Tempo de Resetar


Tenho implicação com meu celular. Sempre acho que ele está conectado, mas não está. Uma coisa de doido.
Outro dia ele completava a ligação, eu via o contador de segundos na tela, acusando o tempo da chamada e não ouvia nada.
Fazia isso também quando eu voltava para o número que chamou.
Para piorar o azar, e, “bem na minha vez” - como diz o palestrante, era a minha mulher.
Nessas ocasiões, nem desligando e religando o aparelho funciona. É preciso algo mais. Tenho um segredo: tiro a bateria, tiro o chip, boto tudo no lugar novamente, e pimba!
Não é que funciona.
Não sei se pela força da mente, do além, da operadora, do medo, ou da sorte.
Mas, que funciona, funciona.
Acho que se trata de um reset profundo, daqueles que damos nos modens de nossa casa, ao desligá-lo da corrente e da rede e religá-los. 
Só não descobri ainda como volto a receber SMS do Diretor. 
Juro que não o bloqueei. Mas, não me perguntem o que ocorre: ele manda e não chega nenhum. Aí, tome puxão de orelha. Quem está me salvando é o UOTI.  
Como digo, tenho um certo afastamento e uma certa ignorância na relação com celulares.
Acho que em boa parte da humanidade o mês de dezembro é o mês do reset do ser.
Mais do que retrospectivas, dezembro é um mês místico. 
Tudo fica mais amoroso, mais em paz. Todo mundo arranja um tempo para se encontrar e confraternizar, até consigo mesmo.
Os cristãos, reverenciam aquele que já ao nascer foi rejeitado: “Não havia lugar para eles”, e teve que dividir uma cocheira com animais de um curral. Aquele que nos deu um novo mandamento: “Amai ao próximo, como a ti mesmo.” 
Precisa falar mais algo?  Em sete palavras, e sete é o número da vida: a união do ternário (espírito) com o quaternário (matéria). Nessa frase, o Senhor Jesus disse tudo.  E, completou mais à frente: “No mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo!” 

Voltando ao mês universal do reset das almas, sempre fico nele reflexivo – beirando o melancólico. Não triste.
É que vivo o doloroso processo de tirar minha bateria, desplugar meu chip, e restaurar conexões perdidas, ou esquecidas, no corre-corre da sobrevivência. Religar-se ao que realmente importa.
Por isso o estado reflexivo. Para alguns, é só um mês. Para muitos, é um balanço. A festa da colheita de tudo que foi vivido no ano e que representa nossa identidade.
É preciso essa parada. Será que fui um amigo fiel? Será que escutei quem de mim precisou, ou estava sempre de janelas fechadas? Será que encontrei tempo para agradecer a quem me ajudou? Será que fiquei atento às coisas boas de meu viver? Ou só registrei as desgraças? Será que murmurei ou resmunguei muito? Será que não será a hora de desapegar de um monte de coisas?
Então, gosto do mês do reset do meu ser. Eu tinha perdido as conexões com os valores que me tornam melhor, no calor do dia a dia e da competição por um lugar ao sol.
Agora, renovo-me e projeto-me esperançoso para mais um ano.
Levo o que deve ser levado, dispo-me do que deve ser despido. Mas, sinto-me em crescimento. Cresci.
Aprendi a não me levar tão a sério. 
Aprendi que mais cedo ou mais tarde alguém me machucará, mas se você não o largar dos pensamentos, o machucado não cicratiza.
Aprendi que preciso celebrar meus aniversários com bolo, e chamar os amigos para dividi-lo.
Aprendi que brincar custa só um galho de uma árvore.
Aprendi que se eu não me respeitar...
Aprendi a não esperar mais do que se deve dos outros, a não depositar sobre eles a carga de minha ansiedade e expectativas.
Aprendi tanta coisa.
Aprendi que tenho que libertar as letras de minha mente, em escritos. Que não precisam ser curtidos, comentados, compartilhados, pois são - antes de tudo, para meu próprio prazer e deleite. Escritos nos tornam imortais.
Aprendi que a morte agora é contada em anos que faltam para o próximo cinquentenário.
Aprendi que não terei como fazer um monte de coisas, ler e ouvir outras... mas que só o fato de querê-las torna-me melhor, e vivo!  
Aprendi que preciso desacelerar. 
Aprendi a conectar e a desconectar ao que realmente me ligar ao WIFI do bem viver. 
Aprendi que preciso cuidar mais de minha saúde. 
Aprendi que entre dormir, tomar sopa, ou caminhar de pés descalços sentindo o sereno da noite, ficarei com a terceira opção, mesmo que gripe.
Aprendi que satisfações para os outros não satisfazem, nem sempre, que as dá.
Aprendi que se eu não gostar de meu rosto no espelho, e tem dias que não gosto, devo esperar por “barbas melhores”.
Ah, como aprendi.  
Por fim, voltado ao primeiro parágrafo, aprendi que aquele tempo que conta na chamada recebida ou feita e que não me pluga a mim mesmo ou ao outro, ou à vida, não voltará. É tempo que se foi.
Portanto, faz-se urgente e necessário que cada cena da vida seja vivida com sabor, degustada como a um bom vinho. 
E, na hora que entrar no piloto automático do viver, sem receber ou fazer chamadas do espírito, para coisas e das coisas que realmente por elas valham a pena viver. 
É preciso ter coragem para redimir-se consigo mesmo, com o outro e com a vida e recomeçar, tudo, outra vez, novamente!
Recomeço, mas sem ser um recomeço. Recomeço, com tudo de bom que me permito guardar e que comigo levo vida afora.  Essa é a única bagagem que de fato importa.

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