porque o paciente tem história de suicídio, uma vez que crises de depressão são"normais" para quem tem a doença.

Precisamos agir!

É hora de entrar em contato com outros portadores e formar o comitê de auto-ajuda.

18:30
Corredores do hospital vazios. Um vazio angustiante, alguns poucos doentes caminham com seus pedestais de soro.

18:35
Nos aproximamos da enfermaria onde estão companheiros infectados. Levamos nas mãos os equipamentos que compramos com a doação recebida do PROJETO NOSSO IRMÃO (BANCO DO BRASIL): uma TV Preto e Branco, um ventilador e um radio-gravador.

18:40
Tomamos fôlego para entrar no quarto. Precisamos de bastante energia: é uma visita que precisa funcionar, do ponto de vista motivacional, para um dos companheiros do GAV, que está com depressão e tem historia de suicídio.

18:41
- Surpresa!
- Ventilador para matar o calor...
- Televisão para ver a novela...
- Radio-Gravador para ouvir Juarez Amaral...

18:42
R.L nos olha com a vista perdida. Aproximo-me dele e digo:
- E aí cara , não foi você mesmo que falou que os portadores são "fera", "arrebentam". O que é que tá acontecendo contigo?

Sento-me na sua cama, conversamos sobre novas drogas, vejo suas fotos, falamos do GAV , seus projetos e seus sonhos.
Com um meneio na cabeça, R.L pede para que eu me aproxime e quase que num cochicho diz:

- Me chama a Dliretora do Hospital, não agüento mais, quero morrer.

Olho para o grupo da visita, o que dizer?
O que dizer a quem já luta por 2 anos contra este vírus cruel?

O silêncio se faz.

É um silêncio em que olhares se cruzam, olhos ficam marejados, o grupo ansioso espera.

Folheio suas fotos, ganhando tempo, olho para seu companheiro de quarto, ele também espera uma resposta.

De repente percebo que ele está com uma Bíblia na mãos, seria aquela uma resposta?

(Vacilo... Somos uma ONG não religiosa, porém respeitamos as crenças seria ético entrar por aí? Particularmente sou religioso , o que se costuma chamar vulgarmente de "católico praticante")

- R.L, você crer em Deus?
- Sim! Ele é meu sustento.
- O que você você responderia a JESUS quando chegasse lá por cima e Ele lhe perguntasse: O que você veio fazer aqui? Sabes que ainda não te chamei?
Quem vai dar testemunho de luta no teu lugar? Quem vai estimular outros portadores a lutarem?

Noto que seus olhos brilham. Ele sentiu a fisgada. Como que mudasse de assunto R.L tenta responder porque resiste a tanto tempo...

Lembra dos primeiros anos da doença, das primeiras infecções, de tantos que ajudou a não se desesperar. A cada lembrança de luta, seus olhos brilham com mais intensidade.

19:42

O grupo já mais relaxado faz projetos, como se estivera numa de suas reuniões ordinárias, ali, na beira do leito de RL.
. Nosso amigo, já mais animado, lembra-se que pode dar cursos de primeiros socorros, aos portadores assistidos pelo GAV. Que pode até ficar um período na sede fazendo plantão no disk-aids.

19:43
Entra um profissional que "veste branco" no quarto, sem dar conta do que se passou ali, fala em voz alta:

- LEVANTEM-SE DA CAMA. VISITAS NÃO SENTAM NA CAMA, PODEM TRAZER DOENÇA

R.L espera ele sair e "dá a língua".

Nós rimos.

Um riso gostoso, um riso fraterno.

Aquela "dada de língua" de RL, era um sinal de esperança.

Em tempo: RL virou um dos ativistas mais fortes do GAV. Morreu em 1998, após resistir por 4 anos à doença.

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