Ser conexão para o outro.

Hoje, quando levava o carro a uma oficina, para soldar a base de um artefato que segura a banheira do JG, ali adentrou um carro com placa de Campina Grande-PB. Saltei logo um EITA!
Pronto, já éramos amigos.
Um casal de idosos bem simpáticos.
Eles levavam seu Fita Uno para trocar o óleo.
Migraram de nossa terra há três anos.
Moram aqui em São Sebastião-DF, numa pequena chácara na periferia.
Só eles dois, um com 78 anos e sua senhora com 76.
Sentem saudades da terrinha, mas os filhos cresceram e vieram para cá e eles os acompanharam.
Cabelos branquinhos, branquinhos. Deles exalava o aroma do amor.
Perguntei-lhes se eles tinham comprado a chácara.
Disseram que não, embora pudessem comprá-la.
Optaram por viver o resto das vidas deles morando de aluguel.
Pois, já estavam velhos, e não queriam mais acumular nada. E, morando de aluguel, estariam mais livres para ir a novos lugares, sempre que não gostassem de algo. O que ganham das aposentadorias era suficiente para manter "esse luxo".
Não queriam mais reter nada no nome deles.
Em Campina Grande, moraram ao lado de meu bairro da Prata, moraram no bairro Centenário.
Prata e Centenário duas metáforas de como viver.
Uma para o acúmulo de bens, posses, poderes e ostentação.
Outra, a Centenária, para o que de fato tem valor. Para o desprendimento, para a sabedoria de anos curtidos, gozados, sem muita mala para carregar por aí. Sem muitas tralhas emocionais que grudam qual imã, e escolhem frágeis corações para ali fazer morada, numa simbiose mórbida, e importuná-los vida afora. Que casal belo. Verdadeiros santos.
Ele falou que seu Fiat UNO é bem de família e o acompanha há uns 20 anos.
Fiz conexão com eles.
Eles tornaram meu dia melhor.
Sua senhora bem arrumadinha, com bolsa, batom, toda nos trinques. Ele, calça de brim, camisa engomada, barba feita. Voltei aos tempos bons aos ver tanta energia amorosa naquele casal.
Nenhum traço de rancor, de mágoa.
Eles encontraram um jeito de ser felizes, na simplicidade.
Perto dos filhos, mas sem sufocá-los.
Aí chego em casa e testo um aparelho que comprei para carregar meu celular no carro.
Descobri que ele tem dez conexões possíveis.
E, pensei, aqueles velhinhos usam algumas delas na sua presença no mundo.
Existem muitas conexões que nos aproximam do outro e que nos tornam melhores na convivência em sociedade.
São as conexões da cultura, da família, do lazer, do trabalho, da religiosidade, das causas político-sindicais-sociais, da arte, do esporte, dos valores e da natureza.
Quantas conexões são necessárias para estabelecermos pontes com o outro? Apenas uma. Então, por que negamos todas elas e preferimos buscar o que nos divide, segrega e separa?

Nessa manhã, naquela oficina, apenas a conexão da cultura foi suficiente para nos irmanar.  Para que eu aprendesse com o casal que vai chegando um tempo que vamos nos despindo de tudo que não faz mais sentido. 


Que teimamos em guardar, reter, apropriar e que nem nós mesmos sabemos para que.

Guardar mágoas encardidas, vinganças adormecidas, ciúmes a espreita, inveja impotente...

Guardar rancores, mal-humores, chatices de todas as formas.

Chegará o tempo, em nossa caminhada para o Ser, da doação; da oferta; da simplicidade; da humildade. 
Tempo no qual publicaremos nossa vida, no livro da humanidade, deixando impresso nele trechos que de fato valeu a pena por eles ter vivido.

Será que não está mais que na hora de vender sua casa? 
E viver do aluguel de si mesmo? Viver na provisoriedade de tempos eternos frágeis, de berços que ninam o infinito?

De parar com a busca frenética do acumulo de posses, do consumo de qualquer coisa, de cultivar falsas aparências, tentando ser aceito?

Será que não ser aceito, por ser você mesmo - autêntico e livre de tudo que lhe aprisiona, é tão ruim mesmo?

Deguste sua vida. Ela é sua, apenas sua. Esteja pronto a curtir ser quem é: nunca pronto, acabado, perfeito. Ao contrário, um mar de contradições, de dúvidas, de inquietações, de revoltas interiores.


Faz parte do crescimento do ser um certo tanto de angústia.

Viva degustando as essências de ser pleno, íntegro, amoroso - renunciando a uma vida de fachada, de violência de todos os tipos, de egoismo e desamor.

Carregando quase nada de malas materiais, e um tesouro de bens espirituais.


O jogo, no campo da vida, não é bem jogado procurando o que nos divide. Joga-se bem, ao se buscar o que nos une, e , por ali, fazer comunhão, num coletivo de sentimentos profundamente humanos e amorosos.

Aí sim, eu e você poderemos nos sentar ao redor do fogo e juntos contemplarmos o amanhecer de um dia mais fecundo que virá.

Na qual nascerá uma nova sociedade, como resposta aos limites da bestialidade que essa atual vem gerando.

A humanidade está grávida de amor. A geração poderá levar mais que nove meses, nove décadas, mais o novo virá.

Aí investiremos tempo no que realmente importa. no que realmente tem valor.

Em coisas hoje tidas como ultrapassadas, como se apaixonar por um casal de borboletas,

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