"Quando a gente se encontra, cresce no peito um gosto de vida, um sorriso, tanto querer. "
Aí, fui encarar as fotos,e revisitar fragmentos de minha vida. Em cada foto que revirava, havia amor, e a ele regressava um pouco, ao recordar o contexto delas. Confesso que vivi. E foi, e está sendo muto bom. Uma ponta de melancolia veio ao meu coração. Quantos outros momentos eu deixei de registrar? E que agora me faria tão bem deles lembrar? Segue Geraldinho, agora com:
Você Se Lembra.
"Na realidade onde está você?
Em que cidade você mora?
Em que paisagem em que país?
Me diz em que lugar, cadê você?"
Absorto entre minhas memórias, tomo um susto quando Cida - minha empregada do lar, irrompe no quarto, com seu jeito destrambelhado de ser, e me diz que a torneira do jardim está vazando.
Das lembranças de minha história de vida, à realidade do aguaceiro, meu pensamento galopou numa fração de segundos. Pense numa volta ao mundo do "agora" ligeira.
De pronto, desliguei o Geraldo e botei o crachá de faz tudo, com a inscrição em itálico: Já Que (Já que está casa mesmo, faz isso,compra aquilo, conserta ali...)
Pensei comigo, puto da vida, até tu Cida?
Mas, a conta de água anda salgada, então relevei e lhe agradeci.
Chegando ao jardim percebi que o vazamento era na rosca da torneira, naquele lugar em que ela se encontra com o cano de água.
Então, desliguei o registro geral. Peguei uma chave inglesa, uma fita veda rosca, e tentei eu mesmo fazer o trabalho.
Depois de feito o reparo, liguei novamente o registro e fui me chegando devagarinho, sem querer acreditar que tinha conseguido resolver. Seria um 10 para mim, que não sou o melhor nesse tipo de serviço.
E não é que funcionou! Pelo menos até agora. rsrs
Orgulhoso, preparei um cappuccino e sentei-me numa cadeira de jardim, bem próximo da torneira, só para contemplar o meu sucesso. Queria propagar aquela sensação mais um pouco.
Até que uma borboleta começou a dar rasantes pela torneira.
Eu amo borboletas.
Tirei o celular do bolso para registrar, não sem uma ponta de dúvida. O que queria aquela borboleta numa torneira de jardim, nada parecida com uma flor?
Sim minhas amigas e amigos, é o que está pensando mesmo.
E senti por ela. Como senti.
Aquele pequeno "corrimento" na torneira era suficiente para gerar gotinhas de água limpinhas, fresquinhas, que matavam a sede daquela borboleta, nas tardes de baixa umidade e calorentas do Cerrado, como a que fez hoje.
Senti muito por ela. Não havia mais nenhum filete de água escorrendo dali, embora ela ainda fuçasse com suas antenas.
Juro que ouvi a borboleta cantando para as gotinhas de água que se foram: "Na realidade onde está você? Em que cidade você mora? Em que paisagem em que país? Me diz em que lugar, cadê você?"
Saí dali me sentindo culpado. Culpado de ter fechado as gotinhas de esperança daquele serzinho tão bacana, que não se cansa em polinizar as flores com as quais se encontra.
Quando fico assim, meu coração gosta de matutar. Então, preparei uma dose de Druyrs e lembrei de muitas pessoas que passaram por minha vida, dando-me gotinhas delas mesmas, do melhor delas, em forma de amor.
Lembro de Dona Joaninha, uma senhorinha octogenária - que participava das celebrações da palavra que eu conduzia na Capela de São Sebastião, em Campina Grande, quando dos 15 aos 17 anos quis ser padre.
Dona Joaninha sempre chamava para um café com bolo, em sua casa tão humilde, após a liturgia da palavra dos sábados à noite. E como eu me sentia amado, ali naquela casinha por aquele anjo em foram de gente. Um dia ela partiu, senti como minha borboleta de hoje, não havia mais o pingo de amor, após as celebrações litúrgicas.
Temos um monte de pessoas-pingo-de-água-amorosa em nosso viver.
Um monte!!!
Mas, não podemos esperar para dizer isso a elas, quando Ele, nosso Pai, "consertar o cano" e rodar o carrossel do destino de nossas vidas.
Ter consciência dessas pessoas pingo de amor em nosso viver exige que cultivemos a gratidão.
E como gostaria agora de poder voltar as fitas de minha vida e agradecê-las.
Como gostaria de poder reviver momentos tão bons, vividos de forma tão ansiosa ou apressada, sem pausas para contemplar.
Mais preocupado em pagar o jardineiro, do que acariciar as sementes em brotação. Entende?
Também podemos estar sendo essas gotinhas de amor para pessoas que talvez nem as conheçamos presencialmente.
Talvez pessoas estejam se alimentando de nosso exemplo, valores e jeito de ser.
Não podemos então renunciar aos nosso pingos, à nossa essência.
As pessoas andam tão sozinhas, apressadas, ansiosas, e agressivas, que um simples gotejar de amor, exalado de nosso ser, pode fazer toda a diferença no dia delas.
Como aquelas gotinhas lacrimejantes, de um pequeno vazamento de jardim, fazia na vida daquela borboleta.
Lembro de como me sinto orvalhado pelo amor de Cida, todo início da manhã, quando ela me serve o café, prepara meu Kefir, um copo com água e me traz o remédio de pressão. Quando levanto da mesa, ela checa se tomei. Caso contrário me alerta.
Cida é uma das minhas gotinhas de água.
E, a pouco, antes de começar a escrever essa crônica, ela fez verter umas gotinhas, agora de lágrimas.
Ela postou para mim a foto de sua aliança com a seguinte mensagem:
"Olhe as alianças de meu casamento. O Martinho comprou. Obrigado".
Ser depositário da confiança de tal preciosidade, é ou não é um oásis de bons sentimentos?
Esse é o apelo que faço. Mesmo sendo gotinhas de amor, não podemos negar aos corações sequiosos que bebam delas, e por um instante, sintam que suas vidas estão melhor.
Toda vez que você abraça um(a) amigo(a), toda vez que você estimula um(a) amigo(a), toda vez que você acolhe o desabafo dele(a), só escutando-o(a) de forma plena, empática e atenciosa, gotas de amor jorram de teu coração.
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